Capítulo Único

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- Merda, eu quero a minha casa!

- Eu tenho a leve impressão de que não sairemos daqui hoje.

- Não acredito que vou passar o Natal na porcaria de um aeroporto!

Rolei os olhos ao perceber que, com a sorte que tenho, terei que aturar mais reclamações como essas das três vadias que eu chamo de amigos por um longo e indeterminado tempo.

Alguém me ouviu quando eu disse que essa viagem de última hora não era uma boa ideia? É, acho que não. Tanto não ouviram, que agora estávamos todos nós na véspera de Natal em um aeroporto americano lotado de pessoas cansadas e estressadas, porque metade dos voos está atrasada e a outra metade sendo cancelada por conta do mal tempo. Era provavelmente uma das noites mais frias e nada estava dando certo!

Olhei para o meu relógio de pulso e seus ponteiros não se mexiam. Bati o dedo indicador repetidas vezes sobre o visor e ele continuou da mesma forma.

Ótimo!

- Mantenham a calma, rapazes! Nós sairemos daqui hoje sim – Bernard tentou amenizar a situação, mas eu acho que nem ele acreditava mais em suas palavras. – Foi apenas um pequeno atraso, nada de mais.

- Eu preciso de um café – eu disse calmamente e me levantei do chão.

Sim, do chão!

Antes, nós cinco estávamos sentados nos bancos, mas é sempre nessas horas que pessoas idosas aparecem do nada com aquelas caras de "eu sou apenas um velhinho, será que você pode, por favor, me ceder o seu lugar?" ou "pelo amor de Deus, esse povo jovem de hoje em dia que não se toca e não dá lugar para os mais velhos! Eu já tenho quase mil anos e preciso conservar o que ainda me resta" e blá, blá, blá. Então como boas e atenciosas pessoas que somos, nós levantamos e nos acomodamos no chão gelado. Bem legal, não? É, mais ou menos, eu sei.

Para mim, seria muito melhor se todos nós – sem exceção – voltássemos agora para o hotel. Podíamos muito bem pegar outro voo, no mínimo, amanhã de manhã. Sem dores de cabeça. Mas a maioria dos meus amigos estava com um maldito fogo no rabo e queria estar em casa para passar o Natal com as respectivas famílias e namoradas. Nem sei se eles pensavam no fuso horário... Era bem provável que não, pois senão já teriam desistido das reclamações.

- Traz pra mim tam...

- Não! – eu disse simplesmente.

Recebi um olhar ofendido de Daniel, mas estava estressado demais para me importar com isso, então logo segui meu caminho. Há algumas horas ninguém me ouvia, mas agora ouvem? Pois eu não vou trazer porcaria nenhuma e, se me der vontade, volto para o hotel sozinho!

Bufei e diminui meu ritmo ao ser obrigado a andar vagarosamente entre as pessoas, tentando não esbarrar em ninguém. A praça de alimentação ficava do outro lado do saguão, então levei um tempinho até parar em frente à uma cafeteria e encarar o painel iluminado com os nomes das bebidas e seus valores. Fila para pedir, fila para pagar, fila para pegar o café e enfim eu saí daquele inferno.

Pensei em voltar para onde eu estava antes, mas não queria mais ouvir os caras reclamando da situação várias e várias vezes seguidas. Eu estava pouco me importando com aquele Natal. Se na véspera já estava tudo sendo péssimo, ele tinha tudo o que é preciso para dar errado!

Dei uma volta pelo saguão ainda sem um destino certo, até que encontrei o que inconscientemente estava procurando. Parei em frente ao banco vago que tinha apenas uma blusa de moletom azul escuro da Hurley e uma bolsa preta feminina sobre o mesmo.

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