PRÓLOGO

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A mãe ajustou o casaco sobre os ombros da filha com as mãos trêmulas enquanto a garotinha brincava com os dedos. Ela arrumou a gola, puxou o zíper e endireitou a barra do casaco, afastando a poeira com tapinhas gentis, mas nada disso parecia chamar a atenção da criança.

— Liana.

Ao ouvir o próprio nome, a menina ergueu os olhos, encontrando o rosto pálido da mãe. A mulher, por sua vez, ofereceu o melhor sorriso que conseguiu; seus lábios se comprimiam, contrastando as rugas ao redor deles.

— Filha, precisa escutar a mamãe. — O tom de urgência estava presente na voz, mas é claro que a pequena Liana jamais perceberia. — Amanhã nós vamos sair. Vamos voltar para a casa. Mas preciso que você fique bem quietinha e durma um pouco, está bem?

Sair.

Parecia um sonho.

A mulher chegou para trás em seu assento e olhou ao redor. A pequena cela parecia mais apertada a cada dia, como se sua vontade de sair a sufocasse ainda mais. Nada além de um fino colchão, uma manta leve e uma janelinha que oferecia pouca iluminação. Ela passara os noventa dias preocupada em como Liana lidaria com aquilo, mas agora que a via tentar puxar o zíper de seu casaco e falhar miseravelmente, ela quase conseguia rir. As bochechas continuavam tão rechonchudas como sempre, mesmo que a mãe quase não comesse para alimentá-la; o cabelo liso, puxado para trás em um rabo-de-cavalo e a roupa, embora encardida, estava bem certinha no corpo. Mesmo em situações tão precárias, a mãe sempre fazia o que estava em seu alcance para que a pequena Liana, de apenas três anos, não saísse com traumas daquele lugar. Ela se inclinou e desceu um pouco o zíper até a metade do peito. Colocou dois dedos sob o queixo da filha e fez com que ela a encarasse.

— Você ouviu, meu amor?

— Sim!

— Ótimo. Vem cá.

Ela abriu os braço e Liana se aninhou entre eles. A mãe a abraçou, ciente de que abraçava seu mundo, a razão pela qual permanecia viva. Fechou os olhos. Respirou fundo. Deixou que uma lágrima solitária rolasse por sua face macilenta e caísse sobre o cabelo da criança, que não pareceu se importar.

— Mamãe? — A voz era miúda, um breve sussurro.

— Oi, meu amor?

— Eu quero um biscoito.

A mãe apertou os olhos, permitindo que as demais lágrimas se soltassem, em um choro silencioso. Liana tentou se libertar do abraço, mas foi apertada ainda mais intensamente contra o peito da mãe.

Só mais um dia.

Ela precisava aguentar apenas mais um dia.

Além dos Vales VerdejantesOnde histórias criam vida. Descubra agora