garota perfeita ou apenas narrador-personagem?

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é engraçado assistir a peça enquanto ela acontece diante de meus olhos, consigo enxergar a garota principal se divertindo dando risadas das palhaçadas feitas pelo garoto que tenta a conquistar. eles parecem ser um casal lindo — sabemos que não é, afinal, isso é uma peça! — e irreal de ser alcançado. ao lado da principal, vemos a sua melhor amiga, que está com a cara enfiada nos livros, imaginando como sua vida seria melhor se ela estivesse dentro do universo de um dos seus livros favoritos.

entre elas, estão o grupo de amigos, aquele grupo divertido e engraçado que todos querem fazer parte pois ele é incrível e muito unido! — definitivamente não, eles nem sequer gostam dela. — eles são os amigos perfeitos da garota perfeita de uma vida perfeita!

"mas e você, narrador? onde você se encaixa nisso?"

ah sim, meu papel. bom, talvez eu devesse apenas narrar a história dessa garota para você, ou talvez eu devesse te mostrar os bastidores de tudo, a vida por trás da peça, tudo aquilo que não é demonstrado enquanto você a assiste. talvez outro dia, afinal, eu não posso ser maldoso e insensível de não pensar que a pobre garota perfeita também tem seus problemas — especialmente com o pai, que irônico. — mas hoje, meu papel na peça é estar ali, bem ao lado dela.

e jamais ser percebido.

é intrigante o número de figurantes em cada filme existente, você sabe muito bem que eles estão lá, mas você percebe eles? consegue realmente notar a existência de um personagem colocado unicamente para encher o cenário?

é claro que não, eles só estão lá para serem parte de um cenário, um cenário do principal. o fundo de tela em que o único foco é a garota perfeita e o resto apenas existe, não chamando nenhuma atenção.

bem, nesta peça, eu sou um mero figurante, tendo o único cargo encher um número necessário de participantes de uma breve cena. acho que eu até possa ser um figurante mais sortudo, já que eu tive a chance de ser "o amigo esquecido", sabe? aquele cara num grupo de amigos que está lá, faz uma piadinha ou outra, tem um assunto legal para se debater, mas ele não agrega em nada a vida de nenhum deles lá. ninguém faz questão de sua presença e de sua participação em qualquer evento ou saidinha, ele nem sequer faz parte do grupo de mensagens.

é fácil fazer meu papel, eu entro em cena, falo algumas palavras, rio alto o bastante, tenho atitudes vergonhosas e saio de cena, e o ciclo se repete. nada muda, afinal, como algo vai mudar sem nem sequer ser notada a existência?

e se deixarmos de lado todos os sentimentos de insuficiência, insegurança, abandono e tristeza, não existe nada de ruim neste papel, afinal você sempre estará em cena, mesmo que sem nenhuma atenção em você, não é? você faz parte daquele lugar, daquele grupo, você é um deles! não importa qual seja a dor, vai ficar tudo bem pois eu sou o figurante principal da peça! — as vezes eu gostaria de poder ser mais incluído entre eles, não preciso ser o principal, nem o secundário, mas só de ser um dos amigos e ter alguma importância no grupo seria suficiente — esse é o meu papel e eu serei o melhor a executá-lo!

talvez outro dia possamos pensar sobre a vida dos bastidores e tudo aquilo que não se é explicado, mas isso seria um roteiro para uma peça de outro dia. por enquanto, eu sigo aqui, apenas completando o cenário do grupo de amigos da garota perfeita. 

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