é isso. acabou.

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Sabe quando a gente pensa que nunca vai dar certo em nada nessa vida? Quando a gente pensa que já era, que tá tudo acabado e que a nossa sorte já esgotou naquela última coisa boa que aconteceu há tantos dias, semanas, meses ou até minutos, mas a sua noção de tempo já está tão ferrada que você nem lembra mais e até duvida se realmente aconteceu?

Calma, talvez eu tenha me expressado mal. Deixa eu tentar de novo. Por favor, não desiste de mim.

Sabe quando você quer muito fazer alguma coisa, mas na real você sabe que vai dar errado ainda que seja uma coisa bem simples, tipo pedir permissão ao professor para ir beber água? Pois é, era exatamente assim que eu me sentia. Tiveram tantas vezes que eu queria levantar a mão e fazer essa mesma pergunta que eu com certeza já perdi a conta. Também nem lembro quantas vezes foram que eu preferi ficar com sede durante as sete aulas do dia porque tive medo de levantar a mão e pedir a bendita autorização. É que o professor ficava tão absorto na matéria que eu achava que ele ficaria decepcionado se alguém falasse sobre outra coisa que não fosse o conteúdo explanado na lousa. Assim como ele ficava irritado quando os outros alunos conversavam durante a explicação. Só que com eles o professor gritava, comigo não. Claro, eu entrava mudo e saía calado de todas as aulas. Todas mesmo.

Eu era aquele aluno que ficava tão quieto na sala que, mesmo tendo escovado os dentes de manhã, sentia o mau hálito de tanto que a minha boca ficava fechada, e por isso eu levava balinhas para os intervalos e disfarçar. Não sei se feliz ou infelizmente, mas ninguém vinha pedir uma ou duas balinhas, o importante era que eu era o único que esvaziava aquela caixinha.

Eu era aquele aluno que lanchava sozinho, sem ninguém por perto, mesmo tendo tanta gente pelos corredores. A minha escola tinha uma rampa que ligava todos os andares, bem no meio do prédio. Como a minha sala era no último andar, tinha um espaço na rampa por onde ninguém passava, então eu decidi ocupar aquele pequeno lugar vago durante o intervalo do recreio, quando os professores expulsam os alunos das salas para evitar problemas como "Professor, o fulano pegou o meu estojo!" e no final das contas o estojo tinha sido colocado lá por outra pessoa que não era fulano. Enfim, acontece em todas as escolas, eu acho.

Eu era aquele aluno que tinha cara de enjoado, jeito de enjoado, voz de enjoado, super desmotivado e era sempre educado com todo mundo que vinha falar comigo, ou seja, todo mundo achava que eu realmente era enjoado. Ninguém vinha falar comigo. Nem os professores reclamam de mim quando eu dormia na aula deles. Eu tinha insônia (ainda tenho, na verdade), então eu ficava quase todas as noites acordado e só sentia sono cinco minutos antes do meu alarme tocar, depois de o sol já ter nascido. Meus pais também nem iam às reuniões de pais e mestres. Os professores nem tinham tanto o que falar de mim. Quer dizer, eles até tinham, mas eu é que não tinha disposição de levar bronca deles e dos meus pais por não me esforçar para ser mais sociável.

Olha, não é que eu não goste de conversar com as pessoas, é que eu nunca sei como elas vão reagir. Pessoas são as criaturas mais imprevisíveis que eu já conheci, especialmente as mais novas e as que estão no ensino médio. Essas duas espécies de pessoas são as piores para se lidar. Eu já tinha problemas em falar comigo mesmo para entender que porcaria eu tinha na cabeça, por que todo mundo conseguia sair por aí com os colegas, rir de coisas idiotas e até mesmo fazer coisas idiotas. Nada disso fazia sentido para mim, esse negócio de se humilhar na frente dos outros esperando que eles riam de você até ficarem com dor de barriga.

Alguns meses depois, a coordenadora chamou meus pais para conversar e eles me levaram junto. Claro, se eles fossem levar bronca pelo jeito que me criaram, eles tratariam de reverter a situação para fazer parecer que eu fui criado bem, só não aprendi nada que eles me ensinaram. Porque os filhos sempre são culpados pelos erros dos pais, é sempre assim. Primeiro eles te esculhambam e depois te trancam no quarto, de castigo.

Carta para você - yoonminOnde histórias criam vida. Descubra agora