1994. Buenos Aires, Argentina.Era uma casinha no meio do campo, uma casinha simples mas com grande valor, com imenso valor. Seu exterior poderia parecer podre, sem vida, morfada, mas o interior era vivo, cheio de lembranças, completamente diferente do que aparentava. Nos campos repletos de grama alta onde existia a casa, um garoto em torno de seus oito a nove anos corria, se embolava pelo capim e também saltava nas pequenas poças de lama que se formaram após temporais de chuvas. Mas em algum momento o garoto se cansou, por isso logo deitou-se no chão, admirando o céu enquanto aparentemente tentava se concentrar nos sons dos insetos aos seus arredores; grilos, gafanhotos ou espécies assim, aquilo chamou atenção do menino em questão de segundos, que fora motivo dele levantar-se do chão mais uma vez e assim como uma criança hiperativa que era, seguir os chiados com um imenso cuidado. Parecia um felino querendo predar um pequeno rato ou um pequeno camundongo, era tão atencioso que até mesmo tinha prendido a respiração para saber a localização do inseto através de seu chiado, não poderia vê-lo porcausa da camuflagem mas poderia tirar a sorte com a audição. Por isso, numa tentativa cega, jogou-se para frente com ambas mãos bem abertas
—... Atrapado!
O garoto loiro tinha dado um pulo e tanto para frente e sem fazer a mínima idéia onde certamente estaria o inseto, de algum jeito conseguiu tê-lo nas mãos. Ele riu, bastante feliz e ofegante por já estar cansado de ter esvaziado suas energias mais cedo, só que possuir um gafanhoto em suas palmas parecia o deixar encantado demais ao ponto de ignorar o fato de estar enfadado. Levantou-se com o besouro ainda preso e assim seguiu até a casa, entrando duma forma desengonçada pela porta de madeira sem muita dificuldades, o cheiro estremecedor de algo estar sendo feito pro almoço fazia do menino esquecer um pouco seu hiperfoco; o estômago parecia impedi-lo só de sentir aquele aroma atiçador, mas tudo fora interrompido quando o menino tomou um susto e deixou o inseto fugir de suas mãos, pulando e saltitando para debaixo do sofá. Um homem alto, loiro e que usava óculos apareceu atrás dele, mesmo com um semblante completamente sério, o menino parecia muito confortável na sua presença
— Qué estás haciendo Luan?—o adulto perguntou
— Papá!—o menino que se denominava Luan Inflou as bochechas, claramente irritado pela aparição do pai, mas tentou ignorá-lo enquanto ajoelhava-se e procurava o inseto que havia escapado— Você assustou meu gafanhoto!
— Saltamontes?— o pai perguntou um pouco em dúvida do que seu filho se referia
— Saltamontes!— Luan afirmou.
O mais velho sorriu passando a mão na nuca enquanto respirava fundo, tinha se sentido culpado de certa forma por estragar a diversão do garoto, mas sabia que tal iria encontrá-lo novamente uma hora ou outra, só era questão de tempo
— Lu, notaste que tu portugués está muy bueno?—ele perguntou enquanto colocava ambas mãos na cintura, esperando uma resposta do mais novo— Lu?
— Hmmm! Creo que si- ahh achei!—finalmente o menino pôde encontrar o gafanhoto, o inseto felizmente saiu de seu esconderijo por desespero de estar sendo caçado, Luan teve que esforçar-se bastante para conseguir pegá-lo ali embaixo, mas no final das contas o que valia era que tinha conseguido recuperar o pequeno gafanhoto. Voltou a ficar em pé como se nada tivesse acontecido, assim, mostrou a conquista para o mais velho— Aqui papá!
— Parece que es una nueva especie... —o homem respondeu enquanto se curvava um pouco para ver o inseto mais de perto, tinha cores escuras e acizentadas, sem contar com as manchas amareladas e algumas avermelhadas também. O pai entendia a alegria do filho de ter capturado algo como aquilo, era novo. Por mais que sentisse uma certa pena do inseto tentando se contorcer para fugir novamente, com umas de suas perninhas quebradas ao ter sido agarrado sem gentileza nenhuma, não poderia fazer muita coisa além de olhar o sofrimento alheio— Por qué no lo pones en el frasco de tu habitación? Podemos estudiarlo más tarde.
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Caminho à Delusão
Bí ẩn / Giật gânMartín Hernandez relembra seu passado em meados de 1970 quando teria viajado ao exterior para realizar seu sonho; ser psiquiatra. Mesmo entre lembranças extremamente pertubadoras e desumanas no Hospital Istabérico de Pompas, ainda assim possuía uma...