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Minha cabeça latejava, doía tanto que eu mal conseguia me situar, minha boca estava seca e nunca foi tão difícil abrir os olhos, depois de algumas tentativas, eu finalmente abri. Olhei em volta reparando nas paredes brancas, um armário e alguns aparelhos, a agonia só começou a diminuir quando percebi um sofá, vi minha mãe sentada me olhando preocupada, consegui analisar rapidamente as olheiras fundas nos seus olhos antes dela correr e me abraçar.

- Mia! Finalmente, meu amor -minha mãe falava aliviada enquanto eu tentava puxar na minha memória o que poderia ter acontecido, mas não encontrava nada além de lembranças da minha festa de 15 anos, que parecia ter sido no último fim de semana.

- Mãe, o que aconteceu? Onde eu estou? -falei quase sem voz, desejando que ela tivesse ouvido.

- Você está bem? Está com dor? Meu Deus, você finalmente está falando comigo -ela passou a mão no meu rosto parecendo analisar cada parte com cuidado.

- Eu estou legal, eu acho... Só me explica o que está acontecendo aqui, por favor -encarei os seus olhos sentindo os meus lacrimejarem, eu sei que quando a minha mãe dispara varias perguntas, é para fugir de respostas.

- Você está no hospital, filha. Eu vou chamar a médica e você vai entender tudo, tá bom? -ela deu um beijo estalado na minha testa enquanto apertava um botão na minha cama, eu apenas afirmei com a cabeça tentando não me desesperar, e em poucos minutos a médica entrou no quarto com uma expressão tão aliviada quanto a da minha mãe.

- Tudo bem, Mia? Como está se sentindo? -ela fala calma colocando o estetoscópio em cada parte do meu peito.

- Na medida do possível, eu estou bem. Só a minha cabeça que está explodindo  -ela afirma com a cabeça atenta em cada palavra que eu dizia, e desviou o seu olhar para os aparelhos ao meu lado.

- Isso é normal, eu vou ajustar a dose do seu remédio -ela sorriu simpática apertando alguns botões nos aparelhos- Tenho que te fazer algumas perguntas antes de qualquer coisa, tudo bem?

- Tá bom -respondi me ajeitando na cama, descobri que o meu corpo dói tanto quanto a minha cabeça.

- Você sabe me dizer que dia é hoje? -a médica disse segurando uma prancheta na mão.

- Hoje, é... -eu encarei o teto pensando, mas não cheguei a conclusão nenhuma. Comecei a me desesperar quando percebi que a minha última lembrança era do meu aniversário de 15 anos- Não faz muitos dias da minha festa de 15, né? Então deve ser dia 25, por aí -eu ri fraca um pouco nervosa ao observar a troca de olhares entre a médica e a minha mãe.

- Certo... Em que ano nós estamos?

- 2014 -eu respondi depois de pensar um pouco percebendo os olhos da minha mãe lacrimejarem- o que houve? Mãe, você está chorando?

- Mia, eu preciso de toda a sua atenção e calma agora, tudo bem? -a médica entrou na frente da minha mãe tampando a minha visão dela.

- O que aconteceu? Por que ela está chorando? -senti algumas lágrimas escorrerem enquanto tentava observar a minha mãe, que estava de cabeça baixa no sofá chorando bem mais que eu.

- Calma, você precisa respirar fundo... Você sofreu um acidente de carro há um mês, foi grave, você estava em coma desde então.. isso afetou o seu cérebro causando uma amnésia, que pode ser momentânea ou não, nós só vamos saber com os próximos exames -a médica dizia enquanto me olhava com ternura, até com um pouco de pena, as palavras se bagunçavam na minha cabeça e eu só conseguia chorar mais. Tentei formular milhões de perguntas, mas a minha voz parecia não sair mais.

- Nós vamos fazer de tudo para reverter isso, ainda está muito cedo para se desesperar. Você precisa ter calma, nós vamos te ajudar -ela voltava a falar e eu mal conseguia ouvir, apenas ficava tentando puxar qualquer pedaço de memória desse tal acidente, mas não me lembrava de absolutamente nada.
Finalmente a minha mãe voltou ao meu campo de visão, ela se sentou na ponta da cama e me abraçou forte.

- Eu prometo que vai ficar tudo bem, os médicos são ótimos, eles vão reverter isso -ela falava entre os soluços de choro, eu sabia que ela também estava tentando consolar a si própria.

- Eu sei, mãe... Por que ela falou sobre amnésia? -sussurrei assustada para a minha mãe. 

- Sua festa de 15 anos foi há 3 anos, meu amor... Você tem 18 agora, nós estamos em 2017... -ela deu uma pausa grande entre as frases chorando ainda mais, e eu a apertei em mim deixando as lágrimas escorrerem. Isso não pode ser real, isso não existe. Eu não esqueceria de 3 anos da minha vida.

- Isso é só um pesadelo, não é?... -sussurrei mais uma vez para a minha mãe, ela me soltou e deu um beijo demorado na minha testa.

- Nós vamos recuperar a sua vida juntas, tudo bem? Eu estou do seu lado -ela disse olhando fundo nos meus olhos, e então eu percebi que tudo aquilo era real, que eu teria que reaprender a minha própria história.

- Obrigada, mãe. Eu te amo

- Eu te amo muito, minha vida -ela sorriu fraco e se levantou da cama enquanto limpava o rosto.

- Desculpa interromper as duas, mas o seu namorado continua tentando entrar, ele já brigou com todos os médicos lá fora -a médica diz e eu a encarei confusa.

- Namorado? Eu não tenho namorado -falei convicta tentando puxar na memória, mas só consigo me lembrar do meu primeiro beijo. Eu olhei a minha mãe e ela deu uma risada baixa.

- O Harry não tem jeito... Só me dê mais um minuto com ela, e aí ele pode entrar -a médica atendeu as palavras da minha mãe e saiu da sala, minha mãe segurou a minha mão tentando encontrar as palavras certas.

- Harry? Namorado? O que está acontecendo? -falei nervosa tentando parar de chorar.

- Era ele que estava com você no acidente, Mia. Ele é o seu namorado deve fazer um ano mais ou menos... ele é um cara incrível e passou praticamente todas as noites aqui, ele precisa te ver.

- Mas eu não conheço esse cara... -sussurrei nervosa mexendo nos meus dedos. Eu o namorava há 1 ano e nem o conhecia. Quer dizer, não mais.

- Conhece sim... eu sei que é assustador, mas eu prometo que vai te fazer bem. E eu estou aqui na porta, qualquer coisa é só gritar, tudo bem? -eu fiquei um tempo pensando e depois concordei com a sua proposta, ele ficou todas as noites aqui, merecia me ver.

A minha mãe saiu do quarto e logo um garoto tatuado passou pela porta tirando os óculos escuros, seus olhos também estavam com olheiras fundas e tinha um pequeno corte na testa, eu o olhei e ele sorriu correndo até minha cama e me abraçou forte, eu fechei os olhos tentando puxar na memória quem ele era, mas não tinha nenhuma lembrança.

A Vida em uma LembrançaOnde histórias criam vida. Descubra agora