Sabe aquelas cidadezinhas do interior, cheias de histórias para se contar? Não é assim, diferente com a pacata Sebastianópolis, de pouco mais de dez mil habitantes, cravada no interior do Rio Grande do Norte, cheias de paisagens exuberantes, locais rústicos e pontos turísticos maravilhosos, cidade de um povo simples e acolhedor. Pois bem! Quisera o destino que recaísse sobre mim a missão de contar a história de Pedrinho, sua paixão pelo futebol e sua perseguição pela realização dos seus sonhos. Anos setenta. A seleção Brasileira de Futebol conquista o tricampeonato mundial de futebol no México. O País respirava futebol. Pedrinho tinha então apenas nove anos, corpinho franzino, um pouco alto, vivia com os pais e um irmão três anos mais novo, na acanhada zona urbana de Sebastianópolis.
Ora, passam-se os anos e uma resposta é dada como certa, com muita antecipação, para quando se questiona um garotinho, seja ele branco, negro, rico ou pobre. O que vai querer ser quando crescer? Jogador de Futebol. É uma unanimidade incrível. Incrível, era também a paixão de Pedrinho pelo esporte, ao ponto de dormir com uma bola, dentro da rede, que fora tecida artesanalmente pelas mãos calejadas da sua avó paterna, Dona Maria, que vivia na zona rural da cidade na companhia de seu esposo e de mais outros filhos e netos.
Nos finais de semana, a algazarra era total. Geralmente Pedrinho ia com seus pais passar o final de semana na casa dos seus avós. Ele só atentava para uma coisa. Reunir os primos e jogar bola, quase o dia inteiro, no campinho de terra batida, em frente à casa de taipa, construída rusticamente, mas de um aconchego impressionante. Dentro do campinho, Pedrinho se sentia um maioral. Como era de costume os adultos sentavam sempre a conversar à "beira de casa" e claro o moleque aproveitava para dá seu showzinho de exibicionismo que a bem da verdade só evidenciavam seus sonhos. Tentava lances bonitos, as vezes conseguia, outras não, reclamava, comemorava seus feitos, como se estivesse desfilando em um daqueles maravilhosos tapetes verdes de grama, por onde mundo a fora, rola o instrumento chave desta paixão nacional. A bola! Jogos televisionados?? Pedrinho não perdia nenhum sequer. E quando finalmente seu pai conseguiu comprar a tão esperada TV a cores, as custas de muito trabalho na agricultura, foi para um menino, descobrir um novo e fantástico mundo. Por vezes na hora dos jogos, olhando para os estádios, parecia hipnotizado olhando atento e com o rosto quase grudado na TV, falava sozinho! Um dia, ainda estarei em um desses, nem que seja só como torcedor, mas um dia eu vejo tudo isso bem de perto!
Seu pai, um homem de meia idade, trabalhador incansável e que nunca mediu esforços para garantir o bem-estar de sua família, fazia repetidamente a mesma promessa: Sim meu filho, um dia te levo em um desses. Mal sabia ele que não teria mais tanto tempo com a família, e que nem sequer repetiria mais tantas vezes aquela promessa para Pedrinho. A vida é acostumada a "pregar peças", e as vezes das mais dolorosas. O pai de Pedrinho, é diagnosticado com problemas cardíacos e dentro de pouco mais de três anos, o problema se agrava e o leva ao óbito, deixando a família em completa desolação e desespero. Pedrinho agora é um garoto triste, órfão de pai e de todas as promessas que ele o fizera.
O tempo passa, Pedrinho, sua mãe e seu irmão enfrentam uma situação financeira difícil. Na cidade em que vivem, mercado de trabalho é um termo praticamente desconhecido. Até que um dia, chega a Sebastianópolis, um tio da mãe do garoto. Seu Carlos, chegou dizendo ter sido informado da situação que os mesmos estavam enfrentando, diz ainda que não pode demorar na cidade, mas que talvez tenha trago consigo uma solução ou algo que amenize as necessidades da família. Na capital, onde mora a mais de 20 anos, abre-se oportunidade de trabalho praticamente todos os dias e, não ia ser difícil a pobre mulher se encaixar em uma vaga começar a ganhar seu dinheirinho. A resposta da mulher é de imediato um NÃO! Ela jamais saiu da pequena cercania, a ideia de fazer isso agora lhe causa pavor, não podia deixar a família de seu esposo, sua vizinhança, seu mundinho, pobre, mas de certa forma aconchegante.
Pedrinho estava sentado ao chão, tentando organizar um antigo jogo de futebol de botão que tinha reencontrado, ouviu toda conversa e não hesitou em interferir. A pergunta do menino não podia ser outra. Lá na capital tem estádio de futebol? Como a resposta foi positiva, virou-se para mãe e falou: - temos que ir. É a minha única chance de ver um estádio de perto, meu pai me prometeu. A senhora não pode tirar isso de mim. Aquelas palavras de Pedrinho foram comoventes e determinantes para que no outro dia, desembarcassem no terminal rodoviário da capital, carregando na bagagem, muito mais sonhos e esperanças do que mesmo roupa.
Algumas semanas se passam, a mãe de Pedrinho logo começa a trabalhar de vendedora em uma loja perto de casa mesmo. Pedrinho está matriculado e frequentando uma escola no mesmo bairro. A vida dos dois começa a dá sinais de melhoras. Todos os dias, seu Carlos, escuta do garoto, a mesma pergunta no café da manhã. Quando vamos ao estádio? E ele sempre responde: Assim que tiver um tempinho. Seu Carlos planeja levar Pedrinho de surpresa ao estádio municipal, que fica a duas quadras de onde moram.
Na manhã seguinte, seu Carlos diz a Pedrinho, que ele não precisa ir à escola, e que quer leva-lo a casa de um amigo, onde ele vai conhecer um novo amiguinho. O garotinho aceita e é inocentemente conduzido para a maior surpresa "boa" da sua vida! Chegando no estádio, seu Carlos para despistar, resolve entrar pelos fundos. Ele é amigo de um senhor que trabalha de zelador e que facilita a entrada dos dois. Os dois descem do carro, empurram o portão e o menino sonhador se ver diante daquilo que o manteve esperançoso durante anos.
O garoto fica perplexo, não sabe o que fazer, o que dizer, abraça muito forte o "tio" e chora de forma inconsolável. Jogado de joelho naquele gramado que tanto sonhou ver, olha para o céu e diz: Foi o senhor papai, eu sei que foi. O senhor prometeu e me trouxe aqui! Nessa hora, seu Carlos e o senhor que os acompanhava também já não seguravam as lágrimas. Um turbilhão de emoções envolvia a todos. De volta em casa, Pedrinho durante dias, semanas, não falou em outra coisa. Passou a ir mais vezes no estádio, recebeu convites para fazer testes nas categorias de bases e não obteve êxito. Isso nem o abalou mais. Seu maior sonho já tinha sido realizado.
Hoje Pedrinho vive com sua família naquela mesma cidade, que realizou o seu sonho. Sua mãe é promotora de vendas e ele estudou, se formou em educação física e é dono de uma ONG que trabalha a ressocialização de menores infratores a partir da prática desportista. Ministra palestras de autoajuda e em todas as suas apresentações arranja um espaço para contar a sua história, de sonhos, desilusões, esperança, solidariedade, e, ainda se emociona e chora relembrando a primeira vez que pisou naquele tapete verde.
Deusimar Oliveira.
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Aquele tapete verde
Short StoryAquele tapete verde conta a história de um garoto apaixonado por futebol em busca da realização de seu grande sonho: Conhecer um estádio de futebol. BOA LEITURA.