16 de Abril de 1902 às 18h32

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O hóspede passou o dia esperando por uma nova visita de seu anfitrião. Era o dia de finalmente saber se toda aquela chama que sentia quando o homem estava por perto era recíproca.

Ele quebrou as regras novamente, já tinha algum tempo que não fazia isso. Era um novo recorde.

Pela manhã, logo após o café, encontrou uma biblioteca alguns corredores mais distantes do quarto 701. No caminho de ida e volta se deparou com poucos hóspedes que não pareciam se importar com sua existência, o que de certa forma era bom porque naquele lugar cada um era mais estranho que o outro. O recinto de livros também parecia bem pouco visitado. Talvez as pessoas não leiam mais como antes. Uma pena.

Entre as várias lombadas empoeiradas da biblioteca, encontrou uma preta e desgastada. Com curiosidade, retirou a obra da prateleira e leu seu título: Drácula. Nunca havia ouvido falar.

Com medo de ser pego enquanto hesitava demais fora das áreas permitidas do hotel, decidiu retornar ao quarto 701 com aquele livro grosso.

Ao se ajeitar na cama, com o livro em mãos, começou a folheá-lo. A história era incrivelmente interessante, até começar a assustá-lo. Era um livro de terror bem antigo, contava sobre uma figura ilustre que era dono de um hotel. Seria ótimo se fosse apenas isso, mas essa figura tinha grandes presas em sua arcada dentária e chupava sangue. Para piorar o Drácula manteve um de seus hóspedes em cativeiro em seu estabelecimento.

O que na verdade assustava Dean não era apenas o que era contado em aquelas páginas, mas sim toda a semelhança com o que estava acontecendo ao seu redor. Eram muitas coisas em comum para aquilo ser apenas uma infeliz coincidência.

Será que Cam era na verdade o Drácula da história?

O som da maçaneta sendo girada fez com que Dean fechasse rapidamente o livro e o escondesse na gaveta da mesa de cabeceira. Cam entrou no quarto sem se importar em bater primeiro.

— Fiquei sabendo que estava caminhando pelo hotel hoje.

O hóspede não deveria ter ficado surpreso com a falta de delicadeza do anfitrião. Não esperava uma recepção melhor assim mesmo. Cruzou os braços por cima do pijama de manga longa.

— Você tem bons informantes.

Cam pressionou os olhos cor de musgo e deixou aparecer um dos caninos.

— Ninguém precisou me falar nada. Eu mesmo vi você rondando por aí.

— Então chegou a ver aonde eu fui?

— Vi que andou pelos corredores sem rumo. Fiquei lhe observando para ver se não havia ninguém que pudesse se aproximar muito de você, mas todos pareciam distraídos demais com seus afazeres. — Aproximou-se mais da cama, intimidador, com passos lentos. — Te vi descendo até a biblioteca e saindo alguns minutos depois com um dos volumes mais importantes de meu acervo.

Dean engoliu em seco.

— O que achou da história?

Já que Cam sabia do furto do livro, não havia mais porque mantê-lo escondido. Dean pegou o livro escondido na gaveta.

— Bom. Interessante. Inclusive um pouco aterrorizante — respondeu enquanto passava os dedos pelas lombadas de páginas amareladas. Levantou o olhar para encarar o homem e perguntou: — Esse é você? O Drácula?

— Não — a resposta foi curta, dura e direta. Dean deu um suspiro de alívio que logo foi engolido quando Cam levantou uma das laterais dos lábios e continuou: — Esse é o meu tataravô.

O coração de Dean acelerou mais do que devia. Só não sabia se de medo ou emoção.

Em um salto que podia ser contato em milésimos de segundos, Cam estava montado por cima do hóspede na cama. Esse conseguiu sentir a pulsação arrítmica das suas carótidas. Suor escorreu de sua testa até aquele local em seu pescoço. Rapidamente colocou a mão ali, tentando esconder o receio.

Cam, ao notar o movimento de recuo e seu olhar assustado, colocou a própria mão por cima da dele.

Dean sentia aquilo mais do que nunca agora. Uma sensação diferente, por mais que tivesse medo, queria aquilo. A sedução que Cam provocava nele o deixava fora de si. Com os rostos tão próximos, os narizes e os lábios quase se tocando, ele beijou o homem.

Surpreso com o próprio ato, se afastou com medo da reação do outro. Mas esse logo o puxou de volta pela nuca e o beijou mais vorazmente. Dean se pendurou em seus ombros, enquanto Cam segurava sua cintura.

O dono do hotel também parecia perdido em seus movimentos. O hóspede deixaria ir até onde quisessem, não era a primeira vez que ele fazia algo do tipo.

A camisa do pijama de Dean ficou solta em seu corpo e Cam traçava com os dedos de unhas longas todas as curvas de sua barriga. Quando pararam de se beijar, ele passou a beijar o pescoço inteiro de Dean e esse se inclinava para aproveitar mais o momento.

De repente, ao chegar com os lábios próximos da região abaixo da orelha, ele pareceu hesitar, como se algo estivesse errado, como se todo aquele fogo de antes tivesse simplesmente se apagado. Dean olhou para as íris verdes do homem e, ao invés de um olhar voraz, ele parecia tentar se segurar. Estava fora de controle.

— Cam?

— Vá embora.

Dean não entendeu a mudança repentina de humor. Os caninos do homem pareciam maiores sobre os lábios, suas pupilas dilatadas. Era exatamente como no livro. Agora conseguia finalmente entender e sentir aquele momento de medo.

— Vá, antes que eu te machuque. Antes que algo muito ruim aconteça.

Mesmo ao ouvir a ameaça, continuou hesitando. Não havia pagado sua estadia e suas coisas ainda estavam espalhadas no guarda-roupa.

— Cam, eu ainda não...

— Não importa. Dean, apenas vá, agora.

Dean nunca esperou que fosse chamá-lo pelo nome com tremor na voz. Num momento em que ele estivesse realmente com muito medo.

Enquanto o homem ainda tentava se controlar, Dean se desvencilhou dele e levantou-se da cama apressado. Saiu pela porta do quarto 701, sem levar nenhum de seus pertences e apenas usando os pijamas ainda no corpo. Correu apressado, para fugir daquele local estranho que lhe trouxe tantos sentimentos diferentes.

Depois de sair do hotel correu por mais de meia hora sem olhar para trás. Depois de muito tempo ainda podia ver o estabelecimento gótico ao longe. Exausto e perdendo a consciência, desabou no chão de terra.

Quarto 701Onde histórias criam vida. Descubra agora