Capítulo 1 Fuga

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Franziska caminhou lentamente pela abertura da caverna. Havia tochas que iluminavam a entrada, em ondas bruxuleantes, formando sombras nas paredes. A Lua a pico, indicava que já era meia noite. Ela adentrou a caverna, sorrindo, com uma alegria similar a de quando ela corria pelos campos quando criança, com a brisa do verão soprando seus cabelos de fogo, sentindo como se estivesse voando.

Logo, ela chegou ao centro da caverna, onde todos os membros da Dunkelheit estavam com suas capas ritualísticas: um veludo caro em tom de vermelho bordô, com o símbolo de Asmodeus em dourado. Duas longas filas de capas formavam-se ao longo da caverna, deixando um corredor ao meio, onde os pés de Franziska pisavam. Ela estava com sua capa que ainda era branca, símbolo da pureza daquela que ainda não havia sido iniciada nos ritos sagrados, junto com um longo vestido branco simples, que formava uma cascata de babados de renda. A frente, ela podia ver sua mãe, a alta sacerdotisa segurando o punhal de iniciação, com suas lâminas duplamente afiadas, todo dourada e com o cabo incrustado com três grandes rubis. Ela ainda estava andando e sorrindo quando finalmente percebeu a presença de uma figura em frente ao altar de iniciação, a qual estava de costas para ela. Pela altura deduziu ser um homem, rico, pois estava com um terno de alta qualidade, do qual nem mesmo os avós de Franziska possuíram. De repente, um arrepio percorreu sua espinha e seus sorriso começou a esmorecer, conforme se aproximava do homem. Ela também percebeu que não havia o livro das almas no altar, onde ela iria assinar seu nome e jurar lealdade ao mestre.

Quando estava próxima o suficiente do homem, ele virou-se e sorriu para ela. Ele tinha cabelos compridos, na altura dos ombros, negros como a noite que fazia, traços asiáticos, uma pele imaculada, porém seus olhos eram de um gato, amarelos e com uma linha preta que se dilatou ao ver Franziska, assim como os felinos fazem ao verem sua presa. Franziska olhou para sua mãe em busca de refúgio e compreensão, porém a mesma estava apenas sorrindo, um sorriso feliz porém maquiavélico. Quando o homem tocou sua mão, Franziska se contorceu em um novo arrepio. A felicidade havia se transformado em pânico e então, tudo se torna um borrão em sua visão.

Um beijo em sua mão; a cabeça do homem a sua frente se tornando a de um bode cadavérico preto com longos chifres dourados; um corte em sua mão; tiros sendo disparados; fogo ao seu redor; o pânico em seu peito. E por fim, correr, até tropeçar.

***

Suando frio em uma madrugada de inverno com neve, Franziska se senta em um solavanco, com o coração acelerado, o ar lhe faltando os pulmões por um grito de puro desespero. Aileen entra no quarto com uma camisola verde e um roupão de lã de carneiro branca, em puro desespero também.

-Franziska o que aconteceu? – Ela senta-se rapidamente em frente a Franziska e pega no seu rosto – O mesmo pesadelo de ontem? – Aileen tinha a pele imaculada branca e um longo cabelo loiro, frisado em pequenas ondas, totalmente diferente do cabelo liso e ruivo de Franziska. Seus olhos eram azuis, levemente turquesa, como uma água marinha. Seu nariz fino e empinado encaixava-se perfeitamente a suas maçãs rosadas e suas sardas marrons.

Franziska balança a cabeça em sinal de sim, pois não conseguia sair uma palavra por sua boca. Aileen a puxa para um abraço, sentindo o rosto quente dela em contraste a pele fria e molhada de Franziska. Então lágrimas de dor começaram a escorrer pelos olhos dela. Era nesses momentos que ela perdia suas esperanças de ter uma vida normal. De poder estudar como qualquer adolescente, fazer faculdade, se apaixonar, ter filhos, construir uma vida e morrer com seus cabelos brancos, sentindo a brisa do verão que tocava seu rosto quando era apenas uma garotinha na Alemanha. Tudo isso era uma realidade que parecia distante demais para ela. Aileen não podia ler seus pensamentos, mas ela sabia o que se passava na cabeça da garota que amava. Sabia dos riscos, desse amor condenado ao fracasso. Era isso que Franziska falava quando tinha seus pesadelos: Que o amor delas estava fadado ao fracasso e que ambas iriam se machucar. Mas Aileen não acreditava nisso. Ela apertou seus braços ao redor de Franziska e com uma das mãos começou a acariciar seus cabelos vermelhos, tão intensos quanto ao sangue e tão vivos como o fogo. Ambas sabiam da dualidade de opinião uma da outra. Cansaram de discutir sobre isso e de tentar afastar-se uma da outra. Era claro que quando Isla soubesse, não aceitaria. Ela não arriscaria a vida de sua única filha com uma condenada como Franziska. Mas era impossível para ambas ficarem longe uma da outra. Não importava o quanto tentasse se afastar, ambas sempre acabavam juntas de novo. Aileen se afasta de Franziska e beija todo o rosto dela, até finalmente chegar a seus lábios. Em um beijo cheio de amor e tristeza, suas almas se consolavam. Franziska ficava com medo que Aileen ardesse em chamas, como aconteceu com outra garota que ela havia beijado a anos atrás, no barco que a atravessou da Inglaterra para a Irlanda. Mas isso nunca aconteceu. Franziska fugiu de todas as formas de Aileen, até que uma noite, ela foi acordada com um beijo de Aileen. Passaram a noite toda acordadas esperando pelo pior, mas nada aconteceu. Desde então, escondidas pelo véu da noite, ambas nutriam seu amor.

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⏰ Última atualização: Jul 19, 2023 ⏰

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