Bem vindo a essa história! Antes de começar, é importante que leia esses avisos:
↬ Essa é uma one-shot, ou seja, uma história curta de apenas um capítulo. O tema principal é a morte, então, se você não se sente confortável para ler sobre tal assunto e não gosta de sadfics, essa história não é para você.
↬ Essa one-shot não terá uma playlist.
↬❁↫
Levou uma vida inteira para que eu entendesse que a morte é sobre a vida. Ou sobre o que restou dela.
Na juventude, eu não costumava pensar sobre a velhice. Oitenta anos parecia distante demais e até lá teria uma vida toda, minutos demais para serem aproveitados como eu quisesse, mas dos dez aos oitenta pareceu um vácuo: não são minutos demais, é tempo de menos. A vida passa e a gente fica, fica para trás nas novidades, nos nascimentos, na própria vida que leva aqueles que amamos e nos deixa para podermos odiar tudo mais um pouco. Passei a odiar o choro do bebê, a música adolescente e as reclamações dos mais velhos. Em comum temos o cansaço da vida que nem começou ou da que já está terminando, pouco sentido não traz muito interesse.
Eu nunca gostei de pensar na morte. Sempre entendi que pensar em morrer é mais doloroso que o próprio ato, que o matar da mente é pior do que o morrer do corpo, mas Chaeyoung sempre teve essa mania insistente de me perguntar sobre o mundo, sobre a vida e sobre a falta dela. Foi a única que, mesmo aos vinte e poucos, pensava nos oitenta e tantos.
O dia que ainda revivo era um sábado de manhã, preso na minha mente como se tivesse acontecido há poucas décadas. A brisa leve do amanhecer ensolarado batia em nossos corpos e aquecia nossas peles, nos fazendo fechar os olhos para aproveitar as sensações. Os aromas de carvão queimado e café se misturavam no ar. Nós esperávamos juntas pelo trem que Chaeyoung pegaria sentadas em um banco de madeira da estação, próximas dos trilhos. Chaeyoung estava ao meu lado, quieta e de braços cruzados enquanto segurava um copo de papel cheio de café. Tínhamos o poder de tornar o silêncio agradável, sem necessidade de ser quebrado, mas nos fazendo ainda mais íntimas como almas.
— Mina...
— Hm?
— Como você acha que será o fim do mundo?
E então abriu os olhos, direcionando a cabeça em minha direção.
— Não sei, Chaeng. Você tem algum palpite?
Até hoje, não sei se ela percebia minha intenção, mas eu sempre rebatia sua pergunta com outra. Era claro que deixá-la se expressar era mais importante do que responder. No fundo, não queria uma resposta, queria mais perguntas.
— Acho que o Sol vai engolir a Terra algum dia, quem sabe lá para os anos dois mil?
— Acho que o mundo acaba mesmo é para quem morre, amor. Não pense muito sobre isso.
E eu estava certa. Pouco depois, o mundo acabou para Chaeyoung e uma descoberta começou para mim: perder alguém que você ama também é uma forma de ter seu mundo destruído. Mas é mais lento. E dolorido.
Às vezes, tento pensar em alguma forma de voltar no tempo e impedir que ela entrasse naquele trem, mas como desviar do destino se ele já foi escrito nas estrelas? Aliás, a morte é destino ou um problema evitável? Se Chaeyoung tivesse desistido de viajar para encontrar a família, ela teria sido poupada ou envelheceria comigo?
No primeiro dia, após a notícia, eu abri a porta da nossa casa e desejei encontrá-la ali como se tudo fosse um pesadelo. Desejei vê-la em pé no meio da sala, assistindo à televisão com a expressão concentrada que me fazia sorrir, ou misturando tintas e óleos, criando novos tons vibrantes para começar uma nova tela. O silêncio pairava sem sua risada e as tintas estavam no canto, esquecidas no chão como se ela fosse voltar a qualquer momento para levá-las para seu ateliê. Eu não tive coragem de levantar para ir ao trabalho, apenas fiquei deitada no chão, ao lado do tapete e junto ao cheiro forte das tintas que já não me incomodavam mais. Vinte e duas horas se passaram. Houveram algumas batidas na porta, alguns telefonemas e buquês jogados no jardim. Todos foram ignorados.
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Infinito em 7 Dias | MiChaeng
FanfictionMina levou uma vida inteira para entender que a morte é sobre o que restou da vida. Ao perder um amor ainda jovem, ela se questiona sobre seu futuro, sobre sua própria velhice e sobre o que fazer com os resquícios que aquele amor lhe deixou.