me abrace tão forte quanto me ama | único

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gon mexia na franja de killua completamente absorto, deitado de lado em sua cama para que pudesse observar os olhos azuis cor de mar melhor. era madrugada na ilha da baleia e corujas atenciosas piavam de algum lugar que podiam ouvir enquanto repousando em silêncio, algo que nenhum dos dois gostaria de quebrar. preferiam navegar calmamente no brilho constante do olhar alheio a palavras que poderiam ser vazias e sem sentido; ambos estavam inclinados ao quieto do juramento pacífico de cuidado.

a luz do quarto estava apagada, sobrando apenas os reflexos pálidos das ondas que a lua refletia por todo o espaço. gon não gostava de dormir com cortinas e killua achava naquele ato mais um motivo para amá-lo. não eram difíceis de achar e descobria-se um colecionador assíduo deles, amontoando-os em um canto de seu coração para revisitar sempre que quisesse; o moreno era uma galeria de sentimentos bons na qual via-se perdido e embasbacado pela eterna beleza de algo positivo. era tão incomum, imaculado. na penumbra ele analisa as bochechas sardentas e redondas e seu sorriso com um carinho que não precisava ser audível para existir e sente-se igualmente indigno e sortudo por tê-lo.

— gosto de rir com você.

a declaração sussurrada fizera com que o zoldyck desse um pulo na cama, assustando-se com a espontaneidade. não estavam rindo naquele instante e gon falava seriamente, porém com tom doce; a sua habilidade para ter essas falas com tons tão agradáveis ainda encantava killua, que, apesar de confuso, sentia-se agradecido por alguém daquela maneira existir.

— como?

— gosto de rir com você. como fizemos mais cedo, lembra? — questionou, arrastando a ponta de seus dedos calmamente pela extensão do pequeno nariz alvo e então desenhando o contorno da boca sutilmente. ele adorava apreciar os traços tão perfeitos dele e fotografa-los em sua memória. — quando estávamos brincando pela ilha, ao pescarmos, quando vimos as estrelas do céu. ouvir você rir me faz querer rir porque sei que está feliz e se você estiver feliz, eu também estou.

killua sentiu suas bochechas esquentarem e permaneceu em silêncio por falta de palavras. não adiantaria ler todos os clássicos do mundo ou devorar um dicionário; na presença de gon freecss as expressões sumiam e sobrava apenas um protótipo de ser humano para ser apresentado. sabia muitas coisas, sabia mesmo: era muito bom em história e raciocínio lógico, excepcional em assassinatos e mais infinitas qualidades, mas tudo isso se tornava tão supérfluo se visto sob o olhar amável do moreno que não sabia mais o que possuía dentro de si para oferecer. se retiradas suas qualidades vindas do trauma sobraria, ironicamente, apenas um coração feito de traumas.

um tímido "eu também gosto" escapou de sua boca no momento em que freecss começou a dedilhar suas bochechas. por vezes achava que aquela era uma forma de código morse e que os toques delicados significavam alguma coisa; outras vezes apenas perdia a noção de tempo e era levado para uma realidade paralela. naquele dia, entretanto, entendera como um convite para encurtar a sempre presente distância entre eles e cautelosamente aguardar a reação de seu amigo. não estava tão perto assim e ainda sentia suas batidas tropeçarem enquanto gon percebia a sua inédita atitude e apreciasse discretamente; killua era tão defensivo todo tempo. diria que o gosto de deixar barreiras de lado era agridoce.

gon permanecia em estado de efêmera adoração aos mínimos detalhes de seu convidado quando declarou:

— você é tão bonito, killua.

o albino arregalou os olhos e puxou a coberta até deixar apenas eles de fora. não conseguia entender o ponto de toda aquela súbita corrente de elogios e declarações e dentro de si todos os instintos apitavam indicando perigo; mas era gon, e gon nunca quereria fazer mal a ele. no tom de sua voz habitava o resquício perdido do falar o que se pensa sem segundas intenções e sem malícia, apenas pelo incrível ato de deixá-lo a par de seus pensamentos. ali deitados de madrugada killua achava que cada um deles tornava-se ainda mais especial, concreto, verdadeiro; o quarto alheio tomava o lugar do que conhecia por mundo e quando percebeu já não queria mais ir embora da segurança daquele ninho. killua era um filhote de cuco e nunca soubera o significado de lar até conhecer aquele garoto.

✧ A FESTA, killugonOnde histórias criam vida. Descubra agora