Cap. Único: Ainda vivo por ti

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Quando os primeiros raios de sol invadiram seu quarto, o relógio despertou pontualmente às seis e como todas as manhãs Natasha já estava acordada.

Ela observava atentamente sua companhia esparramada na cama resmungar e cobrir o rosto com o travesseiro ao ouvir o toque do despertador.

A cena que se repetia diariamente arrancava de Natasha um suspiro seguido de um sorriso preguiçoso, e depois aquela mãozinha acariciava seu rosto e a vozinha doce pedia para ficar na cama só mais um pouquinho.

E ela sussurrava boba: “só mais um pouquinho“.

Levantar aquela hora significava quebrar sua rotina, o elo que apenas elas tinham e Natasha jamais escolheria fazê-lo.

Enquanto guardava o sono da filha, continuava encantada em como a pequena era uma cópia fiel sua. Ambas sérias e desconfiadas com desconhecidos, falantes e carinhosas com as poucas pessoas que permitiam adentrar seus corações.

Mas o sorriso que obrigava sua linda garotinha fechar os olhinhos, era definitivamente dele. O nariz enrugado e a testa franzida ao chorar pertencia à ele também, essa era a pior parte para Natasha. Lembrar de sua filha chorando, fazia sua mente viajar para o segundo pior dia da sua vida.

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Nestes cinco anos eu tentei fazer uma coisa: chegar até aqui. Este foi o motivo! Trazê-la de volta. – Ele precisava entender o por quê era ela quem tinha que se sacrificar.

Há cinco anos Thanos havia dizimado metade de todos os seres do universo, sua filha foi uma delas. Aquela garotinha era a sua luz, a sua esperança, a sua razão de viver. Não podia aceitar que ela se fosse para sempre, não podia desistir dela.

Ela vai precisar de você quando voltar. – Ele estava decidido. Sabia que Natasha era a única que podia fazer aquilo, a única que tinha coragem e amor suficientes para seguir em frente, já ele, não conseguia viver sem uma das duas.

Nenhum dos dois queria ver o outro partir, eles lutaram para trazer sua filha de volta. Não foi certo, não foi justo. Eles mereciam uma chance de serem felizes, de terem uma família, de viverem em paz. Mas o destino foi cruel e os colocou diante da escolha mais difícil de suas vidas.

Estavam pendurados por um único cabo preso ao cinto de Natasha, com uma mão ela tentava leva-los para cima de novo e com a outra o segurava pelo antebraço. Ela sentia a dor nos músculos, a pressão no peito, o medo no coração. Ela não queria soltá-lo, não queria perder o seu melhor amigo, seu parceiro, seu marido.

Eles se olharam com intensidade, com carinho e gratidão. Se lembraram de tudo o que passaram juntos, das risadas, das lágrimas, das aventuras, dos perigos. Eles se lembraram do quanto se importavam um com o outro, do quanto se protegiam, do quanto se admiravam. Eles se lembraram do quanto se amavam. Se lembraram de que eram o porto seguro e o lar um do outro.

Vocês são as melhores coisas que já me aconteceram na vida. Eu quero que sejam felizes. Sou muito sortudo por ter tido uma família tão linda e maravilhosa. Eu agradeço todos os dias por ter conhecido você, Nat. - Com o nariz enrugado e a testa franzida ele se despediu aos prantos.

Não...Por favor - Implorou em meio as lágrimas. Ela não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo, que ele estava se sacrificando, que estava se despedindo dela. Ela não conseguia imaginar um mundo sem ele, sem a sua presença, sem a sua voz, sem o seu sorriso.

Eu te amo...Por favor, diga à nossa filha que a amo. – Ela não podia deixá-lo ir.

 Mas de repente ela não o segurava mais. Com um único impulso ele os separou para sempre. Ele caiu em direção ao abismo, sem hesitar, sem arrepender-se. Ele caiu sabendo que tinha feito a coisa certa, que tinha cumprido a sua missão, que tinha salvado a sua filha. Esse era o seu sacrifício, o seu legado.

E com essa memória ela foi levada para o pior dia da sua vida....

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Papai, papai! Vamos brincar lá fora. – A garotinha desceu as escadas pulando de degrau em degrau e correu para a cozinha onde seus pais preparavam o café da manhã. Ela estava vestida com um pijama rosa de unicórnios e tinha os cabelos ruivos presos em duas maria-chiquinhas.

Primeiro nós comemos, depois você pode acabar com o papai com os golpes que te ensinei. Que tal? – Natasha piscou para a pequena que sorriu imitando a piscada de olho da mãe.

Então as duas se uniram para tentar me derrotar? – Beijou Natasha fingindo indignação. - Vamos ver mais tarde quem vai vencer essa luta. – Pegou a garotinha no colo e a levantou no ar, fazendo-a gargalhar.

Quando se apaixonaram, Natasha acreditou que já o amava o máximo que podia amar um homem, então ela engravidou e o assistir sendo pai fazia seu coração transbordar. Ele era um homem carinhoso e brincalhão que amava contar histórias para a filha e inventar aventuras para ela.

Era uma manhã ensolarada de domingo, em dias como estes a família passava horas ao ar livre brincando no campo gramado da fazenda, lá havia uma piscina infantil inflável cheia de água, com a superfície coberta por bolinhas de plástico coloridas que elas usavam “para atacar o papai”, e depois corriam para longe fazendo-o se cansar de correr atrás das suas garotas preferidas e implorar por trégua.

мама... -  A garotinha parou de repente, chamando pela mãe em um sussurro. Os olhos que antes sorriam tanto quanto seus lábios agora estavam cheios de lágrimas e em pânico.

Qual o problema, Malen’kiy? – Natasha se ajoelhou preocupada diante da pequena.
Assistiu sua doce menina se desfazendo, implorando aos pais por socorro com seus olhinhos brilhantes. Em uma tentativa falha, agarrou-se a filha que esvaiu lentamente em seus braços.
Sentiu o calor dele junto do seu corpo, braços ao seu redor. Os gritos desesperados se tornando um só, reverberando por toda propriedade.

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мама, você está chorando. – A mãozinha secou uma lágrima solitária que escorreu por sua bochecha.

E aquela vozinha a fez voltar à realidade quando os seus piores pesadelos haviam lhe invadido novamente.

É por causa do papai, está com saudades? – Perguntou enquanto beijava a bochecha que acabara de secar, aconchegando-se ao corpo de Natasha que assentiu, incapaz de mentir para a filha.

A garotinha murmurou um “eu também, mamãe” passando os braços ao redor do seu pescoço.
Natasha abraçou a filha com força, sentindo o calor e o amor que emanavam dela. Ela pensou em tudo o que havia perdido, em tudo o que havia deixado para trás. Ela pensou no pai da menina, que nunca mais veria o sorriso dela, que nunca mais ouviria a sua risada. Ela pensou na dor que lhe marcara a alma, que lhe causara feridas profundas. Pensou na morte, que lhe rondava a cada dia, que lhe ameaçava a cada instante. Ela pensou em como era difícil recomeçar, em como era difícil ser feliz.

Mas ela também pensou em como era sortuda e em como era abençoada. Pensou na filha, que renascera e agora lhe dava forças para sobreviver. Ela pensou no futuro, e em como aquela garotinha era forte e corajosa. Ela pensou em como era possível chorar e sorrir ao mesmo tempo.

Olhou nos olhos da filha, que tinham a mesma cor dos seus. Neles ela viu esperança, fé e amor.
Natasha sorriu e disse:
- Eu te amo, malen'kiy. Você é o meu maior tesouro.

- Eu te amo, мама. Você é a minha melhor amiga.

E elas se abraçaram novamente, sentindo que nada poderia separá-las.


FIM!

Ainda vivo por ti / One-ShotOnde histórias criam vida. Descubra agora