Parte 1 - Mente Fértil

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  O ônibus estava lotado, pra variar. Eu estava voltando do trabalho. Passava das 19h e estava um dia insuportavelmente quente. A maioria dos passageiros estava transpirando e alguns estavam com um odor desagradável exalando das axilas. Em meio à multidão aglomerada no corredor do ônibus, eu observava um rapaz, de aproximadamente 1 e 80 de altura, barba por fazer, cabelo preto e curtinho, pele bronzeada e costas largas. Estava com uma mochila volumosa entre as pernas grossas. Ele encarava a rua. As luzes dos postes passavam rapidamente enquanto se segurava firme no apoio de metal do teto. Seus músculos se contraíam a cada movimento brusco do automóvel. Apertava forte a barra de metal pra se equilibrar, o que fazia suas veias saltarem. Sua camiseta estava molhada nas costas. Devia ter tido um dia infernal, assim como eu. Assim como a maioria das pessoas dentro daquela lata-velha.

 Como de costume, minha mente divagou. Imaginei o quão bom seria se aquele ônibus estivesse vazio. Somente eu e ele... Ou melhor; passei a me imaginar - em um impulso de coragem - passando por entre os passageiros, sem pedir licença, indo até o rapaz e o segurando pelo braço brilhoso pela transpiração. Ele iria me olhar, confuso, e então eu iria me ajoelhar naquele chão imundo e trêmulo daquele ônibus degradante. Iria desabotoar a sua calça jeans, enfiar a mão em sua cueca úmida de suor e puxar seu pau pra fora. O cheiro subiria com um vapor de suas bolas quentes e molhadas. Eu iria abocanhar aquele pau grosso e mole e me deliciar enquanto alguns tarados iam começar a se masturbar assistindo, incrédulos. Ele iria endurecendo dentro da minha boca e, em menos de dois minutinhos, iria gozar rios de porra na minha boquinha. Porque talvez estivesse precisando disso; descarregar todo seu cansaço dentro de uma boca disposta a engolir cada gota. Ele iria gemer tão alto com sua voz grossa que iria soar como um rugido de um bicho feroz. Pensar no horror estampado no rosto de cada passageiro me deixava em êxtase.

 O ônibus brecou violentamente, os pneus deram um berro agudo e o som estrondoso da buzina quase explodiu os tímpanos dos passageiros. Voltei à realidade rapidamente e agarrei forte a barra de metal pra não cair em cima de uma senhora sentada. Senti que estava molhada com os pensamentos que acabei de ter (tanto que uma gota escorria da minha calcinha ensopada e descia pela minha coxa por baixo do vestido social preto. Minha buceta pulsou. O motorista passou a discutir com o motorista do carro à frente e as pessoas passaram a resmungar enquanto uma ou outra reclamava em voz alta. Enfim, a bela harmonia de um transporte público lotado no fim do dia...

O rapaz alto havia descido do ônibus há mais ou menos meia hora, e eu jamais iria esquecê-lo. Tenho esse problema de me apaixonar diariamente por desconhecidos em transportes públicos.

O ônibus ia esvaziando e chegava o meu destino. Apertei o botão de parada e, antes que o ônibus parasse por completo, as portas foram se abrindo. Aguardei ele parar e então desci irritada com o motorista. O que ele queria? Que eu pulasse com veículo ainda em movimento? "Custa abrir as portas quando já estiver parado, porra?" pensei comigo mesma.

 O ponto que eu descia ficava na calçada de uma praça, e nessa praça havia alguns aparelhos para idosos se exercitarem, um parquinho para as crianças e um campinho - não muito grande - de futebol. Haviam imensas grades em volta do campo, o separando da praça. Cerca de oito moleques, aos gritos, corriam atrás de uma bola, sujos e ensopados de suor. Aparentavam ter entre dezesseis e dezenove anos.

 Encostei na grade e esperei meu marido chegar pra me acompanhar até em casa. Eu precisava passar por uma rua onde o poste de iluminação havia queimado há meses e muitos assaltos e abusos estavam acontecendo por lá, então meu marido se propôs a me buscar.

 Percebi de relance quando um deles cutucou um dos colegas e apontou pra mim, ofegante. Logo, a maioria deles estava olhando e comentando. Ouvi um assovio e um deles murmurou algo e pude ouvir a palavra "loirinha gostosa" em uma frase pouco abafada pela distância entre nós. Eu fiquei levemente irritada. Peguei o celular e liguei pro meu marido. Depois de duas tentativas ele atendeu. Estava um barulho horrível na ligação e logo pude notar que havia uma música de fundo e algumas vozes. Estava bebendo, novamente... Não consegui entender nada do que ele dizia mas consegui compreender o que pareciam ser frases como "eu esqueci" e "já tô indo aí". Respirei fundo, profundamente aborrecida. Desliguei a ligação, guardei o celular na bolsa e saí andando em passos firmes.

 Após uma caminhada de aproximadamente cinco minutos (pode parecer pouco mas faça uma caminhada de cinco minutos em uma subida íngreme e irá ver que há muito no que refletir nesse tempo) minha irritação logo se transformou em uma curiosidade. Durante o trajeto até em casa, eu refletia sobre a situação. Pensava na boa parte daqueles moleques chegando em casa e suas mães mandando eles irem imediatamente pro banho ou comerem alguma coisa. Imaginei cada um deles no banho pensando em mim, se é que me entendem. Minha mente fértil nunca me deixou em paz mesmo.

 Antes de dormir, eu tomei um banho, me sequei, enrolei a toalha na cabeça e tive uma conversinha comigo mesma no espelho embaçado - um dos sinais da minha possível esquizofrenia.

 - O que você quis com aqueles pensamentos?

 - Não sei! Mente fértil, talvez? Esses pensamentos me controlam e você sabe disso. - eu movia os lábios mas não soltava um som enquanto passava uma máscara hidratante no rosto. Um fio dos meus cabelos dourados caiu sobre meu rosto e o ajeitei pra baixo da toalha, com cuidado pra não sujar o tecido da toalha com o creme. Meu marido estava roncando no quarto, fedendo a álcool.

 - Mente fértil? Sua mente não é saudável. Pensar em garotos? Isso não é um tanto doentio?

 - Não são crianças, Débora! São...jovens-adultos. - dava de ombros enquanto gesticulava - E não, minha mente não é nem um pouco saudável, concordo com você.

 - Tá, e por que não tem pensamentos assim quando é um marmanjo que mexe com você na rua? - me questionei e me deixei sem resposta.

 - Não sei... Deve ser porque eles fazem isso com todas as mulheres que vêem.

 - E os garotos não?

 - Acho que os mais novos costumam ser mais exigentes. Quando acham uma mulher bonita, é porque ela é realmente bonita. Eu sempre gostei de Mucilon e você sabe disso. Eu fui chamada de gostosa, o que eu posso fazer? - pisquei pra mim mesma e ri sozinha.

 - Terapia?! - exclamei em resposta em pensamento, com os olhos castanhos claros arregalados.

 - Terapia é cansativo. É desgastante. - fazia uma expressão de sofrimento enquanto gesticulava - Como eu iria chegar pra um psicólogo desconhecido e falar que tenho pensamentos eróticos com outros desconhecidos na rua? E outra, eu teria pensamentos eróticos com o psicólogo também.

 - Isso é mais comum do que pensa.

- Ué... Então não preciso de terapia! Se é comum, é natural! - dei de ombros novamente.

 - A questão é que você MAIS UMA VEZ pensou em descontar a raiva de seu marido em sexo com outra pessoa!

 Fiquei em silêncio por um momento, pensando da vez em que eu e meu marido brigamos e no dia seguinte fui visitar um amigo nosso em comum. Tive uma recepção miserável que durou dez minutos, tirando os cinco que ele tentou me surpreender com um vinho caro me bajulando e outros dois procurando alguma música pra deixar "no clima". Argh.

 - Mas foi tão bom... - eu respondi a mim mesma, fitando o sinal de nascença na lateral do meu queixo redondo.

 - Não foi. Eu tava lá. Eu sou você, esqueceu? Foi uma merda. Prometa que vai procurar terapia e tentar tratar isso, Débora.

Abri um sorriso maléfico, encarando a mim mesma através do espelho.

 - Tá, tá... Prometo, Débora.

Os Garotos do CampinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora