O Licor de Hibisco

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A mãe de Lourenço foi, desde jovem, uma grande entusiasta da fabricação de licores. O que no início não passava de um hobbie, acabou se tornando em uma fonte de renda alternativa que cresceu com o tempo. Foi durante a infância de Lourenço, quando se mudaram para essa casa com um extenso jardim, herdada pelo pai de Lourenço, que ela conseguiu estabelecer uma clientela fiel e tornar esse o seu trabalho principal, que eventualmente passou a ser a fabricação de licores especificamente de hibisco.

Por algum motivo, esse havia se tornado o favorito de seus clientes, que após experimentarem do sabor que alterna suavemente entre tons cítricos e adocicados, jamais compravam licores produzidos a partir de qualquer outra erva ou fruto que ela pudesse extrair de seu jardim.

Apesar de sua paixão pela fabricação das bebidas, a mãe de Lourenço de maneira alguma permitia que seu filho provasse uma gota sequer dos licores. O garoto adorava acompanhar o processo de fabricação caseiro, que ia desde os cuidados botânicos com a plantação de pés de hibisco, que aumentava a cada ano em seu jardim, até a parte mais prática do preparo da bebida e a espera durante os dias que passava em processo de maceração.

Toda essa imersão em que foi inserido, serviu para que sua curiosidade sobre o sabor daquela bebida crescesse cada vez mais. Mesmo após atingir a maioridade, sua mãe continuava a proibir o consumo do licor por parte do filho, assim como outras bebidas alcoólicas, sob a justificativa de que não gostaria que ele viesse a se tornar um dependente, algo que havia ocorrido com seu pai quando Lourenço ainda era uma criança, e que ambos sabiam que havia sido fatal.

Lourenço, que sempre respeitou as decisões de sua mãe, acabava por aceitar a justificativa e tentava, inútilmente, reprimir aquela ânsia que crescia dentro de si. Uma necessidade cada vez maior de sentir o líquido escuro do licor molhando seus lábios e descendo por sua garganta crescia dentro dele. Já havia tomado chá de hibisco algumas vezes. Seria o gosto parecido? Talvez mais doce. Talvez levemente amargo. Parecia mais denso. Nutria uma certeza de que seria saboroso.

A recomendação de consumo era de no máximo uma pequena taça por dia, de maneira que uma garrafa do licor duraria um mês, caso fosse consumida por apenas uma pessoa. Então, de mês em mês, Lourenço assistia os fiéis clientes de sua mãe baterem à porta em busca de suas preciosas encomendas. Pagavam um valor alto pelo produto, e se voltavam a comprar é porque sabiam que valia a pena. Os feedbacks eram sempre incríveis, "me sinto tão cansado com a rotina, às vezes não sinto qualquer motivação para fazer minhas atividades diárias, mas a ideia de chegar em casa no fim do dia e tomar uma taça desse licor maravilhoso sempre me conforta", ou até mesmo, "você pode achar que estou exagerando, mas parece que esse licor fez com que eu me sentisse viva novamente, ninguém do meu trabalho sabe, mas todo dia antes de sair de casa tomo uma tacinha e me sinto imediatamente bem para lidar com qualquer coisa". Esses eram alguns dos relatos que comprovaram que a receita da mãe de Lourenço realmente era valiosa.

Vez ou outra novos clientes surgiam, e Lourenço e sua mãe se viam diante do desafio de expandir a produção ainda mais, plantando novas mudas e aumentando o estoque. Quando alguns clientes deixavam de aparecer, até se sentia mais aliviada, pois frequentemente mesmo os dois juntos tinham dificuldade de dar conta de toda a produção, tendo em vista que ela não gostava da ideia de contratar pessoas de fora da família que pudessem ter acesso à sua preciosa receita.

Com o passar dos anos, as privações que a mãe de Lourenço impunha sobre ele, e que iam muito além da proibição do consumo de bebidas alcoólicas, começaram a gerar discussões entre os dois. O filho, que já passava dos vinte anos de idade, começava a sentir-se demasiadamente controlado para um adulto. Foi então que, após uma dessas discussões, que acabou tomando proporções maiores do que as anteriores, Lourenço esperou sua mãe sair de casa e resolveu finalmente beber do licor, em um ato que expressava sua rebelião diante dos anos em que se manteve subjugado sob as vontades de sua mãe.

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