Ophelia sentou à frente da mesa de centro, a tábua áspera raspando nos joelhos enquanto agarrava as saias para não deixar transparecer o tremor nas mãos.
Ela olhou para a cerâmica pintada à mão, dezenas de pratos transbordando mais molhos saborosos e frutas suculentas do que sua família jamais comeria. Do que seu país jamais comeria. E não havia uma colherada sequer daquela refeição que não estivesse boiando em veneno.A rainha era uma sombra do outro lado da mesa, a paciência de quem não conhecia a fome esperando a provadora cumprir sua função. Atrás dela, uma linha de guardas armadurados agarrava o cabo das espadas, prontos para agir caso as denúncias de que a comida estivesse envenenada fossem verdadeiras.
Ophelia pegou a colher de metal e afundou no purê macio, levando-o à boca; fez o mesmo com uma pequena porção de cada um dos pratos, sentindo o aroma da comida se misturar ao perfume enjoativo da rainha quando ela se inclinou para inspecionar o trabalho da provadora.
Ela suprimiu uma onda de náusea quando o veneno apodreceu o fundo de sua língua, unhas feitas de morte ameaçando rasgá-la de dentro para fora antes de amansar como uma besta que percebe que está, afinal, em casa. Ergueu a cabeça para deixar a rainha vê-la engolir. E sobreviver.— A paranoia de vocês me faz questionar se não devo removê-los de suas posições. — a rainha resmungou para os guardas. — Agora deixem-me! Quero comer em paz!
Ophelia arrastou-se para trás, levantando devagar para que não a vissem cambalear com a vertigem. Viu os guardas saírem, e antes de fechar a porta dos aposentos da rainha, ouviu o barulho do talher contra a cerâmica.
Havia em uma colherada daquele jantar, o suficiente para matar cinco homens adultos. E Ophelia sabia disso, pois já havia visto os corpos.Seu teste havia terminado.
Quando a correria começou, ela já estava longe, mas não tão longe que não pudesse receber o chamado da nova rainha.
Não tão longe que não pudesse receber sua recompensa por dar início à uma nova era.