capítulo único - tu já conversou com deus?

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algumas coisas precisam ser ditas
alguns deuses merecem ser mortos

inspirado em: gottasadae, bewhY

eu serei o centro, será a forma de deus. o mundo estarás em minhas mãos, a coroa da glória estará nas minhas mãos. eu definirei os padrões, revelarei o futuro. falsos viverão em arrependimentos, eu viverei sobre deles”

Hongjoong mata deuses. Não quaisquer deuses, não os deuses que liberam energias vitais, não aqueles que suspiram nos rios nem os que chacoalham o vento ou fazem uma manga amadurecer. Hongjoong mata aqueles deuses que ameaçam o equilíbrio, aqueles deuses criados na boca de vulcões, da ira de uma mãe cujo filho fora assassinado, no primeiro pingo de sangue de uma guilhotina. Deuses da justiça e da prosperidade, deuses do calor e do ócio, deuses de um amor não correspondido e dos que ainda virão. Deuses que jamais serão contados pela história, porque Hongjoong faz o favor de garantir que explodam antes de se ascender.

Quando o mundo que era conhecido foi reiniciado, os humanos que sobraram não entenderam como foi que tudo se reverteu: os humanos criam deuses e deuses criam humanos, uma coexistência necessária. As novas divindades vinham dos Crédulos, seres humanos aleatórios com marcas de um círculo dentro de outro círculo em alguma parte do corpo. Ninguém sabia sobre eles muito bem, só sabiam que seu nível de crença era tão intenso que eles poderiam criar deuses até mesmo sem querer.

E criados através de uma fagulha de crença, os deuses são puros, intensos ou suaves, cada qual tem sua percepção do mundo e acerca de si mesmo. Uns, precisam ser venerados e assim são. Outros, precisam ser temidos e assim são. Os demais querem ser esquecidos e assim são. No final do dia, todas as preces ou sussurros reanimam seres sem alma cujos olhos saem fumaça do tamanho poder que emanam. Deuses que criam fogo e movem pedras, deuses que ditam que ninguém moverá a pedra e depois voltam atrás, deuses mascarados e outros cujas veias recebem o calor do meio dia. Deuses que já tentaram destruir uns aos outros para terem humanos que já acreditaram na existência de apenas um único deus.

Quantos deuses já deixaram de serem deuses por conta do Hongjoong? Talvez sete ou mais. Talvez ele tenha destruído mais alguns no meio do caminho depois que seu pai morreu na sua frente. Com um microfone e uma adaga arrancada de uma bainha, ele matou seu primeiro deus. Sendo deuses apenas um estado de energia etérea, seu primeiro deus, como qualquer energia, transformou-se ou reencarnou em outra coisa. Talvez mais bela, mais gentil, mais carente. E talvez Hongjoong guarde um pedaço disso numa gargantilha. Não era para ser poético. Na verdade, é bem simples: a briga do ruim com o ruim.

★★★

Hongjoong enxugou a testa molhada com as costas da mão esquerda antes de levantar a cabeça para o céu, o sol quente irritando a sua pele. A multidão que se formava no lado de fora do templo lhe deixava cansado só de olhar, porém sabia que precisava avançar, tinha trabalho a fazer. Ele engoliu em seco. Foram longos anos de carreira — era uma carreira? Matar não era carreira, destruir tampouco, porém salvar a humanidade… ora, talvez. Começou com vingança, mas agora tem uma arte por trás, uma metáfora barata: se ameaçam nossa existência, é um problema que eu deva consertar, e se houver inferno, eu sei que estarei lá no primeiro pensamento que tive na vida, nada irá mudar por agora.

E nada mudaria por agora, por isso ele ajeitou a mochila nas costas e empurrou toda a fileira de gente que estava impedindo-o de entrar. O que um rapaz na casa dos vinte haveria de fazer num templo senão rezar? O que um rapaz como ele faria num templo cujo o próprio deus estava a mostrar-se numa vitrine? Venerar. Hongjoong aprendeu a fingir que venerava os deuses, ele era bom nisso, bom em qualquer tipo de fingimento.

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