01

12 0 0
                                    

ALBA



"Senhores passageiros, informamos que estamos a 10 minutos da aterragem no aeroporto de Barcelona, pelo que devem neste momento regressar aos vossos lugares e apertar o cinto para que seja feita uma aterragem segura para todos. Obrigada. "

Alba... — Sinto alguém abanar lentamente o meu corpo.— Está na hora de colocares o cinto...

Era a voz da minha tia que soava ao fundo da minha mente. Comecei a despertar de um sono profundo, percebendo que aquele que eu pensava ser um pesadelo era mesmo a realidade. Voltar à minha terra Natal não estava de alguma forma nos meus planos. Nem por sombras. Para mim, Sicília era a minha terra. Foi lá que eu cresci com a minha mãe até a sua morte e à estúpida promessa da minha tia me assumir como filha no leito da morte da minha mãe.
Sabia o quão eram próximas elas eram, contudo não entendia o motivo para a minha tia me trazer a conhecer o dador de esperma. Sim, ao que vocês chamam de pai, eu chamo dador de esperma, porque no fim é o que é para mim. Pai, figura parental que cuida e ama, muito diferente do que ele fez.

—Promete-me que darás uma oportunidade ao teu pai... A tua mãe iria querer que se dessem bem, apesar das divergências que pudessem vir a ter.

—É difícil quando sabes que o teu pai abandonou a tua mãe com uma bebé indefesa para cuidar, bebé essa que é filha dele. E pior, ele sabia.

—Se nunca deres uma oportunidade nunca irás saber as razões e conheces apenas uma parte da história, Alba.

— E para quê conhecer a parte dele? Ele não teve vontade de me procurar e sinceramente... A mim parece-me que os estás a defender! Lembra-te que ele nos abandonou, tia Gio.

Dei por terminada aquela conversa. A verdade é que não queria tocar naquela ferida que nunca tinha verdadeiramente sarado, contudo mentiria até mesmo se fosse necessário. Quando dizia muitas vezes à minha mãe que não me importava, mentia-lhe para que a tranquilizasse. De certa forma, sabia que lhe trazia paz e isso era tudo o que eu queria. Desconfiava que esta aproximação forçada tinha sido ideia da minha tia para que me sentisse apoiada, pois sabia que o meu meio irmão era um corredor da Ferrari. E tal como ele conquistou um lugar, onde muitos pensavam ser só um mundo de homens queria derrubar tal ideia e ser a primeira mulher a conquistar um lugar numa equipa de Fórmula 1, tendo começado da Fórmula 2, onde agora era temporada de férias.

Depois de esperarmos uma eternidade pelas nossas malas, finalmente chegamos à zona de chegadas, onde era habitual as famílias normais irem buscar os seus parentes, sendo recebidos com amor, carinho, saudade. Sentimentos que tinham sido perdidos nos últimos tempos e talvez, arrefecido o meu coração. Ao longe, avistei um homem de fato, provavelmente um segurança do meu pai, segurar uma placa "Alba e Gio".

— O Senhor Sainz pediu-me que as viesse buscar ao aeroporto e vos levasse até casa, onde ficarão alojadas. O meu nome é Eziquiel e estarei disponível sempre que desejarem. Aguardam a vossa chegada na mansão.

— Obrigada Eziquiel, é muito gentil da sua parte. — Escutei a minha tia afirmar com um sorriso de orelha e orelha e logo lhe lancei um olhar matadouro ao qual ela apenas encolheu os ombros.

Não podia acreditar que nem à cinco minutos estávamos em terra e a minha tia já fazia olhinhos a um dos seguranças do meu pai. Ridículo.

Depois de uma viagem de cerca de duas horas, onde passámos por diversos lugares, tentava puxar pelas minhas memórias antigas, contudo nada parecia surgir. Talvez tivessem bloqueadas pela minha mente não querendo trazer o sofrimento, as lágrimas que escorriam pelas bochechas coradas da minha mãe enquanto me afegava os cabelos louros e sussurrava uma canção de embalar. São essas pequenas recordações que surgem, mas apenas momentos tensos e tristes. Queria esquecer as variadas vezes que vi a minha mãe chorar e guardar apenas a risada, o sorriso e o carinho, quase como se ainda a sentisse perto de mim.
Finalmente, depois de mais alguns minutos, o mordomo conduziu por entre um caminho de terra batida onde era apenas visível árvores de um lado e de outro, um mato denso que depois se abriu para uma enorme mansão isolada contudo com linhas antigas, de fundo apenas tocava uma música suave, semelhante àquelas melodias de elevador.
O carro contorna um pequeno jardim, semelhante a um pequeno chafariz contudo feito de flores. As minhas flores favoritas, túlipas. A minha mãe e eu tínhamos em comum o mesmo gosto floral. E pelos vistos o meu "pai" queria manter essa memória viva, ou na pior das hipóteses apenas me agradar. Presente no fundo da escadaria encontrei o homem cuja fotografia tinha encontrado num álbum perdido no quarto da minha mãe e ao lado uma fotocópia de um rapaz uns anos mais novo. Pelos vistos era ele o meu meio irmão. Carlos Sainz. Pai e filho com o mesmo nome, diria até que foi falta de criatividade.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Apr 22, 2024 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

AUDAZESOnde histórias criam vida. Descubra agora