Degustação

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            Tiago Lima analisou a casa com uma testa franzida, a cabeça meio inclinada para trás e uma imensa vontade de dar meia volta e ir embora, deixar que os amigos o chamassem de medroso até se esquecerem daquele momento.            

            Tiago olhou para trás e o grupo de seis garotos e três garotas fizeram sinais idênticos para ele prosseguir, ele voltou a encara a velha casa de madeira novamente.           

            O que ele tinha na cabeça ao aceitar a aposta de entrar no cemitério pela grade quebrada, atravessar a grama salpicada de túmulos e entrar na casa do velho coveiro que havia morrido a dois dias?           

             Claro que ele sabia a resposta; havia aceito por que queria mostrar-se forte e corajoso na frente de Matheus Mendonça, que naquele momento estava escorado na grade, um pouco mais afastado do grupo, fazendo um sinal negativo com a cabeça para ele não fazer aquilo.            Mesmo que tenham se conhecido a pouco tempo, pois os Mendonças haviam chegado a pequena cidade de interior de Serrados a três meses, Tiago já sabia que a família inteira era muito supersticiosa. Na verdade, não precisava ser supersticioso para saber que aquilo era uma má ideia, mas eles era um grupo de adolescentes presos em uma cidade entre serras altas, não havia muita coisa para fazer.            

             Tiago abaixou a cabeça para encarar a porta. Havia um batente de concreto ladeado por mato alto, e do lado esquerdo havia uma pilha de velhas lápides de mármore que provavelmente haviam sido trocadas por novas, do outro lado uma cadeira de plástico se mantinha vazia, tão velha que estava desbotando. Aparentemente o zelo que o homem morto tinha pelo cemitério não se estendia para a casa.             

              — Se não vai entrar então volta logo! — Thomas Lima, o irmão mais velho de Tiago, gritou, ele estava escorado na grade com Alicia Guimarães em seus braços, eles dois sorriam de forma afetada, como se tivesse achando toda aquela cena muito divertida.            

             Tiago estalou a língua com a impaciência do irmão e com seu medo, mas ele já estava ali, e não podia negar que estava curioso para saber mais sobre o velho Toupeira.           

             Ninguém na cidade parecia saber o seu nome, então colocaram o apelido de Toupeira porque ele vivia sujo de terra, não parecia ser fã de banhos, adorava falar palavrões contra aqueles que ousassem passar na calçada do cemitério e tocasse as grades e quando saía para resolver algo ameaçava as pessoas que ficavam no seu caminho. Quando o homem morreu,          Tiago ouviu da boca dos pais, a cidade respirou aliviada.            

             Tiago esticou a mão para a maçaneta e abriu a porta que, no dia em que encontraram o corpo, foi arrombada pela polícia local, quando a funerária procurou o coveiro para abrir uma cova e ele não abria a porta, nem atendia ao telefone, então viram seu corpo pela janela da cozinha.             

             A porta rangeu e jogou em seu rosto um forte mal-cheiro de comida podre e mofo. Tiago tossiu e parou um pouco na entrada para criar mais coragem, precisou pegar o celular no bolso da calça jeans e ligar a lanterna.            

             Ele se deparou com uma sala simples, tendo apenas uma mesa de madeira e seis cadeiras de espaldar alto, bem antigas, nas paredes haviam quadros de molduras prateadas com representações sombrias de guerras terrestres e marítimas, seguindo a esquerda o garoto entrou na cozinha onde o corpo havia sido encontrado, e o cheiro de comida podre vinha de um prato de porcelana na mesa pequena de dois lugares, ninguém havia dado-se ao trabalho de jogar fora. Tiago saiu dali imediatamente sentindo arrepios pelo corpo.            

O Príncipe de EstigeOnde histórias criam vida. Descubra agora