1. A SOMBRA DO MEDO

88 5 0
                                    






Inferno.

Se houvesse uma palavra mais apropriada para descrever a cruel experiência que os adultos chamam de ensino médio, sem dúvidas eu saberia.

Pelo menos, era o que eu pensava enquanto olhava para a grande massa de corpos que se moviam naquele caos de adolescentes corpulentos e trogloditas do outro lado do campo, empurrando-se mutuamente, com cada grama de seu peso, lutando por uma bola de couro velha e disforme.

Que diabos eu estou fazendo aqui?

Eu poderia listar os últimos cinco lugares no mundo onde não gostaria de estar agora, mas nenhum deles era tão ruim quanto estar no último tempo de educação física, parado no meio do campo de futebol americano. Essa era a parte da minha vida que eu mais odiava. Passar um dia no colégio era como ter que pagar uma sentença; sete horas confinado em um purgatório com os maiores babacas da cidade.

O campo de futebol americano era um território inóspito para mim — bem, todo lugar devia ser assim quando se é um perdedor como eu. Não me entenda mal, mas não me encaixava ali nem em meus piores pesadelos. Diferentemente dos outros caras, eu não tinha a velocidade, agilidade, capacidade tática e tampouco a força bruta necessária para me destacar no jogo.

Eu era o garoto magro com um metro e setenta e cinco de altura, cabelos castanhos claros e olhos cinzentos que era empurrado em armários todos os dias durante o intervalo. O garoto que era quieto demais para se destacar como Presidente do Grêmio Estudantil ou muito estranho para ser o Rei do Baile. Eu era o nerd, sem óculos, que era perseguido por ser inteligente demais ou burro o suficiente para revidar. O cara que caía em todas as peças — o alvo em tempo integral.

Nunca soube ao certo quando as coisas realmente começaram a ir de mal a pior para mim, mas o fato é que ninguém fez absolutamente nada para evitar o que aconteceu depois. Era como se o bullying sempre estivesse presente em minha vida. Como um companheiro insistente e fiel, acompanhado de um sentimento perturbador e vago na boca do estômago, crescendo lenta e imutavelmente dentro de mim, dia após dia.

Foram anos após anos de "vamos prender a mochila dele na cadeira" e "Henry é uma bichinha, por que não desenhamos pênis no caderno dele?" e "vamos prender o Henry-bichinha no banheiro das meninas depois de invocar a Loira do Banheiro" e, sendo um pouco mais radical; "vamos enfiar a cabeça dele no vaso sanitário de novo e de novo, e de novo."

Falar nunca adiantou, é claro. A especialidade do colégio Saint John era transformar a vida dos alunos em uma verdadeira piada. "Isso é apenas uma fase" balbuciou o diretor Dickens, quando o procurei pela primeira vez depois que Poug Harrison acertou uma almôndega gigante em minha nuca, no meio do refeitório. "Você não devia fazer acusações tão graves, Sr. Jones" argumentou ele em outra ocasião, quando o informei de que alguém havia enchido meu armário de estrume no primeiro ano. "Francamente, vou mandar o zelador limpar o seu armário". O diretor olhou para mim com um sorriso amarelo, pretensamente paternal, e fez um gesto com as mãos para que eu me retirasse da sala. Acho que não preciso mencionar o quanto isso me chocou naquela época. Eu tinha catorze anos.

E mesmo agora, quase três anos depois, eu ainda continuo sendo o alvo em tempo integral. As coisas nunca mudam no colégio St. John.

Eles nunca vão parar.

Sempre encontram um jeito de se reinventar quando o assunto é transformar a minha vida — ou a de qualquer outro perdedor — em verdadeiro inferno. Por isso, não conseguia compreender o que estava fazendo ali.

Como também não sabia exatamente por que Técnico Mackenzie me obrigara a entrar em campo, e o fato de os atletas terem me aceitado era outro mistério. Todo mundo no colégio sabia que eu não levava o menor jeito para a coisa. A única vez em que não me abaixei para escapar da bola, foi quando a agarrei na altura do estômago, depois que Archie Campbell a chutou com tanta força na minha direção, que fiquei sem ar durante alguns minutos.

MORDIDAS NUMA SEXTA-FEIRA À NOITEOnde histórias criam vida. Descubra agora