Abismo [Versão Atualizada]

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Nota da Autora: Recomendo ouvir a faixa Bury a Friend - Billie Eilish durante a leitura deste capítulo para melhor imersão na atmosfera tensa e emocional da história.
Link: https://open.spotify.com/track/16w8ZGVSjI4TlTLV8VimBY?si=TsZwIdJySQCguNcQIPK1Vw

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GHOST


O relógio ainda não marcava sete quando estacionei o jipe diante do posto médico improvisado. A madrugada havia sido longa - dormi pouco, o rosto dela invadindo meus pensamentos como um fantasma que não queria me deixar em paz. Era irracional, perigoso, fora do protocolo... e inevitável. Por isso eu estava ali. Não enviei ninguém. Fui pessoalmente.

A enfermeira-chefe me guiou até uma sala nos fundos. O ambiente era frio, esterilizado, com cheiro de desinfetante e metal. A porta estava entreaberta e, por uma fresta, vi Angelina sentada sobre uma maca, vestindo um moletom simples e calças militares. Os olhos fixos no chão. A médica que a atendera no dia anterior - a veterinária do setor genético - estava de luvas, examinando-a com precisão quase cirúrgica.

- Abra a boca, querida. - A médica pediu com voz firme, mas não ríspida. - Isso... Consegue projetar eles para fora? - ela pediu, então as presas começaram a crescer, a médica apontou uma pequena lanterna para dentro da boca dela analisando a situação - Dentes caninos normais. Sem rachaduras. Bom sinal.

Angelina obedeceu sem resistência, como se estivesse em piloto automático.

- Agora as mãos. - Ela estendeu. As garras se projetaram lentamente, como unhas felinas - Controle ainda está ativo. Reflexo rápido... excelente.

A médica pegou um bisturi e, sem avisar, fez um pequeno corte na parte interna do braço dela. Vi o sangue escorrer... e a pele se regenerar segundos depois, como se nunca tivesse sido ferida.

- Regeneração acelerada, sistema estável. O sangue funcionou - murmurou satisfeita, anotando em uma prancheta. - Vitalidade, oxigenação, fator de cura... tudo voltou ao normal. Isso graças à transfusão.

Ela tirou as luvas e se virou para mim. Só então notou minha presença completa.

- Tenente Ghost. - disse, com um sorriso enviesado - A sua agente está em condições de retornar à base. Mas recomendo que ela mantenha o consumo diário de sangue humano - uma bolsa por dia, ao menos. Se quiserem evitar outro surto.

Angelina começou a recolher suas coisas em silêncio, sem olhar pra mim. Era como se minha presença ali fosse incômoda, ou simplesmente indiferente. Mas notei o tremor sutil nas mãos quando ela encaixou o coldre no quadril.

A médica observava, com um olhar que misturava admiração e condescendência.

- Sempre fico impressionada com ela. - comentou. - Velocidade, força, adaptação, inteligência. É o soldado perfeito... pena o temperamento.

Ela se aproximou da bancada e retirou algo da gaveta - um controle pequeno, do tamanho de um pager antigo, e um saquinho ziplock com pequenos biscoitos de carne seca.

- Mas sabe... como veterinária e profissional em adestramento, aprendi que os cachorros que mais latem... só precisam de um pulso firme - disse, entregando os itens para mim. - E um pouco de incentivo.

GATILHO _ Ghost/COD Onde histórias criam vida. Descubra agora