SUDOESTE: MATAGAL

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MATAGAL

Esse conto pertence ao livro de minha autoria, Rosa dos Ventos, publicado no Wattpad em 2020

Jacuí,
Sudoeste Mineiro, 2003

Jonas não tinha como estar mais irritado. Se aquilo não fosse obra do Gal, não ia ser de mais ninguém. 

"Olha pro cê ver o que o desgraçado fez. Eu ainda vô matar aquele homi qualquer dia desses."

Seu Jonas tinha irritação na voz. E motivo para isso tinha até de sobra. As cercas quebradas deixaram três vacas escaparem. O peão Iander já tava atrás das três. Mas não conseguia deixar de olhar com raiva para o estrago. Não ia ser custo algum consertar, e em condições normais não precisaria se preocupar com as vacas, bastava buscar. Entretanto, as condições não estavam nada normais. 

"E se for outra coisa? E o garrote?" Diogo olhava para o patrão, e mesmo sabendo que se Jonas colocava em sua cabeça que alguma coisa era obra de Gal, então era obra de Gal, mesmo que não fosse. Mas contradizer o patrão naquele estado era pedir demissão, então deu sua sugestão como se não fosse nada demais, só para tentar plantar uma sementinha de bom senso na cabeça de Jonas. 

"O garrote tá no pasto. Se fosse o garrote, ele ia tá sumido também. Mas sumiu minhas vaca. Duas no ponto de parir. Aquele desgraçado me paga, e se num for no dinheiro vai ser no sangue! Diogo, manda o Reginaldo do Zé Preto pra ajudar o Iander."

O capataz foi correndo achar o Reginaldo. Seu Jonas foi olhar o estrago mais de perto. A cerca de madeira partidinha, bem no meio. No mínimo umas cinco porretadas pra arrebentar a cerca. Muito inteligente, assim podia parecer que foi um dos animais que se jogou contra ela e arrebentou, mas Jonas não estava convencido. Se uma cobra picasse aquelas vacas, ia ser um bom prejuízo. Andava tendo muita jararaca nas redondezas. Devia ter um ninho de cobras por perto. Sempre teve cobra por aí. Mas nunca como naqueles dias, toda semana chegava notícia de alguém matando cobra no quintal de casa. A situação estava tão fora de controle que o prefeito criou uma comissão de matadores de jararaca. 

Dona Rita, esposa do boiadeiro Léo Tião, até tinha sido picada por uma. Correram com ela pra São Sebastião do Paraíso, pois o soro antiofídico no hospitalzinho da cidade já tinha acabado. Ela já era de idade, e por pouco não morreu. 

Seu Jonas voltou pra casa. Sandra fazia uma goiabada no fogão a lenha. O doce dava cada pulo que faltava atingir alguém. 

"O doce tá quase pronto, Seu Jonas. Se o sinhô quiser, tem café prontim. O bolo tá no jeito já. Deixei em cima da mesa." 

Jonas não deu nenhuma atenção ao bolo, ou ao café. Sua cabeça estava a mil por hora. E Diogo agora havia retornado para piorar a dor de cabeça do patrão. 

"Seu Jonas, a coisa num tá boa não. O Iander achou as duas vaca que tão pra parir. Mais uma tá morre que num morre."

"Foi jararaca?"

"Foi sim, Sinhô. O Iander viu uma jararaca ali pertim. Já fez questão de matar, e quase que leva uma picada."

"E a outra? Não acharam ainda?"

"O Evaristo da Cota falou que o Henrique viu uma vaca atolada perto do córrego no terreno do João Batista. O Reginaldo foi lá pra vê se num é a vaca que falta."

"Ê lasqueira! Vai lá na cidade e chama o Pedro pra ver se tem alguma coisa pra fazer pela vaca. Veterinário é caro, mas vale a pena. E no caminho, passa na casa do Sebastião e fala com ele que tô precisando de um favor. Que é pra ele vir aqui depois, fazendo favor."

"É pra já." Diogo saiu pra fazer o que Jonas tinha pedido. O Fazendeiro não parava de pensar no azar que deu. Mas aquilo tinha culpado. E era o Gal. Ia ser preciso cortar o mal pela raiz. Dona Vitória chegou na mesa pra tomar seu café. O marido com a cara mais carrancuda que o normal indicava que a coisa tava séria hoje. 

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