Prólogo

19 3 2
                                    

Em janeiro de dois mil e quatro, um homem e sua esposa grávida se instalavam em uma pequena vila do interior de Moscou, na Rússia. O homem, alto e forte, carregava simplórias malas enquanto caminhava ao lado de sua mulher, se dirigindo até um pequeno chalé.

— Acha que este é o lugar ideal para criarmos nossa filha? — A jovem moça diz, parando ofegante por conta da gestação já um pouco avançada.

— Querida, aqui é um lugar calmo e bem desenvolvido. Nossa filha irá crescer bem e saudável, tenho certeza disso. — Ele deitou com delicadeza as malas pesadas no chão e se voltou com um mínimo sorriso para sua esposa, lhe dando um leve beijo em seus cabelos tão escuros quanto as penas de um corvo.

— Tudo bem, eu confio em você. — Ela lhe retribuiu o sorriso, deixando de lado a aflição que sentia, imaginando as melhores cenas de sua pequena filha crescendo com todo o amor e carinho naquele simples casebre de madeira.

Ainda parados, o homem suspirava orgulhoso da nova conquista, enquanto alternava seu olhar entre a mulher e a varanda. Catherine observava minunciosamente o exterior, notando as pequenas carreiras de terra próximas a escadaria.

— Olhe, tem um jardim. Podemos plantar suas rosas favoritas aqui.

— Não acho que algo chegue a crescer pelo terreno, com a poluição da usina, acredito que o solo da região já está contaminado. Depois de Chernobyl, não confio em mais nada que nosso governo diz.

— Não é assim que funciona, Catherine. Já lhe disse várias vezes, as usinas são seguras, e o que aconteceu em Chernobyl foi uma série de erros fatais. — Ele suspirou cansado do assunto.

Sua esposa era uma pessoa cética quanto as usinas construídas ao redor de todo o país. E depois do terrível acidente que colocou toda a cidade de Pripyat em caos, ela se tornou ainda mais convicta de que não havia total segurança em trabalhar com elementos radioativos.

— E o que impede dessa série de erros acontecerem novamente? — Ela o olhou ansiosa, com uma fina camada de lágrimas se formando nas lindas orbes cor de mel ­— Me preocupo com você e não quero te perder.

— Você não vai me perder! — Ele assegurou, puxando-a delicadamente pelos ombros para um abraço rápido, mas apertado — Eu prometo que nunca deixarei vocês duas.

∙∙∙∞{♥}∞∙∙∙

Em torno de uma semana após a mudança, o jovem rapaz começara a trabalhar na Petrov's Nuclear Power Plant, uma usina nuclear de origem britânica, como um dos engenheiros assistentes.

A adaptação foi rápida, e em uma sexta à noite, apesar das advertências do marido, Catherine preparava o jantar quando sentiu um líquido escorrendo entre suas pernas. Assustada, a mulher caminhou com dificuldade até uma banheira apertada no fundo da casinha, e começou o processo de parto sozinha. Logo após chegar do trabalho, o marido pôde ouvir o doce e delicado choro de sua filha recém-nascida, e correu emocionado até o local.

Rosalie, uma bebê saudável e de feição alegre, rapidamente ganhou o encanto da vizinhança com o passar dos dias.

— Senhora Pavlov, que menina mais adorável! — Esbravejou uma idosa que se aproximava do portão baixo.

— Obrigada, eu tenho muita sorte em ter essa garotinha. — Ela falava calmamente, enquanto acariciava levemente o rosto gorducho da menina.

— É uma benção em meio a tudo isso. — A idosa manejava as mãos no ar com euforia, como crítica a existência da usina.

— A senhora não gosta daqui? — Catherine olhou com curiosidade.

— Minha cara, a vila é um lugar excepcional! O problema mesmo é o desastre que pode vir a se tornar caso aconteça algo nas redondezas, se é que me entende. — A mais velha comentou, com cautela — É melhor eu me apressar, biscoitos não se preparam sozinhos, não é mesmo?

De Todos os Sonhos que já SonheiOnde histórias criam vida. Descubra agora