Encaro meus coturnos surrados e o terno roxo despojado que eu usava. Meu cabelo estava lambido para trás com gel e eu parecia um garoto mais do que nunca. E então, ela chegou. Parecia uma garota mais do que nunca, num vestido rosa armado com detalhes dourados, sapatilhas brancas e o cabelo enrolado com uma tiara estilo princesa em cima. Eu não acreditava que ela tinha aceitado ir naquele baile estúpido comigo.
Nossa escola decidiu copiar as escolas estadunidenses e fez um baile de primavera por motivo nenhum, e disseram para convidarmos alguém. E eu, na zoeira, chamei a garota mais irritante e que mais implicava comigo pra esse baile. Eu, em nenhum multiverso existente, pensaria que ela toparia, mas ela topou de forma séria. E agora eu estava ali: com a irritante Larissa, a patricinha nojenta que vivia de me incomodar.
Justo eu, a mais desfem da escola, estava levando ela pro baile. Ela desembarcou do carro do pai porque não topou ir de moto comigo e veio com aquele cloc cloc chato dos saltos da sapatilha. Ela parou na minha frente, me encarando de cima abaixo.
– não pensei que viria de terno.
Eu ri com certo sarcasmo.
– achou que eu viria de vestido, sério?
– não. Achei que viria com um macacão jeans, no máximo. Talvez uma bermuda inteira, pra variar. Superou minhas expectativas.
Ergui uma sobrancelha e dei de ombros, oferecendo o cotovelo para ela segurar. Meus 1,78 de altura me favoreciam em vários aspectos, e um deles era o de guiar aquela garota de 1,66 para dentro da festa. Quando entramos, havia uma luz colorida e uma playlist de velho tocando, com balões jogados pela quadra e algumas mesas com doces e alguma coisa pra beber, que provavelmente era o suco diluído demais de sempre querendo imitar ponche. Os amigos enjoativos dela a cercaram, falando como estava linda e essas baboseiras. Meus manos nem foram naquela palhaçada, óbvio, nem eu estaria se não fosse a patricinha que aceitou o convite idiota ao invés de só retrucar a piada com aquela educação falsa e exagerada. Fui até a mesa, comprovando minha teoria do suco e pegando alguns brigadeiros. Depois de todos os nojentinhos trocarem os "nossa, como você tá bonita" e "aí você também", Lari veio na minha direção.
– sabe que vai ter que me tirar pra dançar, né?
Franzi a testa.
– não sei dançar.
– eu te ensino.
– não quero.
Ela bufou.
– qual é, só uma dança.
– se você parar de atucanar eu vou.
Peguei a mão dela e ela nos levou pra pista. Lari pôs uma das minhas mãos em sua cintura e segurou a outra, mostrando o que eu tinha que fazer. Tentei não pisar nos pés dela, uma tarefa impossível porque, como eu já disse, não sei dançar. Quando finalmente a música acabou, soltei sua mão e coloquei a minha no bolso, mas a outra permaneceu em sua cintura. Dei uma apertada na região, assustando de leve ela.
– por que você aceitou esse convite?
– cortesia.
– vamos lá, seja sincera. Existem formas de recusar educadamente.
Ela ficou um pouco em silêncio. Nos guiei pra fora da pista pra nenhum casal trombar na gente. Me escorei de costas na parede, ainda segurando ela pela cintura.
– você foi a única que convidou.
Ergui uma sobrancelha.
– você vive rodeada de garotos.
– eu não queria vir com um garoto.
Ela não usa sapatilhas, ela é a sapatilha.
– tendi. E você não ia convidar ninguém? Se ficar esperando os outros a coisa não rola, princesinha.
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Contos Gays
Short StorySão algumas pequenas histórias originais sobre romances LGBT que as vezes eu gosto de imaginar. Divirta-se!