O padre Fernando sempre achou que a igreja era um lugar de paz e que aquela imensa cruz de madeira, com o Jesus Cristo representado em todo o seu sofrer, destoava de forma absurda de toda a calmaria e tranqüilidade que o lugar devia trazer. Os vitrais coloridos refletiam a luminosidade lá fora, banhando os bancos de madeira em luz ora azul, ora rosa, ora vermelha, ora amarela. As paredes e o teto da igreja eram decorados com afrescos da época de Leonardo da Vinci e Michelangelo, porém a igreja era muito simples para se comparar com algo do nível da Basílica de São Pedro. Mesmo assim era uma representante da época renascentista, uma época em que as pessoas procuravam na religiosidade e na razão, uma forma de se encontrarem. Os anos que a Igreja Católica brigava com a ciência, de todas as formas possíveis. Mas hoje era um dia diferente. Aquela igreja já fora esquecida por todos, exceto pelos moradores ali perto que ainda rezavam sua missa dentro de suas paredes e confessavam seus piores pecados aos padres. Naquele dia, o céu estava estrelado, com tantas estrelas pontilhando o céu de forma delicada, quase como se temessem causar algum dano ao manto negro que se estendia sobre a igreja.O padre Fernando se escondeu dentro do confessionário, começando assim mais uma sessão de confissões. Um terço nas mãos e uma bíblia que não podia ler no escuro, algumas poucas pessoas aguardavam com ares de culpa. Quatro pessoas, o padre contou. Uma moça muito jovem, de bochechas muito rosadas e longos cabelos dourados que estavam soltos. Uma lágrima marcava a sua rosada bochecha, e o padre tentou imaginar os pecados atrás daquele rosto tão jovem e inocente. Um homem de aparência muito rude, seus olhos negros espetando toda pessoa que ousasse olhar para ele. Usava roupas negras, e parecia muito a vontade em um ambiente tão íntimo. Ajoelhada diante do altar, a mulher de sempre. Ela já era conhecida na igreja pois não sabia viver sem aquele ambiente. Morena, de olhos escuros e grandes, os lábios grossos não faziam mais do que murmurar preces sem sentido. As suas roupas eram conservadoras, de tecido grosseiro e de cores sem graça como um rosa cujo o tempo esqueceu de renovar e um cinza que vinha lentamente, tingindo a vida da mulher com a sua falta de sentimentos. Ela se confessava em todos os dias que pudesse fazer isso, e o padre Fernando estava cansado de dar a mesma penitência quase todos os dias para os mesmos pecados. Mas havia uma pessoa que nunca havia visto, nem mesmo de relance ao fazer uma missa ou quando passeava no mercado.
No último banco, ele tinha cabelos dourados, um cabelo quase branco de tão claro. Mas a luminosidade amarelada que se derramava sobre os bancos fazia o cabelo ficar ainda mais dourado. Ele tinha olhos cinzentos e frios, como se nada pudesse penetrar em seu mundo. Os lábios finos estavam mudos, sem deixar nada estragar a frieza contida naquela fase de feições aristocráticas. O padre Fernando, então, começou.
Primeiro foi o homem rude. De poucas palavras, confessou que se embebedou e traiu a esposa de novo. Sua voz saía fria, e no escuro, parecia um punhal que cortava a paz. Ele recebeu a sua penitência e foi embora.
Aí veio a mulher que confidenciou seus sentimentos de ódio pelo marido, pelos filhos e pelos próprios pais. Confessou seu íntimo, como fazia quase todos os dias, procurando na fé uma tentativa de dizer a si mesma de que a sua vida não era de todo inútil.
Logo depois de a mulher sair, a moça veio, suplicante e chorosa, sua voz tristemente embargada. Contou umas histórias horríveis, que o padre Fernando se sentiu na obrigação de dizer que ela de nada tinha culpa. Como os homens eram horríveis, pensou o padre enquanto a moça saía da igreja, como os homens podiam machucar tanto uma garotinha, uma criança? A moça saiu mais calma, tentando achar na fé uma tentativa de dizer que nada era sua culpa realmente.
Então o padre se preparou para a última confissão. Era tarde da noite, e ele queria ir dormir. Mas ficou ereto, aguardando a voz que acompanhava aqueles gélidos olhos feitos de tardes nubladas.
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Segunda Chance
Fanfiction"-.... Hoje ele me beijou e disse que se separaria da ruiva, disse que contaria sobre mim. Ele também não se importava mais... Tinha esposa, três filhos, uma carreira fabulosa. Mas ainda assim, preferia a mim..." #Drarry #Draco #Malfoy #Harry #Potter