sinos tocando

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Mon andou comigo pelas fábricas malucas do reino do Papai Noel. A cada de Papi Noel. A praia de Papai Noel. Sei lá exatamente qual o ambiente que eu estava. Só sabia que ela ia me explicando cada funcionalidade de cada lugar com cada ser vivente em cada lugar. Aqueles seres não olhavam para nós. Era como se o mundo fosse apenas meu e dela. Como se eu estivesse vivendo um sonho lésbico perfeito. Os sonhos da vida de uma lésbica muito viadona. Os sonhos de uma lésbica muito colorida e boiola. Nem dirigir todos os caminhões de BH ou procurar por todos os mais de quatrocentos ônibus que a cidade comprou me faria ser uma sapatão tão feliz como estar naquele ambiente louco e totalmente irreal com Mon. Ela era linda e fofa. Cada palavra dita por aquela boca me fazia flutuar muito mais do que ouvir as músicas do álbum Anti da Rihanna cantado pela própria Rihanna só pra mim. E olha que ouvir a voz da Rihanna no ouvido é algo que deixa qualquer mulher maluca. Até as héteros sabem que a Rihanna é o tipo de mulher que toda mulher casaria. Ou daria uns beijos. Pena que somos reles mortais e a Rihanna seja uma deusa intocável. Ela só deixa tocar alguém que seja muito sortudo. Pena que os homens que ela deixou tocar não a valorizaram. Até a Shakira tratou ela com mais consciência naquele clipe delicioso do que aqueles machos burros. Só existiria uma pessoa que amaria Rihanna como ela merece. E essa pessoa é a Katy Perry. Nós sabemos que as duas seria o grande casal. Assim como eu sabia, olhando Mon explicando como aquele mundo funcionava, como aquela mulher que estava ali era perfeita pra mim. Eu cantaria debaixo da chuva cheia de trovoadas de um janeiro chuvoso em Minas Gerais debaixo da janela daquela mulher. Isso se eu fosse cantora. Não seria burra de cantar desafinado e passar vergonha na coitada. Eu ia levar um balde de água suja na cara. Mas eu poderia levar um doce de compota pra ela. Já ouviu falar que mineira ama um doce de leite de compota? Leva um pão de queijo, um doce de leite de compota, um queijo minas com goiabada... Conquista na hora. Sim, eu levaria uma cesta de quitutes pra ela comer. Também se conquista mulher pelo estômago. O estômago está muito perto do coração. A comida enche o buchinho e vai cheia de amor para o coração. Eu só sabia que olhava pra Mon e pensava o que eu queria viver com ela. Passear na Pampulha, viajar pelo país. A gente poderia ir pra Poços de Caldas ver o vulcão. Ou poderia ir pra Ouro Preto ver onde os escravos viveram e ver como era a escravidão em Minas. Passear pela cidade e ouvir o guia turístico dizendo como há fantasmas que ainda andam pela cidade. Descer aquelas ruas que têm centenas de anos. Nós duas amarmos a arquitetura e depois irmos para Salvador e ver o Pelourinho. Ou ir para os Lençóis Maranhenses. Ou ir para Botucatu porque São Paulo também é bom de se ir. Poderíamos ir até Santa Catarina e pensar... Que lindo fica aqui com a neve. E compararmos o frio de Curitiba com o do Polo Norte. A gente com certeza ia admitir que não tem frio maior que o de Curitiba. Poderíamos ir para Goiás e ouvir uma moda sertaneja. Ou ir dar uma voltinha num barco no Amazonas. Admito que não prestava atenção em nada do que ela dizia, apenas imaginava como eu queria viver uma vida de aventuras ao lado daquela mulher. Se ela me chamasse, eu pegava a roupa do corpo e ia só com a roupa do corpo. Roupa pra que? Eu já tenho tudo o que importa comigo. Eu posso ir lavando a roupa e deixando secar, enquanto ando pela casa peladona. Visão do paraíso andar peladona por aí com a sua mulher também peladona. As duas andando pela casa peladonas. Visão da deusa!
- Sam, perguntei o que vai querer de comida. - Mon me olhava como se achasse graça da minha cara.
- Uai, se tiver pão de queijo, eu quero. - Começo a rir porque era óbvio que ali só deveria ter comida natalina.
- Tudo bem, eu vou avisar pra prepararem. - Ela sorria com aquele sorriso de menina e meu coração dava uns trimilique daqueles bem trimilicoso, muito trimiliquento, trimilicado, sabe? Tique, tique, tique, tique, tique... Como os barulhos de uma escola de samba. Ou só os barulhos do trem andando. E de trem nós mineiros entendemos.
O trem é o seguinte... Eu sei que sinto esse trem aqui dentro que uai, sô... Trem doido da porra! Trem que faz tique tique tique e eu vou que vou só pensando que essa mulher é melhor que pão de queijo com café moído e feito na hora. Melhor que comida feita no fogão de lenha... Não é trem à toa, não! É trem bonito e viçoso que anda por aí. Assim como o trem de São Lourenço. Você passeia no trem e vai longe, longe. Se você é de outro estado não vai entender o que eu estava sentindo naquele momento, mas alguém de Minas entenderá. Ah, como entenderá!
Você já olhou para os beiços de uma mulher e pensou... Eu beijaria tanto esses beiços lindos que me deixaria com os beiços doendo de tanto beijar esses beiços gostosos? Era isso o que eu pensava quando olhava aquela boquinha de meu Deus me acuda que eu tô caindo de um barranco, rolando, dizendo, tô caindo!
- Sam? - Ela me olhava com cara de quem queria rir. Ela sabia, eu já sabia também, que eu estava boba de amor pela mulher mais linda da face dessa Terra. A magia estava em volta dela. Voava pó de Pirlimpimpim pra todo lado. E eu nem sou cocainuda. Eu nem mexo com esses bagulho de pó. Mas ela tava rodeada de pó brilhante. Como podia? Eu não sabia. Mas era como se a fada Sininho estivesse jogando pozinho em cima dela pra ela voar por aí pelo mundo, indo pra Terra do Nunca junto com Peter Pan. - Sam! Você está bem?
- Tô... Desculpe, é que é tudo tão novo pra mim. Eu estou aqui voando... - Voando pra Terra do Nunca com você, minha deusa! Que bicha bonita! Eu tô babando? Espero que não. Imagina só ficar igual um buldogue babento por mulher? A gente baba, mas é em outro lugar... O lugar babadinho, sabe? Ali é bem vindo babar. Junta as babas. Tem uma conversa entre os lábios... Jesus! Eu tô pensando em pornô! Que vergonha! Cabeça maluca! A moça é pura e eu aqui pensando em safadice!
- Eu imagino como é. Também fiquei meio perdida aqui quando cheguei. Você vai se acostumar. Você quer ver o trenó e as renas? - Ela ainda sorria sem imaginar que eu já me imaginava fazendo uma conversa de lábios bem próximos com ela. Só não diria qual lábio. Os dois!
- Claro... - Nada como voar numa rena pra não pensar em putaria com a moça pura de meu Deus. Eu vou para o inferno, mas também nunca disse que eu era pura. Disse só que não tenho sorte com mulheres, mas não ter sorte não quer dizer que eu não sinta desejos carnais por mocinhas de pele gostosa e cheirinho de perfume que entra no nariz e faz os pelinhos do corpo todo ficarem levantadinhos. O arrepio que levanta até os pêlos do cu. Eu precisava parar de pensar esses tipos de coisas e sabia disso, mas aquela menina era como se fosse irresistível. O tipo de mulher que você vê e daria tudo o que pudesse pra ter ela. Não é só pelo romance, mas também é pelo romance. É pelo pacote. O amor bonitinho é gostoso. E o amor safado também é. Um equilíbrio é perfeito. E eu pensava isso sobre ela, mas sabia que estava ficando louca. A menina nem devia ter beijado na vida. Olha o que a Yuki tinha me dito. Eu deveria tomar cuidado com o coraçãozinho de Mon. Aí eu defloraria ela. E casaria com ela.
Mon foi falando pelo caminho e eu não escutava uma única coisa que ela dizia. Eu do sabia ficar olhando para ela de lado, sabe? Aquele olhar contido. Aquela timidez por não conseguir conter os próprios pensamentos. Aquele medo dela poder ler meus pensamentos e me odiar,, fugir de mim, me ver como uma tarada ou uma idiota. Eu não sabia o que temer mais. Só sabia que eu precisava dela na minha vida. E eu toparia tudo pra ter. Ela era linda e perfeita. Era além disso. Ela era fofa. Eu amaria ouvir o que ela tem a dizer todos os dias. Só não estava ouvindo porque estava admirando ela. Eu queria amar ela. Não só de amor do coração, mas amor de corpo também. Entrelaçar os dedos e olhar nos olhos dela, enquanto a gente fazia tudo. Se conectar de corpo e alma. Um amor tão natural e lindo. Coisa que a gente quer fazer quanto tem interesse numa mulher. Eu não ouvia ela por falta de interesse. Eu apenas estava boba demais naquele momento. Algo que acho que você vai entender.
Chegamos até onde o trenó está. Ele estava num pedestal feito para ele. Estava encaixado em um negócio feito de ferro. O trenó era vermelho porque tinha que ser. Por mim, ele teria a bandeira colorida. E ele soltaria purpurina quando voasse. Eu imaginava um mundo onde Papai Noel poderia ser colorido e gay. Uma Mamãe Noel colorida é lésbica. Eu não tinha pensado ainda como eu poderia ser Papai Noel, mas passei a pensar quando olhei aquele trenó tão comum. Aquela imagem hétero que todo mundo tem. Eu pensei se não poderia ser como eu era, uma viadona. Um Natal colorido para eu me sentir Mamãe Noel de fato, sem ser algo masculino.
- Como eu vou ser Papai Noel? - Perguntei, ainda olhando o trenó tão comum e simples.
- Mas eu te disse. - Ela fez aquela cara de achar que eu sou doida.
- Disse? - Fiquei sem graça. - Nossa, eu... É... Ah... Hun...
- Está tudo bem. Eu falo outra vez. Você se vestirá como você é, mas sua imagem será como quem ver quiser ver você. A imagem é a magia quem faz. Você poderá ser a mãe, pai ou apenas um Papai Noel. Muitas pessoas pensam que são os pais que dão presentes, mas aqui os presentes são todos dados. Sempre damos um jeito de dar . - Ela sorria parecendo sentir orgulho disso.
- Eu nunca ganhei. - Eu fiquei meio assim.
- Eu já disse que não se dá pra levar o Natal para quem não quer ele. Sua mãe conseguiu um bloqueio para a magia. Um bloqueio tão poderoso que você jamais conseguia ver nada além do que ela impunha. E isso é bem comum. Mais comum do que se pensa. Os pais muitas vezes rompem a magia das crianças. Eles não possuem sentimentos de pureza e infectam toda a pureza dos filhos. - Ela suspirou e eu entendi o que ela estava me falando.
- Era como se uma barreira impedisse meu pai de me ver, não é? - Eu suspirei e senti uma profunda tristeza.
- Sim. E você de ver quando ele passava. Ele passava por você, mas vocês não se viam, não se conectavam. - Ela estava séria e parecia sentir a minha tristeza. Isso me fez sentir mais sentimentos por ela. A gente sempre procura por alguém que seja capaz de entender nossa dor, nossa fraqueza, nosso sentimento de tristeza.
- Entendi. Obrigada. - Eu balancei a cabeça e resolvi não ficar de boiolagem por ela porque percebi que tinha que fazer algo além de ficar apenas olhando para ela. No lugar dela, eu não olharia para uma mulher que deixasse algo tão importante de lado só pra ficar boiolando por alguém que acabou de conhecer. - Eu posso ter um trenó colorido? Um puxado por unicórnios?
- Pode. - Ela começou a rir e eu comecei a rir também.
- Eu estou brincando. - Falei, ainda rindo.
- Eu sei, mas meu eu infantil amaria ter um Papai Noel colorido com unicórnio. - Ela ria ainda mais.
- Acho que meu eu infantil ia querer um Papai Noel igual aos Ursinhos Carinhosos, soltando arco-íris pela barriga gorda. - Eu também ria.
- Uma criança viada é uma criança viada, não importa a origem dela. - Ela sorria pra mim de uma forma tão fofa.
- E você é uma, né? - Perguntei pra ter certeza porque vai que ela era uma hetera disfarçada. Eu odiava mulheres héteras que amavam pegar mulheres viadas pra usar e depois falavam que eram héteras quando achavam algum macho.
- Pensei que seu gaydar fosse melhor. - Ela revirou os olhos como se falasse que eu sou uma péssima colorida.
- Eu senti uma vibes, mas vai saber. Temos tudo hoje em dia. - Eu dei de ombros.
- Verdade, mas eu gosto de mulheres. Acho que crescer aqui me ajudou a me aceitar mais. Aqui não tem preconceitos. - Ela falava naquele tom que apaixona qualquer uma. Aquele tom de orgulho de ser quem é.
- Imagino que sim. Eu passei por muitas questões. - Suspirei.
- É, imagino. O mundo poder ser cruel com a gente, mas a gente sempre encontra o caminho pra pessoas que vão nos amar como somos. Sempre vai ter alguém que goste do que nós somos, que nos aceite. Sozinhos, nós nunca estaremos. Eles pensam que nos deixam assim. Não, eles não deixam. Eles nunca vão ter esse poder. - Eu olhava e estrelinhas brilhavam em volta, enquanto ela falava. É, eu estava apaixonada. E bem naquele ritmo lésbico de paixão. Aquela que te deixa de quatro pneus arriados. Eu era um caminhão Scania de cor vermelha com dois containers atrás. Um caminhão bonito e grande que carrega café. Aquele que vai para o porto de Santos, viajando longas distâncias. Eu era um caminhão viajante. E eu tava viajando da beleza daquela mulher.

Eu estava pensando em fazer esse o último capítulo, mas achei que faltaria desenvolvimento de sentimentos entre as duas. Elas se conhecerem mais um pouco, terem uma interação melhor. Então, o próximo será o último. Ok? Seis partes está bom.

Snow On The BeachOnde histórias criam vida. Descubra agora