Quando eu for algo além de nós

Prólogo

22 de agosto de 1930
Querido
Quando se entende um início, uma página se vira para que eu possa ver o epílogo, eu te citei todos os dias, disse seu nome como uma oração.
Mas você disse que me amava mais que mil estrelas de um céu que você mesmo colocou um lençol para cobrir sua visão. Disse que mesmo que o sol nos queimasse, não me largaria de seus braços ou me afogaria em solidão.
Mas aonde está você?

De sua tão perdida, Cláudia

16 de setembro de 1930

Querido,

Peço mais uma vez, me responda, já não aguento a agonia de seu silêncio, me deixe ver sua expressão, mesmo que ela seja de ódio por mim. Mesmo que já não tenha amor em seus olhos.

Só me deixe em paz com pelo menos um final.

De já não tão querida sua Cláudia

22 de dezembro de 1930

Estranho,

Eu escrevi sem colocar mais seu endereço, talvez por você não morar mais lá, por não ter coragem de entregar mais um pedaço do meu coração. Eu posso finalmente deixar você ir e esta ser a minha última carta? Ou isso é só mais uma das cartas que enviei desde do início do nosso amor até o que depois já não era?

Claudia

14 de novembro de 1932

Antigo amor,

Achei um poema que você me escreveu, talvez eu devesse jogar o papel fora como um usual lixo, mas peguei em mãos e senti todo meu coração entrar em chamas, que foram como se você tivesse retornado para mim, mesmo que não tivesse.
Eu já considerei que estivesse morto, longe de mim, mas você está com certeza vivo e casado com alguém que sorri e tem bochechas rosadas.

P.s. Coloquei seu poema junto, seria melhor que devolver.

Minha obra prima
Seus lábios são como mel
Que eu vivo a tomar com os meus
Meu coração era um forte
E você a conquistadora
Me beije até o fim dos tempos
Jamais vou desperdiçar seus beijos

Cláudia

16 de janeiro de 1936

Antigo querido,

Eu deveria escrever seu nome, mas são mais como minha própria maldição, de palavras que eu achei que não teria que colocar aqui, mas eu ainda estou aqui. Minha mãe disse que eu deveria esquecer você, milhares de vezes, mas eu ainda penso em você, quando eu olho o sol, quando a chuva caí e quando as folhas ficam verdes. Você ama a cor verde.
Eu deveria mesmo me casar com alguém que não é você? Isso é realmente o que deveria acontecer?

Cláudia

14 de maio de 1936

Meu primeiro amor,
Isaac diz que eu sou como uma flor, que ele colhe e quer em seu jardim, não entendi muito bem o que ele quis dizer, ou eu não quero entender. O amor é uma mera convenção social, sei que digo isso pois não vou me casar com você.
Soube que está esperando o primeiro filho de sua esposa, dizem que ela é bela como um cisne e elegante, talvez eu esteja morrendo de curiosidade para saber quem ela é.

P.s. Isaac pediu minha mão esta manhã.

Cláudia

5 de novembro de 1936

Sem nome,

Hoje eu sou uma mulher casada, faz poucas horas que disse um sim com tanta tristeza em meu coração que eu quase desejei que a igreja se partisse ao meio, meu vestido era uma herança de família, mas era tão desconfortável e cheio de adereços, se eu tivesse que usar ele com você, eu não reclamaria nenhum segundo.
Isaac ainda tenta capturar minha atenção, parece que nunca seremos nada mais que uma obrigação. Me sinto cruel por não dar a ele meu coração como ele me deu o dele.

Cláudia

5 de novembro 1938

Esquecido,

Isaac me deu flores por completarmos três anos de casados, ele disse que ainda brilho mais em seu jardim. Talvez eu esteja vacilando um pouco, meu coração erra as batidas quando ele se aproxima e segura minha cintura, eu fico sem palavras, eu fico paralisada.
Quando nós beijamos, já não parece estranho e abraçar ele parece convidativo como jamais havia sido. Isaac está me roubando de você, mas nem mesmo sou mais sua para que isso seja de fato um roubo.
Eu posso me apaixonar por ele?

Cláudia

8 de janeiro de 1940

Sem nome,

Minha filha nasceu, ela é tão linda, parece uma criação do paraíso que Deus me enviou. As mãos dela são tão pequenas e ela sempre sorri fofa quando eu digo seu nome, Dália.
Pensei que um nome forte lhe daria uma segurança que eu não tenho certeza se poderei dar.
Eu achei que você seria meu único amor, mas quando a vi, confesso que nada fez tanto meu coração se despedaçar e se reconstruir quanto a chegada dela ao nosso mundo. Espero que seu filho cresça saudável e forte e que sua esposa seja a melhor mulher do mundo.

Cláudia

30 de junho de 1970

Sem nome,

Não sou mais jovem, não sou mais como o sol da manhã ou a lua que emoldura sua noite. Eu já não tenho saúde também, mal consigo caminhar para fora do meu quarto, Dália chora com medo que seja minha hora, mas eu estou em paz.
Eu sou uma tola ainda, eu guardei as malditas cartas para que Isaac nunca descobrisse, e realmente ele nunca soube, morreu sem saber que havia seu nome em meu coração e acho que eu também vou morrer sem que você saiba que você tem seu nome guardado em meu peito.
Sou uma mulher que já não vê a juventude quando encara o espelho mas ainda sonho com você e quando éramos jovens, quando era perfeito estar e dizer palavras lindas e significativas.Eu vou te amar por toda a eternidade assim como vou amar Dália.

Eu já estou partindo, sem você.
Adeus meu amor

Cláudia