— Aziraphale, essas são as novas crianças que Deus prometeu a Jó? — Gabriel perguntou. Os demais anjos aguardando a resposta.
Aziraphale olhou de Gabriel para os outros e então para o único demônio que estava ali junto deles, mas que ninguém havia notado. Crowley esboçou um sorriso sutil e arqueou as sobrancelhas, fazendo Aziraphale soltar o ar e voltar os olhos azuis para Gabriel.
— Aziraphale, quem são esses? — O arcanjo insistiu.
— São... os novos filhos... — prendeu o ar, tentando formular as palavras sem deixar na cara a mentira — você tem minha palavra como anjo.
Sua língua passou rápido pelos lábios ressecados, mentir pesava, mentir exigia muito esforço de sua parte, mas mentir era necessário. Necessário, porque ele não poderia tolerar o que deveria ser feito. Aquele não poderia ser o desejo de Deus.
— Então está tudo bem! Hahaha, porque você não disse logo?! — Gabriel agarrou seus ombros, dando dois passos para trás em seguida para bater palmas. — O trabalho está feito!
Michael, por outro lado, olhava atravessado tudo aquilo. Michael sabia que havia algo de errado e tolo como Gabriel sempre fora, jamais iria perceber. Michael não entendia como alguém igual Gabriel poderia ser o Arcanjo Supremo.
Aziraphale, por outro lado, sorria contidamente, tentando segurar o pavor que ainda o preenchia por ter mentido diante de tantos anjos assim. Ele estava completamente arrependido de ter trabalhado com Crowley, talvez, porque o fardo que sentia em suas costas devido a mentira parecia insuportável de se aguentar sozinho.
Crowley estava do outro lado, assistindo aos anjos comprarem aquela mentira. Arqueou suas sobrancelhas novamente como sempre fazia, satisfeito porque o seu plano deu certo e ainda por cima conseguiu presenciar um anjo mentindo para outros anjos. Seu trabalho era maravilhoso.
[...]
Aziraphale estava sentado sobre a pedra olhando para o horizonte, em direção ao grande mar que se abria à sua frente. A mentira de momentos atrás ecoava em sua cabeça e ele tinha uma certeza, alguém viria buscá-lo, ele iria para o inferno. Ele cairia. Ouviu passos ao seu lado e se virou, se deparando com Crowley que se aproximava.
— Ah, sim. Achei que talvez eles fossem mandar você. — Ergueu-se contendo a vontade de chorar. — Bom... eu estou pronto para ir — fitava a imensidão do mar a sua frente, não queria manter contato com Crowley, não naquele momento.
— Ir pra onde? — O demônio perguntou sem esboçar reação.
— Para o inferno.
Crowley resmungou algo e sentou-se na pedra.
— Eu não vou te levar para o inferno, anjo — lançou em um suspiro. Era ele agora quem admirava o mar aberto.
— Por que não? — Aziraphale olhou para o perfil dele, surpreso com a mudança de planos.
— Porque eu acho que você não ia gostar.
— Mas você precisa — a voz dele quase saiu em um sussurro, como se cair fosse a única alternativa, a certa, na mente do anjo, mesmo Crowley lhe mostrando que não iria levá-lo. Crowley virou o rosto para olhá-lo. — Eu sou como você agora. Um demônio!
Pobre anjo. Aquela aparência derrotada, os ombros caídos, a falta de esperança. O olhar cabisbaixo e arrependido. Como Crowley poderia ter tanta sorte de presenciar algo como aquilo? Ele era um demônio, não era? Assistir a queda das coisas era seu hobbie favorito. Ele conteve uma gargalhada quando Aziraphale mudou a expressão, indicando que realmente iria começar a chorar.
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Coisas simples
FanfictionMentir pesava, mentir exigia muito esforço de sua parte, mas mentir era necessário. Necessário, porque ele não poderia tolerar o que deveria ser feito. Aquele não poderia ser o desejo de Deus.