Crise

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Já era noite novamente e eu já partia para meus posto, só novamente.

O frio essa noite é capaz de congelar qualquer um que não esteja devidamente agasalhado. Para minha sorte tenho meu precioso cachecol vermelho além de vir trajada com a capa que usamos nas expedições da tropa.

Me curvo para o soldado e tomo seu posto.

Me sento no chão, a noite acaba de começar e será longa.

Agora estou sozinha.

O vento forte me trás angústia.

As lembranças estão voltando, malditas lembranças!

Minha respiração fica ofegante.

Estou morrendo?

Meu coração acelera como se fosse sair do peito, tento respirar fundo mas é como se o vento ao invés de traz tivesse levado o ar consigo. A sensação de medo que senti na noite do sequestro toma conta de mim.

Me levanto em um pulo tirando a capa para respirar melhor. Não adianta.

Caiu de joelho no chão. Arregalo os olhos mas só consigo ver tudo embasado. Levanto a cabeça pro céu, buscando a ajuda. Ela não vem.

Morrer aqui, é provável.

De repente mãos frias pegam meu pulso e vejo um rosto me chamar. Não escuto mas pela gesticulação da boca sei que chama meu nome.

Levi, sempre Levi.

O que faz aqui? Insônia não é. Ainda é cedo pra dormir.

De repente tudo passa e tudo fica calmo. Como uma manhã insolarada depois de uma noite chuvosa.

Minha respiração volta ao normal aos poucos.

Ele ainda segura meus braços.

- Mikasa?

Olho no fundo dos seus olhos. Ele parece preocupado.

Não consigo o encarar assim.

Ponho as costas da mão sobre minha boca e viro o rosto.

Estou chorando.

Tenho certeza que ele me olha, mas não consigo o encarar. Não quero ver a sua pena, se é que ele será capaz de sentir isso.

Ponho meu rosto na palma de minhas mãos e desabo.

A melhor soldado está desabada na frente de seu superior. Você é uma piada ridícula garota!

Mas para minha surpresa sinto seus braços me envolverem e sua voz ressoar em meu ouvido.

- Calma, eu estou aqui...

O vento forte passou. Parece que ele só soprava apressado pois pressentia minha cena patética.

As estrelas estão brilhando lindamente como em todas as noites. Posso ver pequenas luzes ao pé da muralha. Os pirilampos estão imitando as estrelas do céu.

- Se sente melhor?

Levi está sentado ao meu lado me observando enquanto tento ignorar sua presença olhando a paisagem.

- Estou. - O encaro. - Obrigado por me ajudar.

- Não agradeça. Você não estava respirando, qualquer um teria feito o mesmo.

O seu abraço, a forma como ele me deixou segura, não é todo mundo que teria feito isso.

- De qualquer forma, obrigado. - Passo a mão no rosto e afasto o cabelo pra trás. - O que fazia aqui? É cedo pra dizer que sua insônia já está te atacando. - Abraço meus joelhos.

- Falei com Erwin e disse que não achava correto você ficar sozinha aqui.

- Com todo respeito, mas isso não é trabalho para alguém da sua patente, capitão. Deveria mandar um soldado no seu lugar.

- Eu sei, mas não consigo dormir á noite mesmo. E resolvi vim pra cá. E ainda bem que vim.

Eu analiso seu rosto. Ele é bonito, bonito demais para ser um assassino. Ah, e aqueles olhos? Eu me afogaria ali.

Sei que não deveria olhar para ele assim mas é uma missão impossível.

Sua fala me faz despertar.

- Ah, isso. Desculpe, não sei o que aconteceu comigo. Mas obrigado novamente.

- Tudo bem. Pegue isso.

Ele me entrega algumas folhas enroladas em um lenço branco.

- Sei que pareço louco por gostar de chá mas me faz relaxar.

- Obrigado.

- O que você acha que causou isso?

Ele olha para o chão.

- Olha, não sei. Mas a única coisa que consegui pensar foi na noite que Eren me salvou. Sabe, aqueles homens com aquelas mãos nojentas e ah... - Fecho os olhos. - Eu não gosto de lembrar disso.

Levi me olha e depois encara o chão.

- E você?- Me apoio com as mãos atrás das costas.

- Eu o que? - Me encara.

- O que causa sua insônia, capitão?

- O mesmo motivo do seu colapso, o passado.

- Gosto de pensar que o passado é uma roupa que não nos serve mais. - Abraço com mais força os joelhos. -  Mas de qualquer forma ele sempre arruma uma forma de nos atormentar, por meio das lembranças.

- Pode ser...

- Talvez... talvez a solidão desencadeie esses sentimentos ruins em nós dois. - Olho para seu rosto que encara o céu. -  Você não acha?

- Talvez...

Encaro o céu também.

- Minha mãe dizia que os desenhos formados por estrelas chamam-se constelações. Segundo ela, cada desenho tinha um significado.

- Se lembra dela?

- Lembro, era a mulher mais doce que a vida me permitiu conhecer.

- Sinto muito por ela.

- Não precisa. Sabe, se meus pais estivessem vivos eu não entraria na tropa e não teria salvado tantas vidas.

O silêncio se instaura.

- Todos nascemos com propósitos na vida. E o nosso é proteger pessoas.

Olho o horizonte.

- O sol... Já está nascendo.

Observamos o nascer do dia.

- É perfeito. Mas seria mais perfeito se não estivéssemos presos como ratos.

Me levanto por impulso e Levi me acompanha. Vemos os titãs já ao pé da muralha.

- Esses vermes acordam cedo.

- Capitão, será que podemos?

Ponho a mão no dmt insinuando usa-lo.

- Só pro dia começar bem, Mikasa.

Ele se joga da muralha e começa os trabalhos. Faço o mesmo e sinto a vida em minhas veias.

Os primeiros raios de Sol nos banha com seu encanto.

Talvez Levi esteja certo, nós temos um propósito e sinto que cumprir o meu ao seu lado é mais feliz.






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