Dois vigias foram requisitados para investigar uma denúncia feita por alguns dos moradores do prédio, em que alegaram ter visto uma criança perdida em um dos elevadores do condomínio.
- Sabem a idade do menino? - Perguntou Carlos, o primeiro guarda, ao seu parceiro, Nando, durante o caminho até a recepção.
- Pelo que disseram, parece que ele é pequeno o bastante pra se perder nos andares... Pelo menos ele foi esperto de escolher o elevador social, aquele de serviço tá caindo aos pedaços - Brincou Nando.
- Mancada, cara, ele deve tá assustado - Respondeu Carlos em tom de desaprovação pela piada do parceiro, mas por dentro até que achou engraçada, quase revelando um sorriso.
Chegando na recepção, os guardas chamam o elevador e aguardam. Nesse momento Dona Vera, uma senhora moradora, aparece com um carrinho de compras, cumprimentando os guardas enquanto anda em direção ao elevador de serviços, e então pergunta:
- Algum problema, senhores?
- Tá tudo bem, Dona Vera, a gente só veio procurar uma criança que pode ter se perdido nos elevadores, será que a senhora não teria visto ela por aí? - Perguntou Carlos.
- Uma criança perdida? Acho que não cheguei a ouvir nada sobre... - Responde a senhora como quem tenta recordar algo - Faz tempo que ela se perdeu?
- Faz um tempinho sim, a gente até esperou um pouco pra ver se alguém iria levar ela de volta pros pais, mas passaram aqui no rádio agora a pouco que ela continua perdida... Pode ser até que os pais tenham saído e deixado ela sozinha. Mas tudo bem, no pior dos casos, do condomínio ela não sai - Finalizou Nando - De qualquer forma, obrigado Dona Vera, tenha uma boa noite.
O elevador demorou a chegar, tempo o bastante para restarem apenas os dois guardas na recepção. Quando as portas se abrem, ambos se deparam com o menino dentro do elevador. Apesar de parecer estar perdida, a criança tinha uma expressão de plenitude e diversão, como se estivesse brincando com os botões do elevador.
- E aí, cara, tá tudo bem com você? - Perguntou Carlos ao menino - Você tá perdido?
A criança, no que parece ser uma expressão de timidez, não responde.
- Cadê seus pais, amigão? Saíram? - Continuou Nando.
Ainda sem resposta. Carlos então se ajoelha e pergunta:
- Onde você mora?
A criança, então, finalmente responde:
- Láaaa no último - Disse enquanto se esticava para apontar para cima.
- Entendi, então nós vamos te deixar em casa, tudo bem? - Disse Carlos em um tom calmo enquanto apertava o botão do andar 17.
A criança balançou a cabeça positivamente de maneira tímida. Enquanto o elevador subia, Carlos continua a tentar interagir com a criança:
- Olha só, o seu cabelo é igual ao meu - Disse enquanto tirava o boné, referindo-se ao penteado.
- Naah, o dele é muito mais legal - Brinca Nando - e além disso ele tem mais cabelo.
- Rapaz, aí você acaba comigo - Respondeu Carlos continuando a brincadeira, o que resultou em uma breve risada do menino.
Chegando então ao 17º andar, a criança se recusa a sair do elevador, já que parecia estar se divertindo com os botões.
- Cara, faz assim, você fica aqui com ele e tenta fazer ele vir com a gente, enquanto isso eu bato na porta e pergunto pelos pais dele - Sugeriu Carlos à Nando, que concordou com a ideia.
Ao caminhar pelo hall em direção a uma das portas, a Dona Vera aparece pelo elevador de serviço.
- Dona Vera! Então a senhora mora no 17º, que mundo pequeno!
- Olha só, quem diria? - Responde a senhora com uma risada descontraída - Encontraram a criança?
- Sim, e ela mora nesse andar, acredita? Meu parceiro tá tentando convencer o menino a sair do elevador, parece que ele tava se divertindo com os botões, então enquanto isso eu vim procurar pelos pais dele - Disse Carlos.
- Olha, seu Carlos, acho que o menino pode ter se enganado...
- Por que diz isso?
- É que apenas eu moro nesse andar com a minha filha. Meu apartamento é o 1702, e o 1701 está para alugar desde o mês passado.
- Ah é? Que estranho, ele me disse que morava "lá no último" - Comentou o guarda enquanto tentava imitar o gesto de apontar para cima que o menino fez quando deu a informação.
- Sim, pois é, imagino que tenha havido um engano. Bom, espero que encontrem o apartamento do menino, boa sorte e boa noite para os senhores! - Disse Dona Vera enquanto entrava em seu apartamento.
- Sim, deve ter sido um mal entendido mesmo... Obrigado, Dona Vera, boa noite pra senhora também!
Carlos ficou incomodado, não compreendia ao certo o que lhe gerava tal perturbação, mas sentia que havia algo de errado acontecendo. Quando retorna ao elevador social, Carlos avista apenas o menino, o que contribuiu para aumentar o seu desconforto no momento.
- E-Ei... Você viu pra onde foi o meu parceiro? - Com hesitação, pergunta Carlos ao menino.
- Sumiu... - Responde a criança.
Nesse momento Carlos sentiu um frio em sua espinha que o paralisou.
- Onde você mora? - Insistiu em perguntar mais uma vez ao menino, de maneira mais firme.
- Aqui.
- N-Não, você não mora aqui, pra onde eu te levo?! - Perguntou Carlos trêmulo.
- 4... 6... 7... - Disse o menino como se estivesse tentando se lembrar.
Carlos então o interrompe em um ataque de fúria que surgiu como um impulso defensivo, sem saber de onde viera toda a raiva.
- AH É?! E EM QUAL DESSES ANDARES EU VOU SUMIR, HEIN SEU BOSTINHA?! - Gritou o guarda enquanto segurava o garoto pela gola da camisa.
E então o menino sussurra
- 17.
Carlos, então, em um ataque de pânico larga o menino e tenta fugir pelas escadas e, enquanto desce, percebe que o número do andar nunca mudava. Não importava o quanto descia as escadas, ele sempre estava no andar 17.
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Andar 17
Mystery / ThrillerUm breve conto de suspense envolvendo um mistério no elevador de um prédio residencial.