Isaac - Viver

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Imediatamente fico sem reação, mas retribuo o que Eduardo diz com um gesto da cabeça, sem saber bem como falar. Meu maior problema atualmente anda sendo a timidez.

Aos poucos mais pessoas começam a entrar na casa de Luane. Deve ter mais ou menos vinte convidados, muito mais do que eu imaginava e, o pior, apareceriam mais alguns em breve. A música toca alto no cômodo, vindo da caixa de som que Luane ganhou num sorteio da escola. Ao menos foi o que ela me disse.

- Pessoal, estão quase todos aqui, então quero dizer uma coisa rápida – a voz de Luane ressoa pelo microfone na sala principal onde estamos. O espaço é grande o suficiente para dançar sem pisar no pé dos outros – primeiro: as bebidas ficam no cômodo ao lado, fiquem à vontade para andar pelos corredores, só peço que NÃO ENTREM nos quartos, tudo bem? Tranquei todos, eu acho.

Ouço risadas por todo o espaço depois desse detalhe.

- E, por último – ela pega seu copo verde-azulado no balcão ao seu lado, parece estar cheio – Divirtam-se!!

Fico distraído quando a música volta a tocar mais alto. Hot N cold da Katy Perry, uma das minhas favoritas. As pessoas começam a se amontoar no meio da sala quando as luzes azuis, vermelhas e verdes enchem o espaço, já nem consigo mais identificar os rostos direito porque estou contra a luz. Saio rapidamente e procuro um canto para assistir tudo ao redor.

Não demora muito pra eu sentir um toque no ombro.

- Isaac? – a garota usa uma saia pouco acima do joelho com meias que ultrapassam a canela, parecendo uma boneca saída de algum filme para jovens adultos.

Acabo por reconhecê-la pelos cabelos encaracolados: é Vivian.

- Vivian, nossa! – dou um abraço nela – faz tempo que não a vejo.

- Eu que preciso dizer isso, quase não o vejo nas festas e passeios nossos.

- Sabe como é, ne – falo, um pouco tímido, a voz tão baixa que provavelmente ela não conseguiu ouvir.

Ela olha para o grupo de pessoas no meio da sala e depois para duas pessoas que passam próximas de nós, devem estar indo pegar as bebidas.

- Não quer dançar? Ou conhecer alguém?

- Eu não levo jeito pra nenhuma dessas coisas.

- Ah, não seja por isso – e então antes que eu possa chamar ela de novo, vejo-a ir até o meio do grupo de pessoas e falar com um dos garotos. Edu me olha de longe com um sorriso estampado e anda lentamente até mim junto com nossa amiga em comum.

- Isaac, esse é Edu. Edu, esse é o Isaac – e então apertamos nossas mãos como se nunca tivéssemos nos visto.

Vivian cochicha algo no ouvido de Edu, e como um bom leitor labial sei o que ela diz: _ele é tímido, mas é superinteligente. Tentem fazer amizade, vai ser bom pra vocês._

- Vou deixar vocês, ta bom? Se divirtam.

Quando ela nos deixa, tento me forçar para manter o olhar fixo em Eduardo. Ele parece o típico adolescente cheio de vida, daqueles que puxam os outros para dançar e mantém um sorriso no rosto vinte e quatro horas por dia, tem cara de ser mais velho e com toda certeza é viciado em academia, a julgar pelos peitos que empurram sua camisa branca.

- Não é muito chegado a festas? – Edu pergunta, um pouco perto dos meus ouvidos.

- Não muito – respondo – podemos ir para algum lugar mais calmo? – e aponto para o cômodo ao lado onde ficam as bebidas.

Ele assente e toma a frente. Um de seus amigos está lá fazendo uma mistura de vodka com energético e oferece pra ele.

- Agora não, Kauã. Onde Rodrigo está?

- Dançando, acredita? – ele diz, rindo. Parece feliz demais por estar ali, por um instante queria estar como todos eles, mas não consigo.

- Ele já bebeu?

- Ainda não, mas acho que não vai precisar – Kauã responde, dando um gole na sua bebida.

Edu dá um sorriso. Então saímos dali rapidamente e entramos num corredor, onde o som parece ficar mais baixo. Uma escada caracol leva até o segundo andar, há um casal sentado no primeiro degrau.

- Opa, licença! – Edu diz, e me ajuda a passar no lado dos dois até subirmos mais um pouco.

Ali em cima ficam os quartos da casa, todos com as portas fechadas. O banheiro deve estar entre uma dessas entradas.

Nos sentamos no alto da escada, Edu no último degrau e eu no penúltimo.

- Não estou tomando demais seu tempo? – pergunto, tímido.

- De jeito nenhum, eu gosto de dar atenção para as pessoas que quero conhecer – ele diz, me olhando com um sorriso de canto – me conta uma coisa: qual sua idade? O que gosta de fazer e qual lugar você prefere estar do que em uma festa assim?

- Tenho dezesseis anos, gosto de ler e, bom, sou um pouco caseiro, sabe? Saio muito raramente.

- Nada de viagens que envolvam arte ou coisas do tipo? Eu acho que você iria gostar.

- Não sei direito, realmente não saio muito.

Ele se ajeita um pouco no degrau, respira fundo e se inclina na minha direção. Por um breve instante parece que vai me beijar, e aquilo me assusta um pouco, mas consigo disfarçar bem minha reação.

- Já fui como você, e por um bom tempo fui caseiro. Fiz algumas amizades bem legais que me mostraram que não há nada para ter vergonha, que a vida é uma só e a gente precisa curtir. Não estou dizendo que você precisa ser como a maioria desses adolescentes que saem para beijar na boca adoidado para aumentar o próprio ego. Diversão envolve muitas outras coisas.

Aquilo me faz pensar um pouco. Então ele percebe minha quietude, olha para baixo da escada e volta a falar comigo.

- As vezes um pequeno passo muda tudo – ele levanta e estende a mão pra mim – bora dançar? Eu juro pra você que vai ser legal.

- Edu...eu, não sei. Não sei se consigo dançar bem.

- Você não precisa dançar bem – ele sorri – só precisa viver.

Penso um pouco e me levanto. Respiro fundo, com olhos fechados, e então pego em sua mão.

- Ta bom – falo, finalmente.

- Ótimo – Edu diz, apertando meus dedos – se segure.

E então corremos escada abaixo até a sala principal para viver.

Amizade sem fimOnde histórias criam vida. Descubra agora