Capítulo Único - Valsa Carmesim

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Ele tinha olhos da cor do mais puro âmbar e cabelos tão dourados quanto o próprio sol. Seus lábios carnudos faziam as grandes cortinhas vermelhas de Versalhes parecerem sem cor. Eu nunca imaginei que meu coração morto pudesse "pulsar" de amor, ainda mais por um mortal.

O tempo em Versalhes parecia desacelerar quando eu me perdia em seus olhos. Cada palavra, cada riso abafado, ressoava em meu ser como uma melodia encantadora. No entanto, a sombra do destino lançava seu véu sobre nós, como uma lembrança constante da efemeridade de nossa paixão.

Julien era, assim, um ser único de sangue quente; e eu, por minha vez, uma criatura sanguinária da noite. Ele era como uma luz ofuscante e eu como um mosquito sedento por sangue.

Meus passos silenciosos ecoavam nos vastos corredores. A música suave flutuava pelos salões dourados, guiando-me em direção à imponente sala de festas, onde a elite da corte se reunia. Vestida com um esplêndido vestido carmesim, contrastando com a palidez extrema de minha pele, eu caminhava entre os vivos como um espectro apaixonado.

Ao adentrar o salão, meu olhar encontrou o dele, brilhando em meio às máscaras e plumas. O nobre parecia uma pintura viva, imerso em um mundo de luxúria e intrigas. Eu me movi graciosamente entre os dançarinos, os ecos da música clássica envolvendo nossos corpos em uma dança proibida.

Julien era perfeito demais, tão perfeito que causava inveja em vampiros e mortais. Sua presença iluminava a escuridão que permeava minha existência imortal. No coração da corte, onde a fofoca era tecida como renda fina, rumores sobre nós se espalhavam como fumaça.

Alheio à minha natureza noturna, Julien girava com graciosidade no salão, seus olhos fixos nos meus como se nada mais existisse. Enquanto eu me movia, a intrigante dança da corte prosseguia.

Rumores sussurrados nas sombras ecoavam em meus ouvidos vampíricos, revelando a curiosidade e a inveja que nossa união despertava entre os mortais e os não tão vivos.

Cada passo que eu dava em direção a Julien era uma dança entre o desejo e a proibição. As máscaras naquela sala escondiam segredos tão profundos quanto os meus próprios, mas nenhum tão intenso quanto o amor que florescia.

Ao finalmente alcançá-lo, nossos corpos se entrelaçaram em uma valsa proibida. Seus olhos refletiam a luz da lua, enquanto os meus capturavam a essência da escuridão. A corte curiosa observava-nos julgando cada um de nossos passos.

O prazer daquela noite não seria eterno. O véu da realidade espreitava, lembrando-me de que, ao amanhecer, Julien continuaria sua existência enquanto eu seria forçada a recuar para as sombras.

A dor da separação antecipada pairava como uma nuvem escura sobre nosso romance clandestino. Quando a música alcançou seu clímax, nossos olhares se encontraram em um último momento de paixão antes do inevitável acontecer.

A alvorada se aproximava, e a corte ainda observava, incapaz de compreender o que transcendia as fronteiras da vida e da morte. Nosso amor, uma sinfonia proibida, estava fadado a existir apenas nas sombras da noite.

Num último suspiro compartilhado, Julien e eu nos afastamos, cada passo que nos distanciava marcava o meu inevitável retorno à solidão das trevas.

Enquanto os primeiros raios de sol começavam a tingir o horizonte, eu desapareci nas sombras do palácio de Versalhes, deixando para trás a memória de uma noite de paixão, proibição e um amor que desafiava até mesmo a minha própria natureza. 


"564 palavras".

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