Medo

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Era dia de formação do paredão. Beatriz tinha ficado um bom tempo de plantão no Big Fone - todo o seu grupo tinha certeza que iria tocar - mas agora tinha dado uma pausa para descansar na piscina e de quebra ainda fazer uma social conversando Giovanna e Raquele, quem sabe tirar o seu nome da mira de votos. Mas essa parte estava sendo mais difícil do que ela esperava porque as meninas falavam de um assunto ao qual ela não tinha nenhum conteúdo para acrescentar: relacionamentos.

Tentou até prestar atenção e contribuir com algo, mas o assunto não tinha como prender a sua atenção. Distraída, seus olhos encontraram a figura de Alane, encostada ao lado do Big Fone, cantando uma música qualquer com sua voz suave. Seus olhos se detiveram ali, e um sorriso surgiu inevitavelmente em seu rosto. Jamais imaginaria que aquela garota convencida que conheceu nas seletivas e se desentendeu de primeira seria sua melhor amiga dentro do BBB. Nunca imaginou que a admiraria tanto: sua postura, seu talento, a maneira como cuidava dela o tempo todo, seu senso de humor, sua beleza... Como aquela mulher conseguia ser tão bonita???

Em algum momento a paraense a flagrou observando e sorriu. Um sorriso singelo e cheio de ternura e Beatriz sentiu alguma coisa lhe remexer por dentro. Sabe-se lá porquê, sentiu seu rosto corar e não pôde resistir a desviar o olhar. Sabia que estava muito dependente de Alane e aquilo poderia atrapalhar o seu jogo, mas simplesmente não conseguia evitar.

As meninas perceberam que ela estava alheia a conversa e puxaram assunto, a assustando um pouco.

- Bia vai sair daqui e leiloar a periquita - Disse Leidy, sem o menor constrangimento.

- Deus me livre! É de diamante! Sai rapaz!

- Sério, Bia! Tem que tomar cuidado em relação a isso.

- Cuidado com o quê, Leidy? - A atriz não conseguia entender o porquê nem o para quê daquele papo. Era aberta a falar da sua (falta de) vida sexual, mas não a esse ponto. Jamais trocaria sua primeira vez por dinheiro.

- Todo mundo sabe que você é virgem, existem os caras safados.

Bia se sentia imune a isso. Os hétero tops não faziam o seu tipo. Quando ela se imaginava namorando, se imaginava com um cara calmo, gentil, carinhoso, humilde, assim como o Matteus. Matteus lhe deixava muito confusa porque sempre imaginou que quando conhecesse um homem como ele, se apaixonaria imediatamente. Agora ela tinha como amigo um homem que é tudo que ela sempre sonhou pra ser o seu primeiro mas... Nada. Não sentia as borboletas no estômago, não sentia o coração acelerar, não sentia o tão falado fogo do tesão que consome por dentro. Estava decepcionada. Será que não sentia nada porque respeitava muito sua amiga Anny? Será que um dia iria se apaixonar?

- Você me ouviu, Bia?

- Não! Sim! Claro! Até parece, né? O Brasil vendo, me conhecendo... Vai ficar assustado, isso sim.

- O cara vai chegar: 'Tá escondendo o jogo, né gatinha?' - Imitou Leidy, sem conseguir conter um meio sorriso.

- Acho que não, gente. O Brasil me conhecendo vai é se assustar. Eu acho que o que eu faço é assustar as pessoas...

As três mulheres disseram algumas palavras, tentando convencer a ex-camelô que aquilo era bobagem, mas as palavras não fizeram efeito. Ela sabia muito bem quem era e que efeito tinha nas pessoas. Todo mundo a achava estranha, uma criança maluca. Aquele pensamento a deixou um tanto pra baixo, e poucos minutos depois acabou decidindo sair da piscina. Iria tomar um banho e descansar, preparar a mente e o coração para o ao vivo.

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Alane tinha passado quase três horas seguidas no Big Fone, já não aguentava mais. Decidiu que tudo bem dar uma pausa e aproveitar um pouco da piscina. Se dirigiu ao quarto fada apenas para pegar seu biquíni, mas esqueceu completamente o que tinha ido fazer ao se deparar com aquela cena: Bia, sempre tão alegre e sorridente, estava jogada na cama, com um olhar perdido, como se carregasse todas as dores do mundo. Parecia impossível não ir até ela e tentar ajudá-la, seja lá com o que fosse necessário.

- Ei!

A amiga pareceu não ter escutado, seus olhos nem sequer se moveram. A bailarina se moveu lentamente, se aproximou da cama e se sentou diante da jovem, até que seus olhares se encontrassem.

- O que houve?

- Não teve nada, Alane.

- Hum... - murmurou a garota, sem acreditar em uma palavra.

- É sério. Tô só descansando.

- Tu não confias em mim?

Aquela pergunta mexeu com Beatriz. Claro que confiava. Bem mais do que deveria, inclusive. Bem mais do que gostaria.

- Vai, me fala! Desabafa comigo!

A garota do Brás se deu por vencida e sentou na cama, encostando na parede e batendo levemente a mão na cama, ao seu lado, num convite mudo para que Alane se sentasse, o que ela fez sem demora.

- Eu... É só que... Tava lá fora conversando com as meninas e fiquei pensando. Ninguém nunca vai me querer, Alane. Eu sou estranha demais. E aqueles que tiverem coragem de querer alguém como eu... Eu não... Eu acho que tem alguma coisa muito errada comigo! - Terminou a mulher, com a voz já embargada.

As mãos da paraense foram mais rápidas que o seu cérebro, e antes que ela pudesse compreender o que estava acontecendo, já tinha uma mão segurando a mão direita da amiga, enquanto a outra enxugava uma lágrima que começava a cair. Não sabia o que dizer, qual era a coisa certa a dizer. Queria xingar todas as pessoas que machucaram um ser tão puro quanto a sua Bia, a ponto dela se sentir tão indigna de amor. Queria dizer que quem não a quisesse, eram eles que perdiam. Pensou em dizer todas as qualidades que vê nela, mas a sua voz também estava embargada. Era muito estranho perceber o quanto estava ligada àquela menina-mulher que poucos meses antes achava simplesmente insuportável.

Na falta de palavras, o corpo mais uma vez respondia, e Alane puxou Beatriz para si, aninhando a cabeça dela em seu peito, a acalentando como costumava fazer.

- Não se preocupe com isso - falou baixinho - o amor vai chegar pra ti quando tu menos esperas. E vai fazer valer a pena a espera.

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