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Eu abro meus olhos, após me acostumar á luz com algumas piscadas, minha primeira visão é um teto do qual eu ainda não estou habituada a ver. Ah sim, um misto de emoções. Esse seria o primeiro de muitos dias neste sanatório, minhas esperanças ainda que escassas acreditavam que eu sairia logo. Após despertar a mente com vários pensamentos logo de cara, eu olho em volta ainda deitada de forma estática na cama. O quarto que deveria ser naturalmente branco tinha paredes de um tom amarelado e eu me pergunto quantos anos tinhas aquela velha construção. Sem vontade alguma de me levantar eu me senti lentamente pegando no sono novamente, meu corpo cansado não se mechia e meus ouvidos se tornaram alheios a todos aqueles sons irritantes, enquanto minha visão se embaçava eu apenas podia ouvir o barulho irreal do ranger da porta ao se abrir, eu fechei meus olhos já esperando o pior, malditas alucinações que me assombravam, eu não poderia nunca me dar ao luxo de pegar no sono. Eu ouvi passos e senti uma aproximidade estranha. Para minha surpresa, ouvi uma voz gentil.

- ei, acorda - eu abri meus olhos e ao invés de uma criatura estranha, me deparei com alguém que se parecia um enfermeiro. - já não é hora de dormir, você precisa fazer várias consultas por hoje.

O Garoto tocava minha testa suavemente checando minha temperatura, ele era jovem, não deveria tem mais que 20 anos, ainda sim era tão pálido quanto qualquer um dos doentes que ele já tratou. Seus longos cabelos pretos pareciam não ver shampoo a um bom tempo e suas olheiras de cansaço eram notáveis, provavelmente eram um fruto de seu trabalho árduo cuidando dos doentes mentais. Ele me ajudou a levantar e me colocou numa cadeira de rodas.

- tem certeza que preciso disso? - indaguei um tanto desconfortável, eu poderia andar por conta própria.

O enfermeiro me olhou de cima a baixo - sim, seus remédios vão te deixar um pouco sonolenta, e julgando seu estado atual, você já está bem derrubada. - ele sorri sarcasticamente e eu vejo um deslumbre das covinhas em seu rosto pálido. - além disso, é uma garantia de que você não vai sair correndo por aí.

Sem muita paciência para retrucar, eu apenas deito a minha cabeça e tento relaxar enquanto o enfermeiro me levava pelos corredores.

- A propósito, eu ainda não sei o seu nome - eu tentava olhar pro seu rosto pálido novamente mas a luz incandescente do corredor me cegava completamente.

- É Eric.

- Me pergunto se verei você com frequência.

- Provavelmente, você ficaria triste se por acaso esse fosse nosso último encontro?

- Eu mal te conheço e já sei que você é um mala.

Eric sorri - você mal me conheçe, e entretanto, eu já sei que você é uma maluca.

Eu faço uma careta, mas é difícil negar o fato de ser louca quando se está num sanatório. Finalmente chego a meu destino, uma sala branca e nada aconchegante para mim, todo esse branco estava me dando uma espécie de náusea. Eu olho em volta e percebo que é uma especie de consultório médico. Eu me sento e em poucos minutos um senhor por volta de uns 40 anos surge e senta em sua cadeira.

- Bom dia Lucrécia, como foi sua primeira noite no sanatório? - o senhor pergunta com um sorriso gentil no rosto.

- honestamente, não me lembro ao certo, mas tudo parece tão estranho.

- Não se preocupe você irá se acostumar com tempo.

- Em quanto tempo, especificamente?

- Não sei ao certo Lucrécia, tudo vai depender do quão bem você se sair e apresentar melhoras significantes.

- mas aí que está doutor, eu não sou nenhuma louca, estou bem ciente da realidade.

- Não foi isso que seus pais disseram quando te trouxeram para cá, mas segundo seus relatos eu acredito que seja esquizofrenia.

Eu o encaro um tanto abismada e preocupada, eu tinha certeza absoluta de que eu não era nenhuma esquizofrenica.

- Não se preocupe querida, a ciência está cada vez mais avançada e com a dádiva da lobotomia poderemos te curar em algumas poucas sessões creio eu.

- esse procedimento realmente funciona? Não é arriscado?

- claro que não, é a chave para a cura de transtornos como os seus. - o médico explicava sobre os procedimentos empolgado, mas suas palavras não me causavam a mesma animação, na verdade suas palavras me fugiam completamente enquanto eu me questionava em que momento da minha vida acarretou para que eu viesse parar aqui, o fato é que eu mal me lembrava dos acontecimentos de ontem a noite.

Quando o médico se despediu, me liberando então do seu monólogo eu mal me lembrava de qualquer palavra que ele tinha dito, uma enfermeira me levou de volta ao meu quarto e meu deu alguns remédios que eu não faço ideia do pra que serviam.

Ao chegar no meu quarto eu me sentei em frente a uma antiga escrivaninha e me pus a escrever uma carta.

Queridos papai e mamãe,

Venho por meio dessa carta dizer que estou bem, meu primeiro dia foi tedioso mas eu me sinto cansada pela quantidade de remédios que tomei, não se preocupem comigo, eu apenas espero sair daqui logo e tomar minha liberdade de volta.

- Lucrécia.

Eu sabia que era uma carta curta mas eu não tinha a menor vontade e animo para escrever algo maior ou mais elaborado do que isso, eu sentia que minha escrita não tinha alma alguma. Liberdade? Será que alguma vez eu já tive liberdade? E se eu tivesse, eu a usufrui? Mesmo sendo um ser humano totalmente livre, estaria eu presa às limitações da minha mente para o resto da minha vida? Eu senti uma única lágrima rolar pelo meu rosto e decidi que era a hora de parar de pensar. Eu lacrei a carta e saí do meu quarto sem fazer barulho enquanto procurava alguma forma de colocar essa carta nos correios. Eric surge por trás de mim e toca meu ombro com a mão esquerda.

- aonde você pensa que vai?

- ah! - eu dou um pulo de susto - eu pretendo entregar essa carta aqui...

Eric toma a carta das minhas mãos - não se preocupe eu vou entregar pra você, pode voltar ao seu quarto e descansar.

Eu sinto uma exaustão muito grande e volto para o meu quarto onde repouso sobre a cama o resto da noite.



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