Boneca

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1.

A primeira vez que eu o vi, estávamos no meio de uma floresta densa.

As folhas assobiavam em um uivado agudo com a força do vento da madrugada. E eu só consegui ter um pequeno vislumbre dele graças a beleza da lua cheia que iluminava todo o local... e porque ele não fez questão de se esconder.

Em meio a dois troncos grossos estava sua figura imponte, de pé sem fazer um movimento ou som, nem mesmo a grossa folhagem aos nossos pés me indicou de sua presença.

Ele olhava para mim com aqueles olhos vermelhos horripilantes que me davam gastura, lembro-me como se fosse hoje a maneira como meus membros endureciam e minha mão foi imediatamente para a minha katana presa à cintura. Por pouco eu não perdi o controle da minha respiração, meus lábios secaram e o suor começou a escorrer pelo meu rosto.

Mas tão rápido como ele veio, ele também se foi. Apenas um piscar de olhos, literalmente, e ele já não estava em mais lugar algum para ser visto.

Eu fiquei frenética, rodeando aquela floresta inutilmente a procura do demônio de olhos vermelhos.

Eu não parei até o amanhecer, e, naquela época, ainda não sabia seu nome.

2.

A segunda vez foi em uma pequena vila ao norte. Era inverno, e estava nevando, eu passei a primeira parte na noite caçando um demônio de baixo nível, e precisava de um lugar para me abrigar.

Infelizmente, a pequena vilazinha mais próxima era tão pequena que não havia uma pousada. E, naquela hora da noite, nada estava aberto.

Foi quando Ele apareceu, como algum tipo de salvador, cabelos esvoaçados em uma beleza escura ondulada e coberto de roupas pesadas apropriadas para a neve. Ele se apresentou como Muzan.

Eu estava congelando, então não pensei muito quando ele me ofereceu para ficar em sua casa. Não questionei o que ele estava fazendo acordado naquele horário, ou como ele parecia estar esperando pela minha chegada.

"Você parece cansada." Ele comentou uma vez que estávamos em frente a sua lareira com um chá calmante na mão. "Noite difícil?"

Exausta, não reparei como no lugar das pupilas havia fendas dilatadas, ou como o tom marrom de suas írises brilhavam em vermelho algumas vezes. "Sim, tive que trabalhar mais duro que o normal hoje."

"Leve o tempo que precisar. Arrumei um quarto extra para você, e é sempre bom ter companhia estrangeira em um lugar isolado como esse." Ele sorriu docemente, mostrando dentes demais e presas que não deviam estar em um ser humano. Além de que, algo na maneira como seus lábios se contorceram parecia errado, a gentileza que ele esboçava estava forçada e outra coisa queria tomar seu lugar. Algo mais... escuro e tenebroso.

Porém, como eu estava, em meu estado de embriaguez depois de ter a luta mais difícil da minha vida até aquele momento, apenas ignorei todos os avisos que meu cérebro e corpo me davam para correr e sair de perto desse homem o mais rápido possível.

Quando acordei, não me lembrava de ter ido dormir.

3.

A terceira vez eu senti um senso de familiaridade e déjà-vu ao encontrá-lo em uma cidade, esta, maior e mais desenvolvida. Era época de festival, a melodia animada ressoava da banda e eu apenas observava as pessoas dançarem.

O demônio que eu fui encarregada de matar ainda estava à solta, mas de acordo com seus padrões de assassinato, ninguém estava em perigo por pelo menos mais duas horas. Mas isso não significa que eu poderia relaxar, então me contentei em observar as pessoas moverem seus corpos no ritmo da música.

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