O Livreiro

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Ao despontar do sol, a pequena cidade de Verdantia acordava envolta em um manto de nuvens densas e o céu parecia pintar a cidade em matizes sombrios de azul acinzentado. As colinas que rodeavam a cidadezinha tinham um porte exuberante e se erguiam como sentinelas solitárias, envoltas em uma névoa enigmática, emanando uma silhueta de melancolia e mistério por onde se olhava.

No cerne dessa paisagem enevoada, uma modesta livraria se destacava como um refúgio acolhedor, pelo menos era assim que Julian gostava de imaginar. Ele, que secretamente se chamada de O Livreiro, sempre buscou abrigo e inspiração nas páginas dos livros, imerso na serenidade e no silêncio de sua pacata rotina.

Julian era um jovem alto, de pele pálida e cabelos castanhos, com um olhar tão profundo que parecia desvendar os segredos mais íntimos. Sua vida foi marcada por uma tragédia: a perda dos pais em um acidente. No entanto, essa dor não o destruiu; ao contrário, fortaleceu-o. Ele assumiu a responsabilidade de manter viva a chama da adorada livraria de seus pais. Mais do que apenas herdar o negócio, Julian compartilhava a mesma paixão avassaladora por livros, encontrando nas histórias não apenas consolo, mas também um propósito renovado para viver.

Apesar de sua aparência imponente e um tanto fechada, Julian era uma pessoa gentil, com sede de conhecimento. Enquanto Vedantina despertava para um novo dia, ele permanecia ali, como o guardião solitário da livraria que se tornara seu santuário pessoal, prometendo aos visitantes uma jornada além das páginas, onde a esperança e os sonhos ganhavam vida.

Naquela manhã envolta em neblina, uma figura familiar emergiu dos degraus da livraria: a velha Dona Nazira, uma senhora solitária que testemunhara a história da cidade desde seus primórdios, quase cem anos atrás.

Ela estava envolta, como de costume, por uma echarpe marrom-escura, sua silhueta magra e esguia alimentava os rumores das crianças locais, que a viam como uma possível bruxa. Não era uma suposição completamente infundada, pois quem a observava atentamente percebia um olhar repleto de mistérios.

Dona Nazira passou um tempo examinando os livros, sendo calorosamente recebida pelo paciente rapaz. Julian fazia questão de tratar todos os raros visitantes com a máxima atenção, o que a deixou encantada e a levou a fazer uma pergunta intrigante:

_Meu jovem, vejo em você um coração generoso e maneiras impecáveis. Fico intrigada para descobrir quais são os seus desejos mais profundos. Reflita com cuidado, pois quem sabe, o universo esteja ouvindo atentamente, meu querido.

Julian ergueu uma sobrancelha, um tanto desconfiado das intenções da velha senhora, mas curioso o suficiente para refletir sobre a pergunta. Ele respondeu, sem hesitação.

_Em primeiro lugar, desejo que as pessoas redescubram o amor pelos livros, assim como meus pais tinham, e como eu aprendi a ter. Que esse amor as transporte para os mundos contidos entre as páginas, permitindo que vivam cada aventura como se fossem suas.

Um sorriso iluminou o rosto da velha enquanto os olhos de Julian se alargavam diante da visão maravilhosa de um mundo onde os leitores vorazes preenchiam sua modesta biblioteca com vida. Contudo,essa bela visão foi abruptamente interrompida pela risada abafada de DonaNazira, que o observava com um olhar enigmático e um tanto sinistro

Após isso, a velha virou as costas e seguiu seu caminho, agradecendo pela atenção. Julian a observou involuntariamente até que sua silhueta magra se dissipasse, realmente sua presença era peculiar e sinistra.

Ao retornar para dentro da livraria, Julian notou um livreto de bolso com capa de couro marrom caído no chão. – Será que a velha esqueceu sua agenda? – Pensou ele, ao abri-lo. No entanto, o livreto não tinha nenhum conteúdo, exceto por uma pequena mancha em tom bordô na primeira página, como se tivesse sido causada por vinho tinto.

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