Sonhos e Responsabilidades

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★ Pov - Esther
Esther voltou de mais um de seus passeios noturnos, era como ela se sentia livre. Sua cabeça tinha parado de doer, e parecia que seu corpo tinha sido lavado, o peso de alguns dias atrás tinha se aliviado. Esther tinha completado 17 anos recentemente, e desde aquele dia suas madrugadas não tinham sido mais as mesmas. Insônia, dores e uma sensação estranha que só conseguiam ser caladas com o vazio do espaço. Um copo de leite esperava nas garras de seu companheiro, um robô que a mesma tinha criado depois de mais um fracasso no amor.
- Obrigada Hobe – Ela disse fazendo um carinho na cabeça metálica e se sentando em sua cama. - Está quase amanhecendo, desligue as luzes sim?
- Bons sonhos, mestra. - disse Hobe, com uma voz artificial lenta e compassada enquanto apagava as luzes com seu sistema.


★ Pov – Houdini
Enquanto isso, do outro lado do hiperespaço, um jovem escutava música enquanto rabiscava nos painéis flutuantes em seus aposentos. A planta incompleta de uma nave podia ser vista ao lado de várias palavras que viajavam com o som da música. Cada painel tinha algo diferente: poesias, pensamentos acerca da vida, histórias sobre aventuras e suspense.
Houdini usava uma mão pra coordenar os movimentos dos painéis, chamava um, escrevia, passava pra outro, desenhava, acrescentava coisas a direita e a esquerda. Um sorriso de canto estava em seu rosto, e ele se afastou, rodopiou em sua cadeira lentamente e contemplou os resultados da sua explosão de criatividade, enquanto a luz começava a invadir o cômodo escuro, que contava apenas com uma pequena fonte de iluminação azulada com foco em seu ambiente de trabalho. Ele apertou um botão e sua cadeira se reclinou, esticou e uma coberta surgiu de um pequeno compartimento, que se fechou logo após Houdini a pegar. O garoto desligou sua luminária, parou a música e ficou encarando o teto, onde seus projetos pairavam, até cair no sono.

★ Pov - Esther
Eu corria, chorava, soluçava... Meus pulmões pareciam falhar, a respiração pesada. Tudo estava escuro, e eu parecia não saber onde estava, me sentia perdida no mundo. E de forma rápida e desconexa eu mudava de cenário, uma hora eu estava no centro de educação, outro segundo e eu aparecia em um lugar com escadas e música ambiente e o mesmo vulto me perseguia. Um vulto escuro, que trazia consigo dor, insegurança, medo e desesperança. Não importa onde eu estivesse, ele estava lá também, sorrindo pra mim com os braços estendidos, como se debochasse enquanto pedia pra eu me entregar a ele. Ele gritava, e as palavras soavam como cortes, ensurdecedores. Um segundo. Consegui escapar. Não sei como. Uma luz azul no fim do corredor. Parecia me chamar...

Levantei em um solavanco, meu corpo suava e uma lágrima descia pela minha bochecha. Senti uma tontura e coloquei a mão na cabeça. “ Hobe! Pílula pra enxaqueca.”
- Aquele sonho de novo, mestra? - Não era a primeira vez que acontecia, mas algo estava diferente... só não conseguia me lembrar.
- Infelizmente sim. - Falei e tomei o copo d’água com o remédio. Olhei pra Hobe que imediatamente me mostrou as horas em seu pequeno monitor, que eu costumava dizer que eram seus olhos. 10h. Tenho que fazer o almoço.

Esther abriu a geladeira de sua nave, pegou os ovos e uma carne descongelada e foi fazer uma omelete pra comer com o macarrão preparado do dia anterior, tudo com auxílio de seu robô, que mostrava instruções de molhos para carne no seu monitor. E as 12h seu almoço estava pronto, horário este em que Houdini acordava, com uma luz vinda de cima e uma voz estridente no seu ouvido.

★ Pov - Houdini
- Ficando acordado até tarde, acordando na hora do almoço, comida espalhada pelo quarto. Sem falar nas cortinas fechadas, como vou confiar em você pra morar sozinho?
- Ah mãe, eu já lhe falei, são pequenos sacrifícios se comparados com meus planos para o futuro. - Digo chateado enquanto meus olhos se acostumam com a iluminação. - Além disso, já pedi que não me acordasse, não importasse a hora que fosse. Quantas vezes tenho que explicar que sinto dificuldade para dormir devido as ideias, e quando a senhora me acorda fico com dor de cabeça o dia inteiro?
- Eu sei, mas procure cuidar de si mesmo. Só o que eu peço é um pouco de esforço, não quero ver meu pequeno gênio doente por falta de sono e má alimentação. E também que deixe seu quarto arrumado, não é tão difícil.
- Ah isso? - Digo apontando pro pacote de salgadinhos ao chão - Eu realmente esqueci, me desculpe. - Recebo um beijo em minha cabeça, e logo depois, minha mãe bagunça seus cabelos e sorri. Antes de sair do quarto ela repete o que eu ouço todo santo dia - Se arruma, o almoço tá quase pronto. Te amo filho.

★ Pov - Esther
- Mestra? - ouço a voz robótica me tirar de meus pensamentos.
- Sim? - respondo calmamente.
- A senhora pediu pra avisar quando os suprimentos estivessem perto de acabar ou passassem da validade. Felizmente a senhorita consumiu e escolheu os produtos muito sabiamente, então não temos registo de nada estragado. Porém, segundo os meus cálculos, daqui a 4 dias os suprimentos irão acabar. - ele diz mostrando pequenos desenhos em seu monitor.
- Obrigada pelo relatório Hobe. Trace a rota para o posto de reabastecimento mais próximo, eu irei checar se há algum trabalho e como está nossa carteira. - Falei pegando o prato com meu almoço e levando pra lavagem.

Ela não tinha certeza em quanto tempo o dinheiro ia acabar, mas sabia que estava perto do fim, em breve teria que arranjar um jeito de conseguir mais. Já estava cansada de trabalhar fazendo favores pelo espaço, Esther precisava de um emprego fixo, mas onde?
Esther passou a tarde inteira pensando, ela sabia que não haviam muitas opções de trabalho em que ela não precisasse morar em outro planeta, mas mesmo assim, sentia como se não fosse se encaixar na rotina.
Pegou sua carteira, ainda tinha o suficiente pra se manter por mais um mês e pra comprar o necessário, mas teria que encontrar um emprego rápido se quisesse garantir um salário antes que precisasse reabastecer novamente. Em 2 dias a nave ia embarcar no posto mais próximo, isso dava tempo suficiente pra ficar uns dias estacionada antes de acabar tudo, a fim de conversar com pessoas de outros planetas pra conseguir informação.
Nos dias seguintes, Esther fez seu planejamento, ela gastava no mínimo 200 galactus por mês com comida e com o material de limpeza, mais 100 cada capsula de energia da nave, e ainda tinha os 500 que ela tinha que retirar quando Hobe precisava de um trato em suas peças. Levando em consideração que a nave não consumia tanta energia, ela não gastava muito, excerto quando havia viagens longas, geralmente por conta dos bicos que fazia, mas que eram suficientes pra se manter. Era provável que o custo da energia aumentasse por ter que ir diariamente ao trabalho e voltar, já que dificilmente iriam deixar a nave ficar estacionada no local. Quando chegou ao posto já tinha tudo anotado, o quanto ela gastaria por mês e o quanto ela teria que guardar para emergências, no caso Hobe e a nave, só precisava do emprego.

Estrelas em ColapsoOnde histórias criam vida. Descubra agora