Just (not) another girl

capítulo único

Um tom nublado cobria o céu de Seul, nuvens cinzentas e carregadas, alguns pingos de chuva caiam sobre o asfalto quente e indicavam o temporal que estava por vir. A maioria das pessoas preparavam-se, fechando seus estabelecimentos mais cedo, apertando o passo até seus respectivos carros e abrindo seus guarda-chuvas durante o percurso. Enfim, isso era o que a maior parte fazia.

Mas uma garota, ia contra o gradiente, caminhando lentamente pela calçada até o ponto de ônibus, arrastando a mochila preta no chão e pisando periodicamente na barra molhada - devido ao chão úmido - de sua calça larga, que por sorte, também era escura. Quando os pingos de chuva começaram a aumentar, respingando por seus fios castanhos e desalinhados, que até carregavam um certo charme, mas no momento ficavam cada vez mais ensopados; sua franja, já completamente colada na testa e a capa de sua guitarra ficando cada vez mais grudada no instrumento, que provavelmente também molhava.
Contudo, essa era a menor das preocupações de Kazuha. Ela não estava nem aí se um temporal começasse a cair a qualquer momento. Não estava nem aí para absolutamente nada.

A única coisa para qual ela direcionava toda a sua preocupação era Sakura. A única garota que fazia seu coração bater tão freneticamente que parecia estar à beira de um colapso. Que a deixava com as mãos suadas, com apenas um olhar, só por ter sua atenção sobre ela. A mesma Sakura que a guitarrista planejava pedir em namoro no fim da semana. E a garota que com certeza não queria mais vê-la nem pintada de ouro. A linha de raciocínio mais comum a se seguir seria a de questionar o quê a Nakamura tinha feito para estragar tudo e deixar a outra japonesa daquela forma... Certo?

Não! Errado!

Pobre Kazuha, não havia feito nada demais, mas só para contextualizar: o de sempre aconteceu. Não era novidade alguma que a castanha possuía uma beleza notável e um charme de arrasar corações, sem contar seu talento pra música. Fazia um sucesso enorme com todas as garotas do colégio onde estudava, e até uma certa época, ela aproveitava bastante isso.

Mas quando Sakura Miyawaki apareceu, todas sumiram do seu campo de visão, restando apenas ela. Na época, Kazuha usou todo o seu encanto para conseguir ao menos o número da japonesa, e funcionou. Aos poucos o estilo desleixado e de sorriso solto da guitarrista, conquistou o coração da mais nova.

As duas se entendiam perfeitamente bem, as conversas batiam, o beijo era lento e incrível e a química simplesmente absurda. Mas já fazia uma semana que Kazuha não sentia o calor do corpo da japonesa contra o seu. O motivo disso, era o fã clube de admiradoras extremamente fogosas que viviam no pé da Nakamura, sendo essa a fonte de suas principais discussões com Sakura.

A mais recente delas, fora quando a guitarrista estava treinando alguns acordes na sala de música e Kim Minju, uma das garotas que não largava do seu pé, resolveu que seria uma boa ideia ir até lá e tentar a sorte; ela forçou um beijo e no momento que Kazuha iria afastá-la, Sakura chegou e não lhe deu nem a oportunidade de explicar. Aquilo ocasionou na Miyawaki lhe ignorando por duas semanas seguidas. Normalmente a birra da japonesa mais velha durava no máximo uns quatro dias. Mas duas! Repito, duas semanas! Era demais pro coração fraco de Kazuha.

Dessa vez sua garota parecia estar realmente irritada e magoada consigo, e esperar que a mesma voltasse ao normal com ela estava lhe tirando o sono.

"Ah, fala sério! Eu não aguento mais ficar longe dela." - choramingou, chutando uma pedra qualquer da calçada molhada e grunhido alto para o vento.

Algumas pessoas que passavam ali lhe direcionaram um olhar questionador, mas ela nem ligou. Não se importava com mais nada!

A jovem estava a poucos metros do ponto, e já era possível avistar o ônibus vindo ao longe, mas antes que o mesmo pudesse chegar, a chuva começou. E com força. Um temporal sem igual, com ventania forte, esvoaçando os fios de Kazuha e por fim ensopando-a por completo. Ela seguiu inabalável, já estava toda acabada mesmo, e nem era só fisicamente. Esperou até que o transporte parasse e as portas automáticas se abrissem, e então subiu cumprimentando com um balançar desanimado de cabeça, o motorista que sorriu fechado. Acho que até o motorista percebeu o meu estado deplorável.