Papai

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 Olá, queria te dizer que estou viva, mas não vivo a muito tempo, aliás, não me lembro se algum dia vivi de fato. 

 Quando eu era menor, me perguntei inúmeras vezes o que eu na minha tão pouca vida te fiz a ponto de você ir embora, me culpei tanto por tanto tempo que quando eu vi eu ja estava entrando na puberdade. Não lembro de muitas coisas relacionadas a minha infância, mais coincidentimente, todas que eu lembro, envolvem você. 

 Festas de aniversarios em que você não esteve presente, dia dos pais onde você não apareceu, natais em que tanto desejei que meu presente fosse você. E você nunca veio, nunca ligou, nunca se importou.

 Então, eu na minha inocência, era aquela criança que todo pai pedia a Deus. Comporta, aluna nota 10, sempre obedencendo, educada. Eu achava, que um dia talvez, você voltaria e se orgulharia de mim. Eu cresci, entrei no ensino médio e virei aquelas excluidas dos grupinhos, a sem sal ou a nerd que mantiam sempre em stand by para quando precisassem. 

 Me tornei um capacho nas mãos de pessoas que eu acreditava serem meus amigos, me esforçava para que gostassem de mim, fingia ser alguém que eu não era, me anulava, anulava minha opiniões, meus gostos, me perdi em mim porque era insuportável a ideia de me deixarem novamente.

 Quando me dei conta da maluquisse que estava fazendo comigo mesma, me afastei aos poucos, e foi doloroso perceber que se eu não chamasse para conversar, se eu não me forçasse a puxa assunto e inventar brincadeiras eu iria permanecer sozinha, foi uma decisão difícil e ainda sim eu fiz por mim, acho que foi a primeira vez que me priorizei. 

 Eu terminei o fundamental sozinha e entrei no médio, rezando a Deus que ele me enviasse boas amizades, e sou grata pelas boas pessoas que conheci lá, mas ainda sei que não era meu lugar. 

 Conheci meu primeiro namorado sério em muito tempo e quis tanto viver aquelas experiencias constragedoras de apresentar o namorado ao pai, e não pude também. 

 Chorei tantas vezes, durante todos esse anos, pedindo desesperadamente a Deus para me confortar porque a solidão é triste, fria, seca e extremamente pesada. Não estou te culpando pelos outros filhos da puta que apareceram na minha vida, queria que você entendesse a extensão da dor em que você me causou, queria que você sentisse remosso por todas as vezes que lutei tanto para ser o suficiente, que sentisse a mesma dor de se só, útil apenas quando necessário. E que Deus me perdoe pelo ódio que me consome quando se trata de você. 

 Você, papai, querido progenitor, era para ser meu super heroi, aquele me confortaria nos dias difíceis, me consolaria nas noites tempestuosas, me mimaria quando eu estivesse doente, me salvaria dos possíveis perigos. Você deveria ser meu primeiro amor e foi o primeiro a me não só me decepcionar como a me abandonar, ir embora. 

 Você não lembra a minha idade, meu nome — apesar de ter tido a ousadia de ter escolhido e tatuado ele em seu braço — completo, minha data de aniversário, não sabe minha cor ou comida favorita. E ainda que você tenha sido um bosta a vida inteira comigo, eu lembro todos os anos seu aniversario, a única coisa que sei sobre você, além seu nome é claro, ja que consta na minha certidão. 

 Mas sinto me feliz em dizer, não preciso de você, aprendi a viver sem sua presença. Me formei bem, ainda não tenho amigos com quem contar e nem um namorado bacana, mas passei em um faculdade e um dia serei uma profissional de excelência. Espero também construir minha família, a que eu sempre quis e desejei, a que eu sonhei.

 Você, eu espero que morra em remoço e sozinho. Você não é digno nem mesmo de pena, de dó ou carinho de alguém, é o tipo de pessoa que me faz deseja no fundo do poço me vendo bem estruturada para poder dizer o que repito a mim mesma milhares de vezes: Eu não preciso e nunca precisei de você. 

Mas não é verdade de fato, porque fez falta, mas aprendi a viver sem sua presença. Não sou tão feminina quanto gostaria, nem tão delicada, aprendi a amadurecer mais cedo do que eu precisava, e na real cansei de esperar sempre tanto de todo mundo.

As vezes, me vem a cabeça, que talvez eu realmente seja a errada. Todo mundo tem amigos e pessoas que se importem, as vezes eu sinto que só existe e é só. Mas a vida deveria ser mais que isso. Mas qual a probabilidade de se ser tão sozinha e os problemas estarem unicamente nos demais? Talvez você estivesse correto, talvez você volte um dia para derrubar o pouco do que construir, talvez... talvez eu esteja certa, talvez ficando louca, talvez... talvez eu... talvez eu sinta sua falta, até me dar conta que não posso sentir falta de alguém que nunca esteve aqui, apenas da idealização da pessoa que eu gostaria que você fosse... talvez... talvez eu...

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⏰ Última atualização: Apr 08 ⏰

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