Vancouver, Canadá.

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O frio. O frio combina com a dor. A dor da perda. A dor de um coração partido. Max me conhecia mais do que eu mesma.

Chego no hotel e procuro pelo senhor Hayes.
- Quem gostaria? - pergunta a secretária.
- Rafaela Bonaparte.
- Só um momento. - aguardo. - Pode subir, o senhor Hayes a espera no quarto 3862.
- Obrigada. - sigo para o elevador.
A decoração do edifício é belíssima. O mármore, as obras de arte fixadas à parede.

Um homem de meia idade acena em minha direção. Deve possuir uns 45 anos, no máximo.

- Senhorita Bonaparte, espero.
- Sim, senhor Hayes.
- Acompanhe-me. St. Vicent falava muito da senhorita. Ele a amava, sabe disso, não sabe?
- Sei, sim.
- St. Vicent era meu cliente. Em seu testamento, ele deixou para a senhorita sua herança.
- Ele conseguiu.- murmuro.
- O que disse?
- Nada. Prossiga.
- St. Vicent legou para a senhorita um patrimônio de 6 milhões de euros, distribuídos em imóveis, obras de arte, jóias e espécie, este devidamente armazenado num banco de Berna, Suíça. Ah, claro, há uma companhia literária também.
- Desculpe. Pode repetir?
- Com as mesmas palavras de Max. "Rafaela ama ler. Muitas vezes passava a noite em claro com a cabeça nos livros. Por isso, enquanto não viermos para Vancouver, a companhia Bonaparte & C.A. estará sobre supervisão dela." Ele comprou uma editora para a senhorita.
- Irônico o nome.
- St. Vicent era um homem com humor inigualável.
- Eu que o diga. - suspiro relembrando de todas as brincadeiras que Max fazia comigo.
- Você está se referindo quando ele caracterizou-se de Napoleão Bonaparte em homenagem ao sobrenome da senhorita?
- Exatamente.
- Então, acho melhor não mostrar seu novo apartamento, que por coincidência, é neste mesmo edifício.
- O que Max fez dessa vez? - a única coisa que me vinha à cabeça era que mesmo após sua morte, ele ainda me surpreendia.

Saímos do quarto e o senhor Hayes apertou o número 22.

- Olhe você mesma. - o senhor Hayes abre a porta do apartamento.

Ele só poderia estar de brincadeira. Tem um quadro de aproximadamente 4m x 2m com uma foto nossa em que nos vestimos de Napoleão. Ele ficou de joelhos para gozar com a cara do Bonaparte. Napoleão Bonaparte tinha a estatura comum de um francês, era apenas baixo para o exército. Não sei porque ficam tirando sarro de sua cara. Bonaparte era um gênio. E todo gênio tem suas falhas.

- Não esperava por outra coisa. Mas essa foto está linda.
- Certamente. - concorda o senhor Hayes.
- Eu a amo.
- Tenho a permissão de chamar a senhorita de Rafaela?
- Somente se eu puder chamá-lo pelo seu primeiro nome que eu gostaria de saber qual é.
- Meu nome é David, Rafaela.
- Muito bem, David.
- A apartamento é seu. Vou pedir para que subam suas malas. Preciso fazer uma ligação. Em 10 minutos estarei de volta.

Este lugar é incrível. Max tem bom gosto. Tinha. Preciso me acostumar. Ele gostaria que eu seguisse em frente, que fosse feliz, e ele fez questão de deixar uma nova vida para mim aqui. Eu ainda o amo, mas tenho que viver o que restou da minha vida. Ou melhor. Viver minha nova vida.

Olhos de vidroOnde histórias criam vida. Descubra agora