Tocando: One and Only - Adele
Conseguia me esquecer dos problemas que rondavam minha vida pessoal durante praticamente todo o horário de trabalho. Eram tarefas demais para pensar sequer em parar para me alimentar ou para respirar. Vez ou outra me pegava com falta de ar por segurar a respiração tempo demais enquanto olhava de um lado para o outro, parada num cruzamento entre ruas movimentadas, tentando me lembrar para onde devia ir — ou para organizar meu trajeto — antes de voltar até o prédio onde trabalho sem me esquecer de cumprir nenhuma das minhas demandas.
Apesar disso, a marca branca em meu dedo onde minha aliança costumava ficar sempre me levava de volta aos dias em que eu costumava ter um noivo. Aquela marca demoraria para sair, disso tenho certeza. Foram longos anos carregando-a para lá e para cá, acompanhada ou não de outras joias, ostentando um relacionamento fadado ao fracasso onde somente eu não percebia que a data de validade se aproximava, arrastando-se pelos boletos vencidos e pela falta de companheirismo.
Muitas pessoas dizem que é triste viver na solidão. O que não sabem, porém, é que é ainda mais triste estar com alguém sem, de fato, estar. Passar noites sozinha sabendo que a pessoa que você costumava amar está em algum lugar seguindo sua vida, construindo seu futuro, enquanto você está presa entre algumas paredes com porta-retratos pendurados, emoldurando fotos de momentos passados que, hoje, não fazem mais sentido nem trazem boas lembranças. Ou, também, estar sozinho assistindo a um filme qualquer enquanto pensa se sua vida teria sido diferente se você tivesse dito "não" em vez de "sim", sem deixar o medo de viver sozinho te assombrar.
Aliás, por que as pessoas têm tanto medo de viverem sozinhas? Certa noite, enquanto encarava a televisão e pulava de canal em canal procurando algo mediano para assistir, decidi me trocar e ir até um cinema próximo de casa assistir a um filme qualquer. Comprei o bilhete de um filme indicado pelo atendente, sem questionar sobre a história, a qualidade ou qualquer coisa que um crítico se importaria antes de entrar numa sala escura e cheia de gente com os dedos mergulhados em pipoca gordurosa. Aquela foi, sem dúvidas, uma das noites mais libertadoras dos meus últimos meses. Eu percebi, ainda que tenha me sentido mal em alguns momentos ao encontrar olhares curiosos me encarando, que gosto da minha própria companhia. E eu não saberia disso se não tivesse tido a súbita coragem de encarar aquela noite sozinha, curtindo a mim mesma.
Hoje, transpirando enquanto corro pela Quinta Avenida com várias sacolas penduradas nos braços, um salto me causando bolhas nos pés e uma roupa minimamente confortável, estou leve por saber que vou para casa, tomarei um bom banho de banheira e sabe-se lá se vou assistir à TV, ler um livro ou beber um vinho de qualidade duvidosa enquanto ouço minhas músicas favoritas sem precisar me preocupar com ninguém além de mim mesma.
Cheguei à conclusão de que nada, absolutamente nada, nem ninguém será importante o suficiente para tirar a minha paz.
Mal sabia eu que isso mudaria muito em breve.
— Nate? O que faz aqui? — Questionei enquanto colocava o apanhado de chaves sobre o aparador ao lado da porta e tirava meu casaco e sapatos. Ele tinha um sorriso amarelo nos lábios e eu conhecia muito bem aquela feição. Era a culpa estampada em cada milímetro do seu rosto avermelhado.
— Eu sabia que se ligasse você não atenderia, então vim pessoalmente.
— Eu pedi as chaves de volta. Como conseguiu entrar?
— Bom... — Deu de ombros, visivelmente fingindo estar sem graça. — Digamos que eu mantive uma delas comigo antes de devolver.
Bufei cansada e balancei a cabeça negativamente. Nate nunca foi agressivo, então sua presença não me incomodava por medo de uma reação abrupta ou algum tipo de violência, mas pelo cansaço de precisar entrar em outra briga.
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One and Only
FanfictionShort fic Mirandy. Arte/desenho da capa encontrada no Tumblr: https://www.tumblr.com/isabelle-bt Personagens pertencentes ao filme "O Diabo Veste Prada". Não permito adaptações da história.