Macau
Nascer é um ato solitário, um mergulho na imensidão do desconhecido. E quando avançamos em cada etapa da vida, percebemos que nosso passo é dado sozinho. O obstáculo é enfrentado sem a garantia de uma mão estendida para ajudar.
Mas há pessoas que têm a sorte de ter esse alguém. Que pode viajar com a família, sair nos fins de semanas com os amigos, conversar cada pequeno detalhe do seu dia com sua mãe ou pai.
Esse tipo de experiência é passar pela sensação de pertencimento, de ter um lar onde se é compreendido, aceito e amado. Eu não era um desses sortudos.
Por mais que sempre estive rodeado de várias pessoas, eu me sentia sozinho. Não era apenas a solidão física que me atormentava, mas também a ausência do emocional dentro da minha própria família. Vegas, meu irmão mais velho, estava mergulhado em seus compromissos com a máfia, e embora sua presença fosse rara em minha vida, eu reconhecia que, de alguma forma, ele se importava, mesmo que isso se manifestasse pouco.
Meu pai, uma figura imponente e distante, nunca mostrou interesse real em mim. Para ele, eu era apenas um apêndice inconveniente, uma presença indesejada que ele tolerava por obrigação familiar. Cresci rodeado de seguranças e funcionários, mas a verdadeira solidão ficava gravada dentro de mim pela falta de afeto e atenção genuína.
Nasci em um mundo onde as relações eram baseadas em poder, dinheiro e influência, e eu não passava de uma peça secundária nesse jogo cruel.
— Macau, vamos? Você está atrasado - disse Araya batendo levemente na minha porta. Ela era a governanta da casa.
Eu estava debruçado na minha mesa, com fones de ouvidos escutando rock alternativo dos anos 90, deixando-me envolver pelas batidas e letras. Enquanto as notas musicais ecoavam em meus ouvidos, eu me permitia perder na arte do desenho.
Com o lápis preto em mãos, eu traçava linhas cuidadosas, criando sombras e detalhes que davam vida ao papel. Cada traço compunha o formato de rosto. Enquanto me concentrava no desenho, fui tirado de meus devaneios pelo seu chamado.
— Já estou indo. - falo me levantando. Guardo meu caderno de desenhos cuidadosamente na mochila da escola. Ela me observava com olhos bondosos enquanto eu ajustava os fones de ouvido ao redor do pescoço, parando a música que ainda ressoava em meus ouvidos.
— Preciso finalizar isso mais tarde — murmurei, indicando o caderno na bolsa.
Araya assentiu, compreensiva.
— Só vamos logo, você já está atrasado para o colégio, sua sorte é que seu pai saiu cedo de casa - fala.
Com um aceno, reconheci o gentil lembrete dela, sabendo muito bem as consequências de chegar tarde à escola. O tempo não era um luxo que eu pudesse desperdiçar, especialmente considerando as expectativas colocadas sobre mim desde que nasci.
Ajustando as alças da minha mochila, segui em direção à porta.
— Vamos então! - respondi, minha voz carregando um leve tom de resignação. — Obrigado, Araya.
Com um último olhar para o quarto onde meus pensamentos haviam fluido livremente, saí pelos corredores da mansão que servia como meu santuário e minha prisão.
Na elegante sala de jantar, a mesa estava posta com uma variedade de pratos requintados.
Enquanto eu engolia algumas frutas e um gole de café, minha mente já estava viajando nas atividades que precisava cumprir no dia.
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Duas Metades
FanfictionDepois de um doloroso rompimento. Porchay está mergulhado na escuridão, afastando-se de sua família e amigos. Até mesmo considera abandonar sua paixão pela música. Enquanto alguns o ignoram, imersos em suas próprias preocupações, outros aguardam que...