Sob Lanternas || Mendrux

Capítulo Um

É uma tarde bonita, sem dúvidas. A luz do sol invade a enorme construção pelas janelas abertas, batendo em suas paredes brancas e suas colunas com detalhes azuis e dourados, refletindo nos móveis de cor clara com design delicado. Os corredores espaçosos, normalmente silenciosos, estão mais desertos do que nunca estiveram, podendo notar apenas o som do vento leve batendo nas cortinas. Essa paz tão costumeira do lugar é logo interrompida pelos resmungos do príncipe, residente do grande castelo.

Ele adentra o corredor, usando uma camisa branca e um colete aberto, num tom escuro de roxo, além de sua coroa de ouro com detalhes em pedras de ametista. O rapaz é jovem e baixo, de pele clara um tanto pálida, medindo aproximadamente um metro e sessenta de altura, enquanto seu corpo é um pouco arredondado, não sendo muito magro. Seu cabelo cacheado médio possui uma coloração castanha um pouco ruiva, seu olho esquerdo possui um desalinhamento com o direito e os dois olhos têm uma coloração magenta. Seu nariz arrebitado é estampado com sardas que se estendem até suas bochechas.

— Não posso fazer isso, não posso fazer aquilo. — O rapaz de cabelos cacheados murmura irritado, caminhando pelo ambiente. — O que ele acha que eu sou? Uma criança? Eu posso me virar lá fora! Não é como se um dia fora fosse me matar ou manchar a nossa reputação. Aposto que ninguém iria me reconhecer, de qualquer forma. Não aguento mais ele me tratando igual a um adolescente. “Pedrux, eu sou seu irmão, você tem que me obedecer” o caramba. Eu só queria participar do festival, é pedir demais? — Seus dedos ansiosos brincam com seu brinco dourado de argola com pingente em formato retangular.

A alteza transborda sua frustração, pisando forte a passos lentos. Novamente, o rei havia negado seus pedidos de poder comparecer ao glorioso Festival da Primavera de Aestus, mais conhecido como Florescer das Luzes, um dos eventos mais prestigiados do reino. Milhares de turistas vêm às terras de Aestus todos os anos para visitar o festival e assistir ao lançamento das lanternas, os comentários sobre a cultura extraordinária do lugar continuam correndo pelos quatro cantos do continente por até meses depois do fim do festival. E mesmo assim, o próprio príncipe de Aestus sempre é proibido de participar. Irônico, não?

Apuh, o rei do famoso Reino dos Mares e irmão mais velho de Pedrux, preza acima de tudo por manter em segurança a sua família e sua reputação. Pelo menos, isso é o que ele sempre diz quando proíbe o irmão de ir às Partes Baixas do reino, inclusive nos eventos importantes. O mais novo, é claro, considera tudo isso uma grande besteira, ele sabe se cuidar o suficiente para não morrer e nem fazer coisas idiotas em um evento de grande porte, não é burro. Mesmo assim, Apuh ainda alega que não há razões para que Pedrux queira comemorar junto ao resto da população se eles já possuem a própria comemoração com os seus amigos e familiares. O mais novo já cansara de explicar seus mil e um motivos, mas todos são ignorados ou vistos como fúteis. Talvez sejam mesmo, nenhum deles explica a real causa pelo qual Pedrux quer tanto comparecer ao festival, mas a intimidade dos dois irmãos já não existe mais para que o mais novo se sinta à vontade para compartilhá-lo.

Em meio aos murmúrios, o rapaz solta um suspiro lembrando da época em que era próximo de seu irmão. Agora ele parece um fantasma dentro de sua própria casa.

Não se apega às boas memórias por muito tempo, sua raiva logo volta a falar mais alto. Ele cerra os punhos com força, enquanto caminha.

— Ele anda sempre com o nariz empinadinho, se achando melhor que todo mundo. Ele fechou a porta na minha cara. Eu não acredito nisso. — Agita as mãos em um gesto de indignação.

Apuh costuma ser bem rígido com o rapaz, mas dessa vez havia exagerado em sua reação, ignorando totalmente qualquer tentativa que o mais novo tivesse de argumentar, apenas gritando com ele e saindo da sala, abandonando o castelo para uma “reunião importante”. A alteza revira os olhos só de lembrar.