00. Prólogo

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O tempo é engraçado

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O tempo é engraçado. Há duas semanas, eu estava chorando a morte da minha irmã, agora, estou prestes a chantagear um jogador de futebol famoso, sem sequer saber como fazer isso da maneira menos caótica possível.

O caos, ah, o caos! Não é ele tão sublime quanto uma sinfonia tocada por um habilidoso maestro? É um tormento encantador, desconcertante, audacioso, mas totalmente genuíno. Se a beleza está nos olhos de quem vê, asseguro que, aos meus, a turbulência da vida é uma das experiências mais sublimes e devastadoras. Claro, isso vem dos lábios de alguém que nunca se importou com convenções sociais ou buscou o sucesso. Eu estava feliz em ser um fracasso.

Einstein disse que o tempo é relativo, mas eu ouso propor outra visão: os problemas são, igualmente, relativos. Sob o olhar severo e antiquado da minha mãe, a vida boêmia que eu abraçava com entusiasmo — despreocupada, inconsequente e desprovida de qualquer tipo de puritanismo — era intolerável. Mas estava tudo bem. Amalia era a filha boa, responsável, dedicada e eternamente amorosa. Eu não precisava ser perfeita, ela era. 

Enquanto eu estava confortável em ser uma aluna mediana, de uma faculdade mediana de fotografia — onde eu havia ingressado graças ao dinheiro do meu padrasto —, Amalia era tida como o futuro da engenharia. Uma aluna exemplar de Oxford que havia acabado de conseguir a tão sonhada transferência para o MIT. Então, ela adoeceu, e as coisas aconteceram rápido demais.

Diante de tudo isso, sinto-me impelida a aprofundar minha teoria sobre a relatividade. O que vale mais a pena? Viver pouco e ter aproveitado cada instante, ou viver muito sem ter aproveitado a vida de verdade. E, quem é que define o que de fato é aproveitar a vida? Tudo, absolutamente tudo, era uma mera questão de perspectiva. 

Sob uma perspectiva despreocupada, certamente o que eu fazia era agradável. Mas quando começa a chover muito, e existe a possibilidade de não haver um teto para se abrigar, essa perspectiva muda. Você sente falta de casa. 

E eu nunca quis o amor de uma família, até que eu perdi a única pessoa que eu realmente tinha. 

Não me entenda mal, eu detesto soar redundante, mas o tempo tem uma maneira implacável de bater à  porta, e o calor do álcool, cedo ou tarde, se dissipou. A solidão, que antes parecia uma companheira acolhedora, começou a se revelar insuportável. Ela me forçou a confrontar meus próprios atos com uma clareza cortante.

Agora, encontro-me na mesma posição que tantas vezes ocupei na adolescência, sentada em um banquinho de couro branco, à frente de um bar, observando despreocupadamente o trabalho do bartender, enquanto ele me observa com um olhar curioso. As luzes coloridas refletem em meus fios tingidos, enquanto a música tilinta em meus ouvidos. Bato os pés no chão, impaciente.

Confesso que me reaproximar do meu pai não estava nos planos. Nunca de fato fomos próximos, eu não o conhecia de verdade. A única vez que fui morar com ele na Alemanha, após ser praticamente expulsa de casa pela minha mãe, eu fiz algo terrível. Quase destruí a minha vida e a carreira dele no processo. É quase insuportável lembrar da última vez que o vi. O desgosto estampado em seu olhar. 

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