Capítulo II.

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"aqui em teus lábios repousa
os restos de uma criatura
que foi bela sem vaidade;
toma-me."

Diego estava faminto.

Naquela noite ambos fediam a humanidade. Um estranho cheiro de indulgência, culpa e pecado, concentrado para além da camada adiposa daqueles corpos criados divinamente para o fracasso. Mesmo Amaury, com todas as lavandas antes colhidas, adormecidas em seus bolsos, ainda carregava consigo o aroma inconfundível da miserabilidade.

Mas o ruivo sabia que isso seria de pouca importância quando suas roupas tivessem sumido.

Foi instigante fechar a porta atrás deles, observando Amaury dar vários passos apertados para dentro do quarto antes de parar. Diego não se sentia grato. Gratidão não era a palavra que usaria para a manutenção do acordo. Talvez falasse sobre integridade, mas não estavam em uma troca livre de amarras. O detetive optou pela oferta menor. Era um bom negócio, afinal, começar com o menos desejável. Mesmo Diego oferecendo uma saída, por mais razões do que consciência, não havia nada que sustentasse a gratidão.

Além disso, não havia nenhum dom que garantisse o que quer que fosse. Nenhuma maneira de assegurar a diversão de Diego.

Desde que Amaury tinha partido na noite anterior, sua ânsia em alimentar-se de um humano imune aos dons tinha sido substituída por um desejo distinto ao paladar. Mesmo com a relutância primária, Diego conseguia sentir a presença de um humano igualmente ansioso para ser mordido. Então talvez tenha sido teimosia ou orgulho que o trouxe para sua casa e quarto, mas não era tudo, nem de longe.

Mesmo que o passar das horas trouxesse medo, também haveria desejo.
E isso fazia toda a diferença.

– Tire a roupa. – Diego instruiu. – E me espere na cama. Se isso não for incômodo.

– Tudo bem. – respondeu Amaury, com as costas perfeitamente retas.

Diego tirou o casaco e caminhou com passos lentos para trás de um biombo de vime, feito com costuras finas e divisórias rústicas. Amaury não conseguia vê-lo, mas ele sim.

Para a maioria dos vampiros, havia uma diversão intensa em observar a presa, mais as obstinadas. Vampiros amam caçar, é um fato. A substância que rega a alma dessas criaturas parece alimentar-se da inquietação daqueles que suplicam pela própria vida.

E haviam os como Diego.

Humanos que caíam na cama dele geralmente ficavam em êxtase por estarem ali. Não eram de grande desafio. Ele caçava com a habilidade distinta – e invejável – em ser naturalmente sedutor. Embora muitas e muitas vezes usasse seus dons, não era como se ele quisesse uma luta e a tivesse.

Ele não queria que alguém revidasse. Pegar pessoas contra a vontade delas não estava em sua lista de coisas aprazíveis. Ele precisava da mais nítida inclinação para investir. Talvez por isso tenha parecido prudente lançar-se em direção a Amaury.

Ficou ali, quieto, observando por trás da tela que era mais para decoração do que para modéstia, enquanto o moreno se despia. Essas tinham sido suas instruções, afinal. Por um momento, ele se perguntou se o cacheado o obedeceria totalmente, se ele estava certo sobre a ponderação e a curiosidade dele, se ele teria aceitado os comandos com tanta facilidade porque queria estar ali independente das suas condições morais e humanas – cada pensamento ganhava forma nas linhas daquele dorso, parando nos cordões de suas calças, antes que ele as abaixasse também.

A flexão dos ombros de Amaury enquanto ele dobrava as próprias roupas, a exposição das costas lisas e não excessivamente musculosas, apropriadamente torneadas, quadris e pernas grossas. Tudo nele era tentador. De repente, a fome já não era o único sentimento lutando ativamente para ser sanado.

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⏰ Última atualização: Jul 14 ⏰

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