Ares está diante de mim com seu casaco azul-escuro do
time de futebol, que esconde a camiseta verde do treino,
segurando um guarda-chuva e com a outra mão no bolso do
short preto. Não vejo nada além do que ele é: um garoto
rico, atleta e cheio de classe.
Parece tranquilo, como se não tivesse acabado de quase
me matar de susto. É a primeira vez que fico frente a frente
com ele dessa maneira, sua altura me intimida e seu olhar
me atravessa, intenso e congelante.
— Você me assustou — digo em tom acusador, com a mão
no peito.
Ele não responde, fica ali me observando em silêncio.
Passam alguns segundos que mais parecem anos, até que
um sorriso brincalhão surge em seus lábios carnudos.
— Você mereceu.
— Por quê?
— Você sabe por quê.
Ele me dá as costas e começa a caminhar de volta aos
mausoléus.
Ah, não, sem chance de eu ficar aqui sozinha.
— Espera!
Corro atrás dele, que me ignora, mas aparentemente não
se incomoda que eu o siga feito um cãozinho perdido.
Ares chega a um clarão e senta sobre um túmulo,
colocando de lado seu guarda-chuva. Fico ali parada
olhando que nem uma idiota. Ele tira do bolso um maço de
cigarros e um isqueiro. Não me surpreende, sei que ele
fuma. Que tipo de garota obcecada eu seria se não
soubesse disso?Ele acende um cigarro e dá uma tragada, deixando a
fumaça branca sair lentamente da boca. Seus olhos estão
voltados para a paisagem à frente, e ele parece absorto em
pensamentos. Então veio até aqui para isso? É uma longa
caminhada só para fumar. Se bem que faz sentido, afinal
seus pais não gostariam de saber que o filho de ouro e
esportista fuma, e sei que ele faz isso com muita cautela e
às escondidas.
— Vai ficar aí parada a noite toda?
Como uma pessoa tão jovem pode ter uma voz tão fria?
Sento num túmulo em frente a ele, mantendo certa
distância. Seus olhos se fixam em mim enquanto ele solta a
fumaça. Engulo em seco, não sei o que estou fazendo, mas
não tenho como ir embora sozinha nesse escuro.
— Só estou esperando você para não voltar sozinha. —
Sinto necessidade de esclarecer por que ainda estou aqui.
A luz das pequenas luminárias laranja do cemitério se
reflete nele, que me lança um sorriso torto.
— O que você está fazendo aqui, Raquel? — Escutá-lo
dizer meu nome provoca uma estranha sensação oscilante
em minha barriga.
— Vim visitar um parente.
Mentirosa, mentirosa.
Ares arqueia a sobrancelha.
— Ah, é? Quem?
— Meu… Um parente distante.
Ares faz que sim com a cabeça, jogando o cigarro no chão
e pisando nele.
— Sei. E você decidiu vir sozinha visitar esse parente,
debaixo de chuva e à noite?
— Sim, não me dei conta de que já estava tão tarde.
Ares se inclina, apoiando os cotovelos nos joelhos e me
encarando.
— Mentirosa.
— O que disse?
— Nós dois sabemos que você está mentindo.
Brinco com minhas mãos no colo.
— Óbvio que não.
Ele se levanta e eu me sinto indefesa sentada diante dele,
então acabo me levantando também. Estamos frente a
frente outra vez, e minha respiração fica acelerada e
inconstante.
— Por que você está me seguindo?
Umedeço os lábios.
— Não sei do que você está falando.
Ares se aproxima de mim e eu recuo covardemente até
bater em um mausoléu logo atrás. Ele coloca a mão na
parede ao lado da minha cabeça, me fazendo pular.
— Não tenho tempo para seus joguinhos estúpidos. Me
responda.
Minha respiração está desenfreada.
— É sério, não sei do que você está falando. Só vim visitar
meu… Alguém que…
— Mentirosa.
Ele está perto demais. Assim meu coração não aguenta.
— Esta é uma cidade livre. Posso caminhar onde eu
quiser.
Ares segura meu queixo, me forçando a levantar a cabeça
e olhar para ele. Sinto sua mão quente na minha pele fria.
Fico sem fôlego, o cabelo meio molhado está grudado no
belo rosto pálido e perfeito, seus lábios estão naturalmente
vermelhos e úmidos. Isso é demais para o meu pequeno ser.
A duras penas, tudo que eu conseguia era observá-lo de
longe; tê-lo assim tão perto é realmente demais para mim.
Ele esboça um sorriso presunçoso.
— Acha que não sei sobre sua ligeira obsessão infantil por
mim?
A vergonha incendeia minhas bochechas e eu tento baixar
o rosto, mas ele mantém meu queixo parado com gentileza.
— Me solta — exijo, segurando o pulso dele para afastar
sua mão
Mas Ares se mantém diante de mim, sem recuar, seu
olhar descontrolando meu coração.
— Você não vai a lugar algum até me responder. — Ele
soa decidido.
— Não sei do que você está falando — repito, tentando
ignorar o calor que emana de seu corpo e esquenta o meu.
— Vamos refrescar sua memória, então. — Não gosto nem
um pouco do rumo que a conversa está tomando. — Você
me persegue há muito tempo, Raquel. — Escutá-lo dizer
meu nome me dá calafrios. — A imagem de fundo do seu
computador são fotos minhas que você roubou do meu
Facebook, e a senha do seu wi-fi tem meu nome.
Fico sem palavras. Ele sabe de tudo. Dizer que estou
envergonhada é pouco, minha vergonha já está em outro
nível.
— Eu… — Não sei o que dizer. Sabia que existia a
possibilidade de que Ares soubesse da minha obsessão, já
que hackeou meu computador.
Sentimentos contraditórios me invadem. Ele está se
achando, completamente no controle da situação. Dá para
ver o deboche e a superioridade estampados em seu rosto.
Está adorando me colocar contra a parede e me
envergonhar dessa maneira. Espera que eu negue, que
baixe a cabeça e o deixe rir da minha humilhação.
Então algo em mim muda, e a chama do desafio se
acende. Não quero dar a ele esse gostinho, estou cansada
de ser a garota tímida que se esconde atrás de piadinhas e
frases sarcásticas. Sinto necessidade de provar para esse
garoto lindo à minha frente que ele está enganado sobre
mim, que tudo que ele julga saber é pura mentira, que sou
uma garota forte, independente e extrovertida. Esse lado
afrontoso costuma vir à tona quando me sinto encurralada;
é uma espécie de mecanismo de defesa. Chega de me
esconder nas sombras, chega de não dizer a ninguém o que
penso e sinto, por medo de ser rejeitada e deixada de lado.
Então levanto o rosto e encaro seus olhos azuis, que são
como o infinito.
— Sim, eu persigo você.
Dizer que Ares fica perplexo é pouco. Sua expressão de
deboche e vitória desaparece, substituída por pura
confusão. Suas mãos soltam as minhas e ele dá um passo
para trás, atordoado.
Dou um sorriso torto e cruzo os braços.
— Por que está tão surpreso, gatinho?
Ele não diz nada.
Senhoras e senhores, eu, Raquel Mendoza, deixei meu
crush de uma vida inteira sem palavras.
Ares se recupera, passando a mão pelo queixo como se
estivesse assimilando tudo.
— Por essa eu não esperava, tenho que admitir.
Dou de ombros.
— Eu sei.
Não consigo tirar do rosto o sorriso estúpido provocado
pela sensação de estar no controle da situação.
Ares umedece os lábios.
— E posso saber por que você me persegue?
— Isso não está na cara? — respondo, achando graça. —
Porque eu gosto de você.
Os olhos arregalados de Ares ameaçam sair de suas
órbitas.
— Desde quando você é tão… direta?
Desde que você me encurralou e quis me constranger.
Passo a mão por meus cabelos úmidos e dou uma
piscadinha para Ares.
— Desde sempre.
Ele ri baixinho.
— Pensei que você fosse uma garota calada e introvertida
que se faz de santa, mas pelo visto você até que é
interessante.
— Até que sou interessante? — pergunto, bufando. — Sou
a garota mais interessante que você já conheceu na vida.
— E pelo visto também tem uma ótima autoestima.
— Pois é.
Ares se aproxima de mim novamente, mas desta vez eu
não recuo.
— E o que será que essa menina tão interessante quer de
mim?
— Você não consegue deduzir? Pensei que tivesse o QI
mais alto da cidade.
Ares desata a rir, e sua risada ecoa por alguns mausoléus.
— É impressionante tudo o que você sabe sobre mim, e
sim, lógico que posso deduzir, mas quero que você mesma
diga.
— Acho que já falei o suficiente, agora é com você
adivinhar o que eu quero.
Ares se inclina até que nossos rostos fiquem a poucos
centímetros de distância. Tê-lo tão perto ainda me afeta, e
eu engulo em seco.
— Quer conhecer meu quarto? — O tom sugestivo não
passa despercebido, então eu o empurro e balanço a
cabeça.
— Não, obrigada.
Ares franze a testa.
— O que você quer, então?
— Uma coisa muito simples — respondo casualmente —,
que você se apaixone por mim.
Pela segunda vez na noite, Ares ri. Não sei o que ele vê de
tão engraçado, porque não estou de brincadeira, mas não
reclamo, porque o som da sua risada é maravilhoso. Quando
ele para de rir, me lança um olhar ofendido.
— Você está louca. Por que eu me apaixonaria? Você nem
faz meu tipo.
— Isso é o que veremos. — Pisco para ele. — E talvez eu
esteja louca mesmo, mas minha determinação é
impressionante.
— Isso dá para ver.
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através de mi ventana
RomanceUma história de amor e obsessão que conquistou o mundo e deu origem ao aguardado filme da Netflix. Aos dezoito anos, a vida de Raquel se resume a trabalhar em uma lanchonete nas férias, sair com os dois melhores amigos e, principalmente, observar pe...