Naquela noite, depois do animado encontro entre amigas, Carol e Natália voltaram para casa juntas.
"Meu bem... meu bem..." cantarolava Carol.
"O que é que está resmungando aí, hein?" - perguntei curiosa, provocando, insinuando que ela estava resmungando, apesar de Carol nunca resmungar. "Estava sempre leve", pensei. Carol soltou uma risada e deu um tapinha no meu braço.
"Estou cantando, Gal. Sabe, hoje foi muito divertido... Senti você mais leve, rolou alguma coisa que eu perdi?" - perguntou com curiosidade.
"Você achou? É... Estou mais leve mesmo. Acho que estou aprendendo a relaxar", respondi.
"Olha, tenho uma dica ótima pra isso. Comecei a fazer meditação, acredita? Estou amando... Minha mãe esses dias estava vendo uns vídeos e eu achei ridículo", soltou uma gargalhada. "Mas depois comecei a fazer com ela, e ela me explicou sobre a meditação."
Enquanto Carol explicava as vantagens da meditação, minha cabeça foi para longe. Imaginei como seria se minha mãe ainda estivesse viva, vivendo exatamente a história que Carol me contava animada.
"Ei, maluca... Tá ouvindo?" - Carol parou, segurou meu braço e me fitou.
Soltando um riso frouxo, me desculpei pela distração. Ficou um silêncio entre nós, mas logo Carol soltou mais um refrão, desta vez da minha música preferida.
"Sensível demais... eu sou alguém que chora..." entrei na onda.
"Eu sou um alguém que chora..."
Voltamos cantando o caminho todo, nossa atividade favorita. Existia um carinho especial entre nós, uma liberdade extrema uma com a outra. O celular tocando, acordo...
"Oi, que foi?" - atendi preocupada.
"Minha querida, cadê você?"
"Quem tá falando?" perguntei.
"Quem tá falando? Sou eu, Natália, pelo amor de Deus. Já são 9:30, você esqueceu que tínhamos combinado de ir juntas para o ensaio..."
Naquele momento, enquanto Carol falava, minha mente tentava recordar o que diabos eu tinha combinado com ela para o ensaio.
"Caramba!!! Estou quase pronta, calma calma... Te encontro no bar do Edson em 15 minutos", respondi, apressada pela revelação tardia.
Na noite anterior, durante nosso retorno para casa, cantarolamos tanto que Carol conseguiu me convencer a participar de um ensaio. Ela é do teatro e ama muito o que faz. Ouvir sua paixão pelo assunto despertou meu interesse, especialmente quando ela diz que tenho alma de artista. Afinal, sempre estou pintando paredes, customizando roupas, tocando violão e imitando pessoas.
Sentada, com os braços cruzados e um café à mesa, Carol me ofereceu um pão de queijo, sabendo que eu não tinha tomado café da manhã.
"Você é um amor, já te falei isso hoje?", agradeci, enquanto nos preparávamos para sair.
Chegamos e o ensaio já estava em andamento. Carol cumprimentou seus amigos, e eu me sentei em um dos bancos, observando a cena enquanto comia meu pão de queijo, que mais parecia uma borracha. O ensaio tratava de um romance sáfico, assunto do qual Carol já tinha me contado um pouco. Mencionei que estávamos ambos no final do ensino médio, ainda indecisa sobre a faculdade, ao contrário de Carol, que tinha certeza de querer ser atriz.
"Natália, vem aqui... gente, essa é minha amiga. Ela é incrível, tem vários talentos e um dom incrível de imitar pessoas..."
"Oi pessoal, ela é exagerada", me apresentei timidamente.
"Oi Natália, prazer. Amei seu casaco", disse Luana, uma das amigas de Carol, elogiando minha customização.
"Ah, muito obrigada, o prazer é meu!
- Ela que fez essa customização, é linda, né? Ah, ela que fez aquele macacão com símbolos assimétricos que você sempre elogia.
- Uau! Realmente, você é muito talentosa. Como faço para encomendar uma peça com você?
Fico com vontade de me enterrar em um buraco de tanta vergonha. Todas as peças que eu crio são por pura diversão, e algumas faço para minhas amigas. Mas nunca algo assim para uma pessoa que não conheço.
- Então eu não... - Carol me cortou.
- Pode deixar que vou convencê-la. Ela é uma artista muito discreta, morre de medo de ficar muito famosa, então não pega muitos trabalhos.
Que bom que Carol existia, sempre quebrava o gelo das situações que me deixavam sem respostas.
Começamos a fazer alguns aquecimentos e me senti em casa. Como se nada do que estava acontecendo ali fosse novidade, me soltei como nunca antes, falei com todos, me sentia livre e viva. Quando finalizamos, fiquei sentada olhando as cadeiras do teatro e me imaginando vivendo a arte por inteiro.
- Natália...
- Fala, querida - provoquei.
- O pessoal quer passar ali na praça, tomar alguma coisa... - antes que ela pudesse terminar.
- Claro que quero!
- Olha que animada, então bora Natanieli - uma das coisas que sempre fazíamos era trocar nossos nomes. Às vezes, ela me chamava de Natildes, Nanarude, Nanacita... e por aí vai.
Carol vai até o bar. Enquanto isso, fico encostada na árvore em frente. Luana se aproxima.
- Natália, e aí, o que achou de hoje? - pergunta, me encarando com um sorriso meigo.
- Olha, eu nunca imaginei que fosse dizer isso, mas eu amei muito - rimos; ela colocou meu cabelo para trás do ombro.
- Jura? Quando você entrou, senti de longe seu brilho... o palco é o seu lugar.
- Que lindo isso, obrigada pelas palavras... me sinto ainda mais motivada - Carol chega dando um susto.
- Buuuu! Trouxe uma bebidinha pra você.
- Vou ali falar com o Lucas, até já, - Luana sai me fitando; fico meio confusa com o que está acontecendo. Ela parece muito legal, mas ao mesmo tempo parece ter outro interesse. Carol interrompe meus pensamentos.
- Hum, olha, eu acho que ela está afim de você, hein!
- Que isso, Kerolayne? Tá doida - soltamos algumas risadas, com alguns gritinhos no meio.
- Não, eu acho que ela está mesmo. - Carol muda a expressão de sorridente e fica séria, e pela primeira vez rola um silêncio desconfortável entre nós.
- Hum, que bebida é essa aqui? Você sabe que estou proibida de beber, né?
- É mesmo, né... A última vez saiu tirando a blusa, você só me faz pagar mico - dei um tapinha de leve em seu ombro.
- E você não, né? Santa Carolina...
- Posso te falar uma coisa? - olhei surpresa.
- Manda, que a mãe está preparada.
- Você estava radiante hoje. Eu amei te ver interagindo com o pessoal... Você estava tão livre. Me lembro de como você era antes... você sabe.
Depois que minha mãe se foi, muitas coisas mudaram. Meu pai vive viajando a trabalho. Meu irmão Pedro está na casa da namorada. E Bruno era um pé no saco, não conseguia trocar uma palavra decente.
- É, eu sei... Obrigada por hoje, Carol!
- Obrigada nada, você vai pagar esse drink!
Começou a tocar Rita Lee - "Lança perfume". E Carol me puxou para o bar... Dançamos pulando abraçadas. Enquanto eu imitava um robô, Carol imitava uma minhoca dançante.
Me vira de ponta cabeça
Me faz de gato e sapato
Me deixa de quatro no ato
Me enche de amor, de amor
Lança, lança perfume, oh
Lança, lança perfume, oh
Lança, lança, lança perfume
Lança perfume
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CORES ✨
RomanceNesta história de amizade e descobertas, o amor é representado de forma única através da conexão profunda entre Carol e Natália, potencializada pela música e pela arte. O elo emocional entre as duas personagens se fortalece e se manifesta de maneira...