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Foi difícil a adaptação. No começo, tudo me irritava, principalmente a morte de Chaeyoung. Era difícil conviver com isso.



Dentro de casa, eu esbarrava em todo e qualquer objeto, caía e de vez em quando, eu chorava.



O médico dizia que não conseguia fazer um diagnóstico correto do meu caso, por isso, supunha que meus nervos oculares haviam sido esmagados por algo durante a batida e possivelmente, eu nunca mais voltaria a enxergar.



No terceiro dia, quando eu ainda estava internada, eles tiraram a faixa que cobria meus olhos e meu pai disse que havia apenas duas pequenas cicatrizes em meu rosto e as duas eram perto dos olhos. Disse também, que a cor dos meus olhos não havia mudado, continuavam verdes, mas não focavam nada.



A cegueira foi apenas parte dos machucados que tive. Eu havia quebrado um braço, uma costela e perfurado um pulmão. Fiquei, aproximadamente, um mês no hospital, o que não me deu chance de ir ao enterro de chae, mas meus pais foram e disseram que os pais de Chaeyoung, pareciam inconformados e desesperados.



Nosso acidente apareceu em jornais e noticiários e pouco depois, os Iglesias pediram indenização à empresa que era encarregada do caminhão que nos tirou da estrada. Minha mãe dizia que era o bastante eu estar viva e estar com ela.



Dois meses depois de ter saído do hospital, comecei a frequentar um instituto para cegos e lá, passei a aprender a viver nessa semi escuridão. Alguns tutores diziam que eu tinha sorte de poder distinguir vultos e também, distinguir um lugar escuro de um lugar claro, pois havia pessoas que perdiam totalmente a visão. Eu não sabia dizer se isso me confortava.



Sai do colégio e comecei a ter aulas particulares em casa com professores que ensinavam a ler em braile. Não recebia amigos ou visitas e com isso, fui me isolando do mundo lá fora.



Aprendi a andar em minha própria casa, contando quantos passos eu deveria dar antes de chegar a qualquer móvel, porta, escada e ambiente. Aos poucos, fui me adaptando a minha cegueira, mas minha mãe ainda não se conformava e de vez em quando, não conseguia disfarçar o choro.



— Porque você me chamou? - perguntei mudando o rumo da conversa.



Com um suspiro ela segurou minha mão e me levou a cozinha. Um cheiro bom e doce impregnava o ar. A TV estava ligada, em algum canal de música e o ventilador de teto girava velozmente sobre nossa cabeça.



- Fiz um bolo - anunciou minha mãe animada.



- Ocasião especial? - perguntei me sentando na beira da mesa.



- Bem... Para falar a verdade, não. Seu pai estava querendo que eu fizesse um bolo para dar aos novos vizinhos.



— Novos vizinhos? Não sabia que a casa ao lado havia sido vendida. Aliás, eu nem sabia que ela estava à venda. Franzi o cenho.



- Sim. A casa foi vendida em menos de uma semana, para uma família pequena. São apenas os pais e a filha que deve ter sua idade.



- Hm... - murmurei. - Se mudaram hoje?



- Não, boba. Faz três dias.



— Mas eu não ouvi barulho de mudança ou coisa do tipo. - comentei. Minha mãe continuava a mexer com seu bolo.



- Você estava no instituto e eles compraram a casa já mobiliada. Bem mais pratico, não? - Senti minha mãe se aproximar - Abra a boca.



- Para que? - perguntei erguendo as mãos para pegar em seus braços estendidos. - Bolo?



- Sim. - respondeu ela colocando um pedaço em minha boca.



- Está ótimo - Eu disse sorrindo.



- É bom que esteja mesmo.



Eu ri e fiquei ali, sentada, ouvindo minha mãe andando para lá e para cá, terminando seu bolo.



Sentada em uma das muitas cadeiras no jardim dos fundos, eu tentava ler um livro em braile, mas alguns barulhos que vinham da casa vizinha me desconcentravam e irritavam.



- Vamos Skoop.



Fechei o livro e estendi a mão para meu cachorro que se aproximou. Seu pelo era macio e levemente ondulado. Era um cachorro grande e bem treinado. Quando saiamos nas ruas, pessoas se aproximavam para dizer que ele era lindo e perguntavam se podiam passar a mão nele. Eu apenas sorria e ajeitava meus óculos escuros no rosto.



Levantei-me da cadeira e deixei o livro sobre a mesa do jardim. A grama sob meus pés estava gelada, contrastando com todo o calor que fazia. Era bom sentir o frio que percorria o corpo todas as vezes que eu dava um passo, acompanhada de Skoop.



— Moça - ouvi uma voz me chamar. Virei-me em direção a ela.



Pela direção em que a voz vinha, pude adivinhar que a pessoa estava do outro lado da cerca viva, que separava as duas casas. Skoop latiu para me avisar que tinha alguém.



- Quieto. - O cachorro se aquietou e sentou-se. - Quem é você?



- Meu nome é Momo. A nova vizinha. a garota respondeu simpática. Eu não me mexia.



— O que você quer Momo? - Eu sabia que estava sendo grossa.



- Meu martelo caiu no seu jardim. Poderia pega-lo para mim?



Franzi o cenho. Ela não havia percebido...? Arrumei os óculos no rosto. Não tinha ideia de onde estava o martelo.



— Você pode pular a cerca - respondi secamente.



— O que custa pega-lo para mim?



Soltei um suspiro, irritada.



— Preciso saber onde ele está - Como ela não havia percebido?



- Não consegue vê-lo? Está bem em sua frente. - momo parecia impaciente.



Baixei a cabeça, olhando para o nada. Respirei fundo e dei alguns passos para frente. Eu sabia que a cerca estava próxima, mas o martelo poderia estar em qualquer lugar daquela extensão.



Por algum motivo eu não queria que ela soubesse que eu era...



Tropecei em algo duro e cai no chão, sentindo a grama fria contra o rosto. Meus óculos caíram em algum lugar longe de mim. Me senti praticamente nua sem ele.



Ouvi alguns passos virem até mim, correndo. Eu odiava cair em frente a estranhos. Senti minha expressão se fechar.



- Você está bem? - os passos pararam em minha frente e a voz estava num plano mais baixo. Ela havia se agachado.



- Estou ótima - respondi, tentando me levantar, mas para minha surpresa, senti duas mãos em meus ombros, me ajudando a levantar. Ergui o rosto, com a boca levemente aberta e ouvi uma exclamação grave e abafada.



- Você é... - ela não conseguiu terminar a frase e pigarreou. Skoop latiu novamente.



- Quieto Skoop - ordenei, tentando me



- Desculpe, eu não...



— Não sabia que eu era cega? – perguntei procurando pelos óculos.



— Eu não havia percebido.

Be My Eyes - MiMoOnde histórias criam vida. Descubra agora