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    Não sei a quanto tempo estudávamos Shakespeare, mas conseguia ditar perfeitamente tudo o que o professor dizia. Eu sinceramente considerava dar mais importância a artistas franceses (já que estamos na França), do que um inglês. Claro, eu entendo, é literalmente William Shakespeare, mas não o único. Victor Hugo era incrível pra matéria, Notre-Dame de Paris e Os Miseráveis eram peças que a maioria da população francesa conhecia.

    Mas, no que uma aluna parisiense poderia interferir?

    — Vocês tem de se lembrar que ele é um ponto crucial para qualquer aluno que queira se tornar bacharel em Artes — O professor, Paul, dizia com um sotaque extremamente carregado. Ele disse que viera do interior da França, mas sempre acreditei que poderia ser um pouco forçado, já que haviam pelo menos 4 alunos estrangeiros na classe.

    O resto da aula passou num tumulto de perguntas e explicações. 15 longos minutos depois, haviam acabado.

    Me levanto da cadeira e pego minhas coisas, guardando-as dentro da bolsa.

    — Julie! — Marienne me chama. Ela era uma das estrangeiras na nossa classe, tinha vindo da Inglaterra há 2 anos e meio. E uma das minhas poucas amigas de verdade — O que vai fazer depois da aula?

    — Estudar, provavelmente. Mas tenho que ajudar o senhor Allaire no café — Eu raramente tinha tempo de fazer qualquer outra coisa, e quando tinha, não tinha amigos nessas horas. Marienne era gentil, mas muito extrovertida e não lhe faltavam amigos, e ás vezes, ela preferia os que tinham mais tempo pra sair.

    — Ah, Julie, porque não para de estudar só um pouquinho?

    — Mary, devo estudar mais do que nunca. A semana de avalições é daqui 15 dias — Me direciono até a porta, com Marienne me seguindo de perto.

    — Mas você sempre tira notas boas, não precisa disso tudo.

   — Tiro notas boas porque estudo pra isso - Paro de andar, e olho suspirando pra ela — Me perdoe, Mary, juro que queria sair com você. Nas férias podemos sair, ok?

    Marienne parecia levemente chateada, mas eu sabia, mesmo que contra a gosto, que a chateação iria sumir em alguns instantes quando outra pessoa aceitasse.

    — Tudo bem... Já vai pra casa?

    — Vou passar rápido pra comer alguma coisa, me trocar e ir pro café — Nós andávamos juntas até o portão de saída.

    — Entendi... - De repente, uma animação tomou conta dela — Julie, Julie! Olha lá!

    Meus olhos direcionam-se pra lá lentamente, quase já sabendo o que seria, e claro. Era o que eu pensava.

    Louis Dubois, playboyzinho insuportável que adorava roubar o coração de garotas moles e jogava elas fora. Ficava muito feliz de que metade da quantidade feminina da faculdade não tolerava ele. Mas ainda tinha a pequena porcentagem que morreria por ele, e infelizmente, Marienne Davies era uma delas.

    Louis passou por nós e piscou pra Marienne e me deu um sorrisinho torto. Preferia não ocupar minha cabeça pensando no que ele queria com isso.

    — Ele é tão lindo, Lie...

    — É aceitável - Disse sem dar muita importância.

    — Seu gosto pra homens é tão elevado assim? Aceitável? Parece que ele caiu dos céus!

    — Sabe quem caiu do céu, Marienne?

    — Quem? — Ela disse quase pulando de felicidade, talvez esperando que eu mencionasse o nome de algum garoto.

    — O Diabo e os demônios.

    — Julie! Por Deus, não fale essas coisas! Você é tão cética assim quanto a homens? — Ela parecia triste diante disso.

     — Não sou cética quanto a homens, Mary. Sou cética quanto a marmanjos e meninos.

     — E qual a diferença? Digo, entre meninos e homens — Ela acrescentou rápido.

     — Um menino não se torna homem pela idade, se é imaturo, se torna um marmanjo. Homens tem qualidades admiráveis e são homens de verdade.

     — Louis se encaixa em qual categoria? — Ela pergunta na esperança de que não fosse tão ruim assim.

     Eu queria muito dizer o que queria, mas eram os sentimentos de Marienne, e eu não queria destruir completamente sua fantasia. Não, completamente.

    — A classe mais baixa de marmanjos — Disse, parando na frente do portão, para me despedir dela.

    — Você ainda vai gostar do Louis — Ela disse com um tom de esperança desgastada.

    — Isso é pedir pelo impossível — Disse rindo, admirava a insistência de Mary.

    — Pelo menos parar de odiá-lo?

    — Improvável. — Ela sorriu. Um "improvável" já era melhor do que um "impossível".

    — Bem, de qualquer forma. Te vejo na segunda? — Ela pergunta, os olhos de mel brilhando. Concordo levemente com a cabeça. - Então, tchau!

    — Au revoir! — Digo e tomo caminho até meu apartamento.

     Era um fim de manhã não muito frio em Paris, talvez a movimentação nos esquentasse, já que algo que sempre encontraríamos ali, seriam pessoas com câmeras por todo o lugar. Saint George era um centro de atração comum por estar perto de tantos pontos turísticos como Palais Garnier ou o Museu do Louvre. Talvez pensem que, por ter nascido em Paris e ter vivido aqui a minha vida toda, eu acabasse achando entediante depois de tanto tempo. Mas a verdade, é que Paris nunca perdeu a magia. E ela é tão esplêndida para mim quanto para os turistas. Sempre considerei a Torre Eiffel um símbolo do amor, já que trouxe tantos casais pra cá e normalmente, sair num passeio por lá, é se deparar com uma moça sendo pedida em casamento e aplausos ao redor.

    Entro no prédio do apartamento e logo dou de cara com nosso porteiro, Jean, com uma revista velha cuja capa falava de alguma pessoa política.

    — Bom dia, sr. Jean — Digo enquanto passo pela recepção.

    — Bom dia, srta. Mallet — Ele diz sem levantar os olhos do papel. Ele era simpático, mas ás vezes seu mau humor o influenciava demais.

    Subo as escadas até meu apartamento. Quando chego na porta, destranco-a e entro, colocando tudo por cima do armário e correndo para meu quarto, devia estar no café as 14h30, e já eram 13h05. Tiro toda a roupa que utilizei no dia e deixo jogado em cima da cama. Eu sabia que no fim do dia, eu teria que fazer a diária limpeza do apartamento.

Amor, Jazz & Paris ; KTHOnde histórias criam vida. Descubra agora