— Zé, você tem certeza? — perguntou com uma insegurança evidente em sua voz. Será que você teria condições de ir para Paris 2024?
Já se passou pouco mais de um ano desde que você se lesionou. Foi um período muito conturbado da sua vida. Você se afastou por tempo indeterminado das quadras para cuidar do seu joelho esquerdo e poder retornar gradualmente à quadra o mais rápido possível. A esperança de voltar ao lugar que sempre amou, de jogar vôlei, era o que te mantinha motivada. A quadra era o seu lar, onde você se sentia completa, e ficar afastada dela foi muito difícil. A lesão não afetou apenas seu físico, mas também mexeu com a sua cabeça. Você estava no ápice da sua carreira como jogadora, mas ainda tinha muitos planos e objetivos pela frente e quando aconteceu o incidente em quadra, foi um choque. Você entrou em um jogo e saiu lesionada, uma ruptura parcial do ligamento lateral do joelho esquerdo e parte do menisco. Depois de passar pela mesa de cirurgia, você fez tudo o que poderia ter feito para retornar a fazer o que tanto amava: jogar. Mas sem Thaísa, isso teria sido impossível. Ela foi o seu pilar e o apoio dela foi o seu maior incentivo, e por mais que você fosse grata ao apoio que recebeu dos seus familiares e conhecidos, ter o dela era completamente diferente. Ela sabia como era estar na sua pele, como a incerteza e a frustração vinham de forma frequente, te fazendo questionar e duvidar de si mesma, porque ela já esteve no seu lugar. A central também passou por uma lesão muito parecida com a sua há anos atrás, então ela te compreendia como ninguém.
Após meses de recuperação, você finalmente foi liberada para retornar aos treinos, de forma gradual, claro! Mas a realidade foi diferente do que você imaginava que seria. Era diferente de quando você estava em tratamento e em pós-cirurgia, recebendo milhares de mensagens de apoio na internet. Pelo contrário, a mídia, que tanto apoiou você durante a recuperação, foi responsável por dar início a uma onda de comentários negativos na internet após os seus primeiros jogos, comparando seu desempenho atual com o rendimento após a lesão e o tratamento. Essas críticas eram muito injustas, e você sabia disso, mas elas minavam a sua confiança e a ideia de não conseguir mais atingir o nível anterior passou a te assombrar, o medo de não ser mais a mesma de antes era avassalador a cada treino e jogo. Você estava cercada de dúvidas e não conseguia falar sobre isso tão abertamente quanto gostaria, mas Thaísa sempre esteve lá pra você. A pressão de corresponder às expectativas e superar as próprias limitações era sufocante. Ela era uma das meninas mais próximas de você e foi uma das primeiras pessoas a saber da sua lesão. Você não saberia explicar, mas você sentia que ambas teriam uma conexão desde o momento em que a viu pela primeira vez. Quando contou para ela, ela te consolou, falou que tudo ficaria bem e que você tiraria isso de letra enquanto te abraçava. Ela tinha um jeito de te fazer sentir que podia qualquer coisa em quadra e fora dela.
— Certeza!? — Zé Roberto repetiu, como se questionar isso fosse um ato de loucura. — Mesmo depois da lesão no joelho e a cirurgia, vejo o quanto você tem dado o seu melhor na quadra durante os jogos. É hora de voltar. O seu maior obstáculo é a incerteza, você precisa superar isso — ele afirmou, dando ênfase no “precisa”.
As meninas estavam se despedindo pouco a pouco e logo restavam apenas vocês. Foi quando você viu Thaísa retornar do vestiário, se aproximando de vocês dois. Ela percebeu a tensão e a seriedade daquela conversa e sabia do que se tratava. A tensão era quase palpável.
— E aí, tudo bem? Já podemos ir? — a mulher de cabelos loiros perguntou, alternando o olhar entre vocês e por último fixando-se em você.
Vocês estavam vindo e voltando do treino juntas há alguns dias. Seu carro estava no mecânico e o caminho da sua casa também era o mesmo percurso dela, então ela gentilmente se ofereceu para te dar carona durante o tempo que o carro estivesse na oficina. Ela até brincava, dizendo que você não precisava estranhar, caso seu carro nunca mais voltasse da oficina. Você sentiu um frio na barriga ao lembrar que retornaria para casa com ela e ainda meio mexida com a conversa anterior em sua mente, não percebeu quando Zé confirmou que sim. Ele deu alguns tapinhas nas costas de vocês e um: “Até o próximo treino, meninas!”.
O caminho até o estacionamento foi silencioso, você ainda estava pensando sobre a proposta e as palavras do técnico. A mulher mais velha parecia sondar você, algumas vezes olhava de relance para você no banco do passageiro e desviava alguns segundos depois. Quando estavam na metade do percurso para a sua casa, ela quebrou o silêncio do veículo.
— Eu sei que você duvida da capacidade que tem na quadra, Seu nome. É impossível não se perguntar após tudo isso, o diagnóstico e toda a recuperação que você precisou passar... — ela começou, após parar o carro no semáforo fechado. Thaísa direcionou o olhar que antes estava na avenida para você. Você conseguia ver seus olhos mesmo com a baixa luminosidade, o olhar constantemente te dado por ela, o olhar de comprensão. O olhar de que sabia muito bem do falava, de quem já havia vivenciado e estado no seu lugar. — Mas essa lesão... — pausou a fala e apontou por um breve momento para o seu joelho esquerdo. — não define quem você é, não define fora e nem dentro da quadra...
Você ouvia atentamente as palavras da mais velha. Seu corpo estremeceu levemente ao sentir toque da jogadora em uma de suas mãos, tentando te confortar. Você rezou para que ela não tivesse percebido o pequeno tremor. Thaísa continuou o percurso do carro, sem esperar que você falasse alguma coisa.
— É ridículo. Eu não deveria duvidar, deveria acreditar que estou pronta... — você falou, quebrando o silêncio instaurado e talvez pela sua aprensão e desabafo, tenha falado um pouco rápido demais.
— Se você quer saber o que eu penso, eu acho que só você pode fazer algo por você. Podemos acreditar em você, S/a, mas se você não acredita... — ela disse, pensando que talvez estivesse sendo um pouco dura demais, mas foram verdades que ela também precisou encarar antes. — O que eu quero dizer, é que você precisa parar de ouvir as críticas que não são construtivas. Transformar isso em vontade demostrar seu talento e dedicação na quadra, calar a boca dessas pessoas. Tá na hora de colocar pra fora.
Ela direcionou o olhar por um breve momento novamente, sorrindo para você. Ter o apoio de Thaísa, era como um lembrete de que se ela conseguiu, você também conseguiria. Você retribuiu o sorriso dela, suspirando. Já paradas na rua do seu prédio, você se despediu da jogadora dando um breve selar em sua bochecha. Esse contato não era comum entre vocês, então você percebeu a expressão surpresa, que logo se transformou em um sorriso lindo.
— Muito obrigada, Thaísa. — essas palavras estavam na sua garganta esse tempo todo.
É minha primeira tentativa de escrita por aqui, relevem e me perdõem pelos erros ortográficos! Não sei se curti muito, mas é isso aí!