Capítulo 4.1 - Dói.

105 15 19
                                    

━━━━━━ ◦ KTH ◦ ━━━━━━ 
Eu uso essa coroa de merda, sobre meu trono de mentiras 
Cheia de pensamentos quebrados que eu não posso reparar 
Sob as manchas do tempo, os sentimentos desaparecem. 

- HURT, Nine Inch Nails. 
◦ 17/11/1986 15:00 ◦ 

No final da rua estreita onde Taehyung cresceu, uma lanchonete barata estava escondida entre prédios desgastados. O duto de ar expelia uma fumaça densa que se espalhava pelas paredes sujas. O cheiro de óleo frito impregnava tudo, um convite constante para quem passava.

Quando Taehyung caminhava pela calçada, seu olhar se fixava na vitrine suja onde os hambúrgueres se empilhavam em uma bandeja. Seus passos desaceleravam, não somente por desejo, como por fome. Ele lembrava de uma vez em sua infância, em que viu uma garotinha com cabelo loiro brilhante, segurando um saco de hambúrgueres, não muito mais nova que ele.. O saco balançava suavemente enquanto ela dava pequenos saltitos.

Sem hesitar, Taehyung se aproximou com um ar de desdém. Suas mãos se estenderam e, em um rápido movimento, arrancou o saco da mão dela. A garotinha ficou paralisada, com os olhos arregalados de choque. Taehyung nem sequer a olhou novamente. Ele apenas deu uma última olhada no lanche e se afastou com a mesma velocidade com que chegou.

A garotinha estava parada, segurando as mãos vazias, enquanto Taehyung se dirigia para o canto escuro da rua, onde desfez o saco e devorou o conteúdo.

Agora, enquanto ele caminhava pelo corredor vazio e exageradamente elegante do hospital, a comparação com a garotinha se fazia mais nítida. Seus cabelos loiros eram semelhantes aos da garota que o guiava, mas ele sabia que não eram a mesma pessoa. Comparada a “Querida Van”— como ele a chamava mentalmente— Taehyung estava em um mundo completamente diferente. Van nunca teriam que passar pela lanchonete, nunca colocaria os pés delicados no asfalto farinhento do bairro, nunca se quer seu caminho a levaria aquele lugar.

Van parou diante da porta do quarto e, com um movimento lento e deliberado, a abriu, revelando o interior. O ambiente era soturno, iluminado apenas pela luz fraca dos equipamentos médicos, enquanto o som monótono do respirador preenchia o silêncio. Taehyung, Jimin e Hoseok entraram, seus passos ecoando suavemente pelo corredor vazio.

Dentro do quarto, Yugyeom estava deitado na cama, inconsciente e entubado. Seu corpo pálido contrastava com os tubos e fios que pareciam se fundir ao seu ser, transformando-o em uma extensão da própria maquinaria que o mantinha vivo. Van se aproximou da cama com uma expressão que misturava pena e frieza, seus dedos passando delicadamente pelos cabelos desgrenhados de Yugyeom. Seu semblante crítico parecia refletir uma mistura de desdém e compaixão.

— Ele parece tão vulnerável assim, não é? — Van comentou, sua voz carregada de uma suavidade que não combinava com suas palavras.

Taehyung observava a cena com uma expressão endurecida. A presença de Van, com sua atitude condescendente, despertava em Taehyung uma irritação que ele lutava para disfarçar. A cena do hospital e a maneira como Van lidava com Yugyeom apenas intensificavam seu desconforto.

Van se voltou para Taehyung, a orientação em seu olhar carregada de um julgamento implícito. — Talvez o melhor seja deixá-lo em paz, não?

Taehyung arqueou a sobrancelha, um sorriso irritado brotando em seus lábios. — Como é que é?

Van não hesitou. — Se realmente se importa com ele — replicou, mantendo o olhar fixo em Taehyung —,  talvez seja melhor deixá-lo em paz, então.

A sugestão pairou no ar, um golpe velado que Taehyung sentiu, mas se recusou a admitir. Ele respondeu com uma risada amarga, um som seco que ecoou pelo quarto. — Deixá-lo em paz, é? — ele murmurou, movendo-se com uma indiferença calculada em direção à poltrona no canto.

QUEDA LIVRE - taekookOnde histórias criam vida. Descubra agora